ENTREVISTA

"Chegamos para revolucionar um setor que não apresentava mudanças"

Co-fundador da Buser, o economista Marcelo Vasconcellos projeta crescimento da empresa mineira em 2024

Do HOJE EM DIA
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Publicado em 26/08/2024 às 06:37.Atualizado em 26/08/2024 às 10:13.
 (Xico Carvalho/divulgação Buser)
(Xico Carvalho/divulgação Buser)

Popularmente conhecida como o “Uber dos ônibus”, a Buser acaba de bater a marca de 12 milhões de clientes cadastrados. Por dia, cerca de 20 mil passageiros são transportados nas mais de 300 empresas de transporte parceiras. Segundo o economista e co-fundador Marcelo Vasconcellos, a expectativa é alta em 2024, que será mais um ano de crescimento, principalmente com relação às viagens rodoviárias. 
“O momento é favorável”, resume o economista de 40 anos, que fundou a Buser ao lado de Marcelo Abritta, em 2017. Mineiro, ele trabalhou por 15 anos no mercado financeiro antes de entrar na empreitada com o amigo de infância e hoje sócio. Nesse bate-papo com o Hoje em Dia, Vasconcellos fala sobre concorrência, uso de tecnologias, serviços oferecidos e questões judiciais. 

Já são 7 anos de atuação no mercado. Qual o tamanho da Buser hoje no Brasil?
Estamos presentes em todo o Brasil, seja com o modelo de fretamento colaborativo, aquele que usa a tecnologia para fazer a interme-diação de grupos de fretamento, seja com a revenda de passagens rodoviárias em parceria com empresas de linhas fixas. Nós acabamos de bater a marca de 12 milhões de clientes cadastrados, chegando a embarcar 20 mil passageiros por dia com a ajuda de mais de 300 empresas de transporte parceiras em todo o Brasil. Isso é uma parte relevante de um mercado que, historicamente, tem muito potencial, mas infelizmente, ainda é muito concentrado e fechado. Estamos felizes de ter chegado até aqui, dando mais opções aos brasileiros e ajudando a criar um jeito democrático e inteligente de viajar com a ajuda da inovação.


A empresa ficou popularmente conhecida como o “Uber dos ônibus”. Isso ajuda ou atrapalha a empresa?
Por um lado, ajuda sim, pois é uma forma de explicar o nosso negócio de uma forma simples. Assim como o Uber, também somos uma plataforma de tecnologia e não prestamos serviços de transporte. Tal qual como a Uber, chegamos para revolucionar um setor que não apresentava mudanças fazia décadas, mexendo, de certa forma, no <CF36>status quo.</CF> No entanto, temos algumas particularidades. Uma delas é que o nosso relacionamento não é diretamente com os motoristas. Para rodar com a Buser, fazemos parceria com empresas de fretamento que tenham todas as documentações em dia, sendo os motoristas funcionários dessas empresas. Na ponta do prestador de serviço, nossa relação é com as empresas.

Quais são os principais atrativos e benefícios que permitiram à empresa alcançar os 12 milhões de cadastrados na plataforma atualmente?
A Buser oferece uma infinidade de facilidades para o usuário. Além do preço, que acaba sendo, sim, um atrativo e também ajuda a pressionar todo o setor a ser mais competitivo, o fato de termos nascido no digital traz uma série de vantagens práticas, como reservas a um clique, cancelamento grátis até 1 hora antes da viagem, suporte pelo chat 24 x 7, e tecnologia que garante a segurança em toda a jornada. Você sabia que permitimos, por exemplo, que o passageiro acompanhe a localização do ônibus até o embarque, para poder se programar e monitorar o embarque? No caso do fretamento colaborativo, vale reforçar que os embarques são realizados fora da rodoviária, em locais onde é permitido estacionar veículos fretados, e isso também acaba facilitando a vida do usuário, com a possibilidade de embarcar em locais próximos de estações de metrô e perto de casa –só em BH há mais de 20 pontos de embarque, em locais como a Praça da Liberdade, Terminal JK e Expominas. 

