'Pequena Grande Vida' fala da ilusão de felicidade

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
21/02/2018 às 17:54.
Atualizado em 03/11/2021 às 01:30

(Paramount/divulgação)

Em filmes como “As Confissões de Smith”, “Sideways – Entre Umas e Outras” e “Os Descendentes”, o diretor Alexander Payne buscou inserir pequenas reflexões sobre modos de vida, num claro conflito entre o padrão exigido pela sociedade e modelos alternativos que dão um nó na cabeça de seus protagonistas. Com “Pequena Grande Vida”, uma das estreias de hoje nos cinemas, Payne faz uma espécie de síntese desse pensamento, agora com um pé na ficção-científica, ao trabalhar um futuro em que as pessoas podem diminuir de tamanho e viver felizes em comunidades que ficam livres dos “grandes” problemas atuais. Diferentemente de seus trabalhos anteriores, em que há uma construção irreverente e cheia de humanismo, Payne flerta com o humor negro ao estilo dos roteiros de Charlie Kaufman (“Quero Ser John Malkovich”, “Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças”), que tem ares quase surreais. O protagonista vivido por Matt Damon surge deslocado num mundo que parece conspirar contra ele. A ilusão de felicidade ao diminuir de tamanho começa a transparecer quando a esposa dele desiste, na última hora, de passar por essa transformação, criando um desequilíbrio impossível de ser restaurado. A trama fala justamente destes desequilíbrios, em que existe um evidente desconforto pelos caminhos tomados pela humanidade. Mas o que é oferecido como alternativa não exige apenas um grande passo como também se transforma num filão, um nicho a ser explorado e comercializado. A passagem do personagem para o mundo miniaturizado nos faz lembrar das primeiras sequências de “2001 – Uma Odisseia no Espaço” (1968), quando um astronauta viaja solitário pelo espaço, com toda a tecnologia não tirando a sensação de isolamento e vazio. A este personagem que sofre por seu idealismo, vendo um novo submundo ser criado entre os pequenos, surgem figuras bizarras como o comerciante estrangeiro (Christoph Waltz) que burla o sistema e trafica produtos, e uma militante ecológica (Hong Chao) que trabalha como doméstica. O final é ainda mais crítico e satírico, quando os defensores verdes passam a ter a perspectiva de uma nova Xangrilá. Com tantos elementos ricos em mãos, Payne parece se perder em alguns momentos, mas o filme, de toda maneira, se insere naquela categoria que nos faz rir de nós mesmos. 

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