Trio de atores do Galpão integra filme 'Noites de Alface', em cartaz nos cinemas

Paulo Henrique Silva
phenrique@hojeemdia.com.br
Publicado em 26/06/2021 às 16:31.Atualizado em 05/12/2021 às 05:16.

Inês Peixoto faz uma dona de cachorros barulhentos em “Noites de Alface”, filme em cartaz em cidades onde os cinemas já retomaram as atividades. Eduardo Moreira interpreta um sisudo delgado, enquanto Teuda Bara vive uma figura excêntrica da cidade.

Todos eles têm em comum o mesmo DNA: são parte do grupo teatral mineiro Galpão, um dos mais importantes do país. “O diretor quis criar uma vizinhança dos protagonistas que tivesse uma afinidade de verdade”, explica Inês, que é casada com Moreira.

A vizinhança exibe uma constelação de tipos que se opõem à tranquilidade do casal vivido por Marieta Severo e Everaldo Pontes. “Eles aparecem na história muito por meio do olhar de Otto (Pontes), pela lente com a qual ele enxerga essa vizinhança”, analisa Inês.

“O Otto é um cara mais de dentro de casa, que fica querendo entender as charadas de livros, de séries e de quebra-cabeças. É a esposa (Marieta) que faz a ponte do Otto com essas pessoas, que se aconchegam muito devido aos anos de convivência”, registra.

Para a atriz, o mais bonito em “Noites de Alface”, transposição do livro homônimo de Vanessa Barbara para a tela grande, é um convívio de vizinhos que vem se tornando mais raro no mundo corrido de hoje. “A gente nem sabe quem mora na porta ao lado”, lamenta.

Com a ausência da esposa, Otto passa a ver os vizinhos de uma maneira distorcida e cria uma trama de mistério. “Eu fiquei muito emocionada com o filme. Ele é de uma delicadeza ao tocar em questões como a solidão e o afeto. Ao mesmo tempo, é engraçado e tem momentos de suspense”.

Inês Peixoto está dirigindo o curta-metragem “A Primeira Perda da Minha Vida”, a partir de texto de Eduardo Moreira. O filme integra  projeto do Galpão que reúne cinco experiências diferentes de dramaturgia

A atriz não poupa elogios ao roteiro, assinado por Zeca Ferreira, também diretor, responsável por levar uma atmosfera especial para o filme. “Ele compôs o mundo de Otto e sua esposa de uma maneira muito delicada e bem-humorada”.

Ela fez o dever de casa e, antes de entrar no set, na ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, leu não só o livro que deu origem ao filme como também uma obra que reúne contos da autora. “Ela retrata um universo inspirado na cordialidade. E o longa é assim também”.

Inês observa que “Noites de Alface” passa a impressão de que nada está acontecendo, mas, na verdade, há muito sendo construído, principalmente a forma como lidar com a velhice. “É muito interessante ver, a partir de um quebra-cabeças incompletos, peças que faziam parte de uma engrenagem afetiva e que hoje não estão mais”, analisa.

TEUDA

Teuda Bara também integra o elenco do filme assinado por Zeca Ferreira

Diretor queria ter todos os integrantes do grupo no filme

O diretor Zeca Ferreira confessa que a primeira ideia dele era reunir todos os atores do Galpão no filme. “São como heróis para mim. Acabei não conseguindo viabilizar esse plano original, mas fiquei imensamente feliz de ter no filme Inês, Teuda e Eduardo”, revela.

A razão desse interesse se deve, segundo Ferreira, aos “dois tons diferentes de atuação”. Ele explica que, de um lado, há o casal protagonista vivido por Marieta Severo e Everaldo Pontes, que traz um tom mais sóbrio, com muitos silêncios e delicadezas.

 O “mundo fora da casa”, por outro lado, é trabalhado meio tom acima. “São ‘tipos’, algo excêntricos, invasivos. Era importante passarmos a sensação que eles de alguma forma ameaçassem a intimidade do protagonista”, destaca o realizador.

“Nesse sentido”, prossegue, “pensava em um elenco que trouxesse uma certa unidade, um sentido de conjunto, o que pensei que facilitaria muito para encontrar esse tom comum”, observa. É aí que entrava um dos mais importantes grupos teatrais do Brasil.

Ferreira buscou brincar com os mecanismos clássicos de contar uma história. “O filme embaralha um pouco as coisas e convida o espectador a participar. Mas o quebra-cabeça a ser montado não é exatamente a história algo absurda de crime que o filme a certa altura traz. O quebra-cabeça se chama Otto”.

Um dos fatores que o atraiu na história foi a abordagem do tema da perda. “Não é uma história de perda explorando o sofrimento desse homem. Ela reflete sobre os mecanismos que utilizamos para, de alguma maneira, manter aquela pessoa querida, que se foi, presente, existindo por meio da  imaginação”.

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