Sem frota própria, a empresa utiliza ônibus de parceiros para a oferta de viagens. O que é necessário para se tornar empresa parceira?
Existe um controle de qualidade para que uma empresa de ônibus rode com a gente, e isso inclui desde avaliação documental do parceiro e dos motoristas, até visita às garagens para conhecer a infraestrutura do operador. Também prestamos a atenção no motorista, solicitando que ele faça treinamentos (como direção defensiva e atendimento ao cliente) e exigindo que ele esteja com as licenças e treinamentos sempre em dia. Avaliamos também a aderência do operador às nossas políticas e isto pode ocasionar possíveis penalidades em casos de infrações. Comportamentos como excesso de velocidade são monitorados pela nossa equipe e, se for o caso, penalizamos.

Em decisão recente, o STJ decidiu pela irregularidade e concorrência desleal, mantendo a proibição de atuação da empresa no Paraná. Em que medida isso afeta a operacionalização e até planos de expansão ou mesmo a credibilidade da marca?
A decisão do STJ foi uma em meio a outras dezenas de decisões favoráveis que temos tido em tribunais federais e estaduais de todo o Brasil. É claro que é importante, mas não é uma decisão final, não virou sentença. Iremos recorrer e inevitavelmente o caso vai acabar subindo para o STF. O próprio ministro Herman Benjamin, que vai assumir a presidência do STJ, afirmou, durante o julgamento, que “[...] toda a tecnologia, principalmente as tecnologias de organização, seja social seja do trabalho, tudo isso causa um desconforto, desestrutura, mas às vezes para o bem, como foi o caso do Uber e também da locação de imóveis por meio de aplicativos, com isso retirando do conforto a rede hoteleira”. Ou seja, tem um caminho pavimentado para continuar discutindo a pauta em alto nível no Supremo.

Em termos práticos, o impacto é restrito: o processo julgado envolve discussão apenas das viagens interestaduais para o Paraná e no modelo de fretamento colaborativo – modalidade que permite a divisão e formação de grupos de forma online. Os usuários da região continuam sendo atendidos pelo serviço de revenda de passagens, que funciona em parceria com empresas que atuam em rodoviária. Passageiros no Paraná continuam usando a Buser.

Essa decisão não é isolada, pois há processos ainda tramitando contra o modelo de negócios praticado pela Buser ou outra empresa de intermediação de fretamento de ônibus para transporte de passageiros, como em São Paulo. Essa judicialização seria um dos principais entraves para uma expansão de oferta de novas rotas?

Hoje, no Brasil, temos um histórico recente de protagonismo do Poder Judiciário. A Buser está ganhando a maior parte dos casos, com decisões favoráveis em São Paulo (há um acórdão favorável à Buser e decisão a favor de fretador parceiro que transitou em julgado, ambas no TJ-SP), no Rio de Janeiro (tanto no TJ-RJ quanto TRF2), em Minas Gerais (tanto no TRF6 quanto TJ-MG), em Santa Catarina, Sergipe etc. Além das dezenas decisões favoráveis ao modelo da Buser e aos nossos fretadores, no ano passado, o STF reconheceu a constitucionalidade do regime de autorização e destacando a necessidade de que o mercado fosse aberto, que tivesse concorrência. Isso mostra que não há entraves para o crescimento; até pode haver algumas restrições em certos estados, mas estamos trabalhando para destravar os caminhos e seguimos expandindo nos estados mais estratégicos para a gente, onde já estamos estabelecidos e com segurança jurídica.


