(Paulo Uchôa/Estadão Conteúdo)
Não é apenas a rara voz potente e grave que faz de Maria Bethânia uma das maiores cantoras da história da música brasileira. O ato de levar a poesia para seus espetáculos e a bela dramaticidade emprestada a cada verso declamado também são trunfos da artista.
Algo que fica ainda mais evidente com o lançamento do DVD “Caderno de Poesias” (Quitanda/Biscoito Fino). Ele traz uma apresentação feita pela artista, em 2013, em Diamantina, especialmente para um projeto da UFMG – o “Sentimentos do Mundo”.
O espetáculo “Leituras de Textos” foi desenvolvido pela própria Bethânia a partir de poemas que ela mesma levou para os palcos ao longo de 50 anos de carreira. Ao longo da apresentação, ela se reveza entre declamação de poesia e o canto, acompanhada de dois músicos: Paulo Dafitin (violão e viola) e Carlos César (Percussão).
Grandes nomes
São poemas de Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Castro Alves e Antônio Vieira, que dialogam com trechos de músicas de Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Tavinho Moura, Luiz Gonzaga e muitos outros.
O fator emotivo é colocado a todo momento. Desde o início, Bethânia posiciona o público que Fernando Pessoa é o poeta mais importante de sua vida – e este é o poeta mais presente entre os 73 trechos de poemas e músicas que compõem o espetáculo.
Caetano Veloso, claro, também está muito presente – vale lembrar que a cantora sempre foi a maior divulgadora da obra do irmão.
Uma das músicas de Caetano merece um interessante parêntese na apresentação. É “Ciclo”, poema musicado pelo famoso artista e escrito por Nestor de Oliveira, professor ginasial de boa parte dos filhos de Dona Canô em Santo Amaro. É o momento em que a cantora fala sobre educação. “É possível, sim, uma boa educação nas escolas públicas brasileiras”, disse Bethânia, arrancando aplausos empolgados da plateia.
A direção do vídeo é de Gringo Cardia, que pega aquele material bruto gravado em Diamantina e lhe dá dinamismo com inserção de imagens de Calasans Neto e letras gráficas para alguns poemas. O problema é ser dinâmico até demais: a poesia pede respiro, pede silêncios, e há poucos no registro.