Super-heróis famosos mudam de sexo, nacionalidade e raça nos quadrinhos

Thais Oliveira
taoliveira@hojeemdia.com.br
15/07/2016 às 19:44.
Atualizado em 16/11/2021 às 04:19
 (Divulgação)

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Os grandes super-heróis das histórias em quadrinhos parecem que estão ganhando “novos” concorrentes. Bem... mais ou menos “novos”. Nos últimos tempos, temos assistido a Marvel – que, junto à DC, predomina o topo do ranking de vendas de revistinhas – “lançar” uma série de protagonistas. Na verdade, os chancelados pela editora têm caras diferentes, mas a fama deles é lendária. 

Explica-se: o Steve Rogers (Capitão América) foi substituído pelo herói negro Sam Wilson (Falcão), Thor virou a heroína Jane Foster, o Bruce Banner (Hulk) passou a responder pelo coreano Amadeus Cho e Miss Marvel vive também na pele da adolescente muçulmana Kamala Khan – só para citar alguns exemplos. Boa parte dessa recente turma ganhou destaque por meio de projetos como “All-New, All-Different Marvel” (Marvel Totalmente Nova e Diferente) e “Marvel NOW!”. 

O último novo rosto a ser revelado ao público foi de Tony Stark (Homem de Ferro). Desde a semana passada, sabemos que o Iron Man é, agora, representado pela jovem negra, de 15 anos, Riri Williams. As trocas apontam para uma tentativa de tornar os personagens mais próximos da realidade do mundo atual. No entanto, a dúvida é: seria um investimento para chamar mais leitores numa visão mercadológica ou uma vontade de engrossar o coro da inclusão social?

Para a quadrinista Bianca, trata-se, sim, de uma questão mercadológica. “O mercado quer inclusão do jeito que se ganha dinheiro. Então, na verdade, não sei se essas mudanças são boas ou ruins”. De toda forma, ela diz ser esse o caminho e todos precisam se adaptar, inclusive o público. “O leitor conservador vai ter que engolir; os tempos são outros”, alfineta.

De olho no leitor
A ilustradora e fundadora do “Lady’s Comics”, Mariamma Fonseca, também vê um fator mercadológico por parte das editoras. “Porém, muitos autores têm feito esses personagens de maneira orgânica”, pondera. Um exemplo é o próprio criador de Riri Williams, o desenhista brasileiro Mike Deodato Jr. Segundo o site G1, ele não imaginava que a moça substituiria Stark.

No geral, para Mariamma, tais mudanças são positivas. “Acho que abrem portas para a inclusão”, frisa. O coordenador de Quadrinhos da Fundação Municipal de Cultura (FMC), Afonso Andrade, também tem tal percepção. Para ele, ao colocar, por exemplo, mais mulheres protagonizando as tramas, amplia-se o público. “Se a editora continuasse a fazer somente personagens que atendem aos homens, como heroínas super sensuais, ia deixar de fora, no mínimo, metade do público, que são as leitoras mulheres. O que está acontecendo é que as editoras estão ficando mais sensíveis à essa demanda”, observa.

20,26% Foi o crescimento das vendas em junho em relação ao mesmo mês de 2015, nos EUA, segundo dados da distribuidora Diamond


‘O homem branco, forte e heterossexual ainda prevalece’

Apesar dos impactos positivos, Mariamma lembra que ainda é preciso trabalhar no que está por detrás das histórias. “É preciso incluir mais os quadrinistas, roteiristas... Por quê não se contrata uma mulher para escrever as histórias das mulheres?”, questiona. “Além disso, se você colocar na balança, o homem branco, forte e heterossexual ainda prevalece”, acrescenta. 

E não há problemas de os novatos surgirem em meio a um cenário já consolidado também? “Nesse caso, é mais fácil alcançar o leitor com personagens conhecidos”, avalia Mariamma. A mesma visão é compartilhada pelo quadrinista e diretor da Casa de Quadrinhos, Cristiano Seixas. Ele acredita que um protagonista novo não atrairia os leitores. “Um personagem feito a partir do zero não consegue ter a mesma visão (por parte dos leitores). Esses (consagrados) são ‘personagens-marcas’. A DC faz os mesmos lançamentos que a Marvel, tem personagens homossexuais, por exemplo, que não estouraram tanto. É mais difícil estourar um completamente novo”. 

Fórmula antiga
O ilustrador Vitor Cafaggi explica que os super-heróis mais famosos foram desenvolvidos décadas atrás, sendo “hoje todos realidades bem consolidadas”. “Um novo não teria o mesmo peso. Até no cinema, a gente vê que as maiores bilheterias são de super-heróis de 30, 40, 50 anos e que são ainda pertinentes, pois há pessoas os descobrindo”, entende. “E, se alguma troca não der certo, nada impede que o original volte. Nos quadrinhos, é comum um personagem morrer e ressuscitar. Fazer isso não custaria nada”.

Cafaggi lembra ainda que a Marvel já havia apostado num personagem menos estereotipado anos atrás. “Nos anos 60, surgiu o Homem Aranha, um herói bem diferente do adulto todo perfeito. Ele era adolescente rejeitado na escola, tido como nerd, sem dinheiro. Naquele momento, essas características também eram um diferencial. Vários leitores se enxergaram nele na época, assim como, hoje, se enxergam nesses novos”, diz. 

Seixas, por sua vez, recorda que, quando o X-Men estreou não tinha negro. “Depois, nos anos 70, houve uma renovação no X-Men e veio negro, russo, índio... O Demolidor também é exemplo, porque ficou cego. O quadrinho é uma mídia inclusiva”, diz. 

“Agora, a volta de um ‘personagem-marca’ com características diferentes é porque as editoras sabem que precisam renovar seus personagens já ultrapassados”, arremata.

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