Um dos pontos apontados pela Justiça é o entendimento de que o fretamento colaborativo, um dos três modelos de negócio que vocês oferecem, descaracteriza o próprio serviço, ao permitir que o usuário adquira passagens de forma individual. Ou seja, o grupo que vai não é o mesmo que volta. Na prática, seria uma modalidade regular de transporte com viagens em circuito aberto. Como a empresa contesta esse entendimento?
Na verdade, o fretamento e o transporte tradicional de linhas são atividades diferentes, mas que convivem há muito tempo. O que a Buser faz é usar a tecnologia para facilitar a vida do viajante, permitindo que ele utilize uma plataforma para fazer parte de um grupo de fretamento – e isso é totalmente diferente de vender passagens. Como comprovam dezenas de decisões judiciais de segunda instância, o fretamento colaborativo é absolutamente legal, seguro e convergente com a inovação de mercados abertos e mais avançados internacionalmente, sendo a regra do Circuito Fechado (a que determina o transporte do mesmo grupo de passageiros na ida e na volta) inconstitucional e um entrave para mais concorrência. 
Para além das decisões judiciais, estudos de economistas e do mercado mostram que a concorrência é positiva para a economia. O buscador Check My Bus tem soltado pesquisas anuais mostrando que os preços das viagens de ônibus caem nas rotas rodoviárias com mais competição. Ou seja, é o efeito-Buser: o nosso modelo é benéfico para os brasileiros e complementar ao modelo tradicional. Não é uma questão de disputar espaço, colocando um modelo contra o outro, há espaço para todo mundo.

Dúvida frequente de usuários é quanto à responsabilização em caso de acidentes. É da Buser ou da empresa que é dona do ônibus utilizado para o trecho? Que garantias são dadas aos usuários?
A segurança é um pilar muito importante e estratégico para a nossa empresa, é uma das premissas para o negócio funcionar. Mesmo não tendo frota própria, nós não nos isentamos da responsabilidade em todos os níveis, e mais do que isso: adotamos uma série de medidas para tornar as viagens mais seguras. Uma delas é levar tecnologias embarcadas para os veículos dos operadores sem cobrar nada a mais deles, como é o caso do sistema de Telemetria, que permite controlar a velocidade dos ônibus em tempo real. Também apoiamos os parceiros com a instalação de um sistema de câmeras com sensores que usam a IA para identificar sinais de cansaço e desatenção do motorista. Com a ajuda dessas tecnologias, monitoramos a operação em tempo real, tratando os imprevistos e as intercorrências (como atraso, falha mecânica) assim que identificados. Já investimos mais de R$ 10 milhões nessa frente nos últimos anos, incluindo a instalação e manutenção dos equipamentos, além de custo com pessoal.

O alto custo das passagens aéreas leva os passageiros a buscar cada vez mais o transporte rodoviário, que também tem feito mudanças na oferta de serviços, com alteração de rotas, por exemplo, muitas vezes sem viagens diretas. É um cenário positivo para a plataforma?

A procura por viagens rodoviárias realmente está em alta e o momento é favorável, uma vez que os preços das passagens aéreas ainda estão impraticáveis para a maioria da população, principalmente entre as ligações com as principais metrópoles brasileiras, como São Paulo e Belo Horizonte ou BH até o Rio de Janeiro. Nestes trechos, as viagens de ônibus por aplicativo acabam sendo uma saída para o brasileiro se deslocar gastando até 3 vezes menos. Mas não é só isso: por oferecer um serviço que já é mais barato do que o tradicional e muitas vezes mais prático, com rotas diretas, atraímos também aquele usuário que migra do automóvel para o ônibus ou brasileiro o que não viajaria de nenhum outro jeito. Eles acabam sendo inseridos no turismo por conta do nosso preço baixo.

Considerando esse cenário, com os efeitos positivos dessa migração do aéreo para o rodoviário, quais os planos de investimento, tanto em novas tecnologias quanto em novos serviços em busca de uma fatia maior desse público?

Estamos animados. Julho foi um mês muito bom para a Buser. Alcançamos o melhor resultado da nossa história no modelo de revenda de passagens em parceria com empresas de linha, aquelas que atuam na rodoviária, com crescimento de 40% em comparação com o mês anterior. Atualmente, as revendas de passagens em rodoviárias já representam mais de 20% do faturamento total da Buser, reforçando a convivência harmoniosa entre os diferentes modelos de negócios da empresa. O modelo de fretamento também cresce, por isso a expectativa é fechar 2024 maior do que em 2023. Em termos de expansão, a ideia é continuar aumentando a presença nos mercados onde já contamos com alta procura, sobretudo na região Sudeste.

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