Shyamalan volta a dar bons sustos em "A Visita"

Paulo Henrique Silva
26/11/2015 às 15:03.
Atualizado em 17/11/2021 às 03:06

(Hoje em Dia)

Com pouquíssimos personagens em “A Visita”, em cartaz a partir dessa quinta (26), o diretor M. Night Shyamalan abre mão de promover a clássica pergunta “Quem é o culpado?”. Ou mesmo, em outra vertente muito comum do gênero suspense, criar falsos suspeitos para, ao final, aumentar a sensação de catarse em torno da descoberta dos verdadeiros vilões.

Desde o início o espectador sabe que os irmãos Becca e Tyler estão a caminho de uma enrascada: a dupla é mandada para a casa dos avós enquanto a mãe curte um cruzeiro com o namorado. Trata-se de um demonstração de reconciliação dos pais, que romperam ligações com a filha após ela se envolver com alguém que não aprovavam.

É a partir dessa reconstrução que a história brilhantemente gira. Há uma lacuna de 15 anos, entre a filha e os pais e tudo o que envolve esses dois universos. A filha teve dois filhos, que os pais não conhecem. Ela se mudou para outro lugar, deixando para trás uma típica cidade do interior, fria, isolada e conservadora.

Para Becca e Tyler, essa viagem representa um pouco mais: a oportunidade de tomarem contato com o passado da mãe, criar relações entre o que ela foi e o que é hoje, para, no fundo, encontrar respostas no meio do caminho dessa trajetória: investigar o seu envolvimento com o pai, que abandonou a família, traumatizando a todos.

A primeira cena de “A Visita” é um vídeo feito por Becca, a irmã mais velha, em que uma pergunta fica sem resposta, envolvendo a razão do estremecimento entre os avós e sua mãe. Ela prefere que eles perguntaem aos pais, mote para se estabelecer uma espécie de linha detetivesca familiar, enquanto o suspense toma forma.

Essas duas linhas se entrelaçam e se alimentam, a partir de um artifício engenhoso: a metalinguagem. Becca realiza um documentário caseiro durante a viagem, com a câmera sendo – literal e figurativamente - o “olho” dos protagonistas. Tudo o que fazem é intermediado pela câmera, até mesmo o contato com os avós.

É a partir dela que descobrem a verdade sobre o que se passa na casa, participando de dois momentos de virada do filme. O primeiro, quando confirmam, com uma câmera escondida, que há algo de muito errado acontecendo com seus avós, que pode ser lido também como metáfora para as farsas construídas em família.

O segundo, no instante em que a câmera extingue qualquer dúvida sobre o perigo que a dupla corre, valendo-se de uma deliciosa contradição: Becca e Tyler são frutos de uma cultura eletrônica e moderna, mas um detalhe simplório parece escapar em meio a essa parafernália digital. Opção que embute no espectador a mesma sensação de desprotegimento vivido pelos irmãos.

Nesse momento em que o horror finalmente se manifesta em sua forma plena, a história também se volta para aquela pergunta inicial. A vontade de não falar está interligada a outra omissão da mãe, que falha em seu papel de cuidar dos filhos em troca de divertimento. Não deixa de ser um olhar machista sobre a função da família.

O medo ganha, portanto, um caráter “pedagógico”, curando os traumas daquele núcleo, que passa a falar mais abertamente sobre um outro tipo de horror que o acompanhou por anos, envolvendo a destruição dos laços familiares. Aspecto que diferencia “A Visita” de found-footages como “Atividade Paranormal”, “REC” e “Cloverfield”.

Compartilhar
Ediminas S/A Jornal Hoje em Dia.© Copyright 2024Todos os direitos reservados.
Distribuído por
Publicado no
Desenvolvido por