Ao atravessar a linha de chegada dois segundos à frente das adversárias nos Jogos do Rio, Martine Grael, de 25 anos, garantiu a oitava medalha olímpica da família, dando continuidade à trajetória da “dinastia Grael”, velejadores há três gerações na Baía de Guanabara.
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Bicampeão olímpico, Torben vibra com o ouro da filha: 'Emoção diferente'
Para Torben, pai de Martine e coordenador técnico da equipe brasileira, o segredo é a paixão. “A gente curte muito o esporte. Quando faz as coisas com o coração, a gente vai passando a experiência de geração para geração”, afirmou. Ele disse ter sentido uma “emoção diferente” ao ver o ouro da filha. “Estando de fora você se emociona muito mais. Você não tem controle. Não pode fazer nada.”
Os irmãos Torben e Lars foram os primeiros a ganharem medalhas olímpicas, numa família que navega a Baía de Guanabara desde os anos de 1920. Lars tem dois bronzes (Seul-1988 e Atlanta-1996). Torben é o maior medalhista da família - foi premiado cinco vezes (ouro em Atenas-2004 e Atlanta-1996, na classe Star; bronze em Seul-1988 e Sydney-2000, na Star; e prata e Los Angeles-1984, na classe Soling). Mas, para ele, Martine já o superou. “Ela me passou. Eu só fui ganhar medalha de ouro bem depois do que ela (aos 36 anos). Ela já tem o título de velejadora do ano, já é campeã mundial. Tudo antes de mim. Essa comparação só serve de incentivo para ela. Cada um faz a sua história”, disse.
Para o pai, Martine enfrentou pressão maior em função do nome da família, de competir em casa e por sua dupla ser a última chance de medalha da vela nesta edição dos Jogos. “Elas se saíram magnificamente. Estavam bem seguras”. Além de Martine, o filho mais velho, Marco, também competiu na classe 49er. Ele ficou em 11.º e não foi à medal race por um ponto.
“As conquistas são deles. O fato de a gente ter conseguido mostra a eles que é possível. Quando eles começaram a velejar, a gente fez questão de que eles curtissem o esporte e os amigos que poderiam fazer. O resto é de cada um. Eu tenho dois irmãos. Um é competitivo como eu e o outro tem uma cabeça diferente, é ambientalista, não gosta tanto de competição.”
Martine veleja desde a barriga da mãe - Andrea Grael competiu em regatas até o sétimo mês de gravidez. “Mais importante do que ganhar mais uma medalha foi velejar na Baía de Guanabara, ter tido essa torcida maravilhosa e ganhar aqui”, disse Andrea, que nunca viu o marido ao vivo vencer em Olimpíada. Nesta quinta-feira, ela não se conteve e nadou até a filha.
Kahena Kunze também vem de família de velejadores. O pai, Claudio Kunze, também conquistou títulos no esporte. Mas não conseguiu assistir à prova da filha. “Ele estava muito nervoso. A última perna não quis nem ver. Mas eu estava confiante. Eu pulei na água. Eu nadaria até Niterói para encontrá-las”, disse Audrey Kunze, mãe de Kahena.
Kahena vibrou com a mãe e sabe que as conquistas da família Grael no esporte são incríveis, mas também espera deixar um legado para as próximas gerações. “Minha família está muito orgulhosa. Meus pais sempre velejaram, meu pai ganhou algumas regatas, e agora me olham babando com esse ouro. Espero influenciar jovens, porque a vela é um pouco apagada no Brasil. Espero que o esporte se torne mais popular”, afirmou.
Todos eles estavam dentro da área de competição e puderam ver a façanha da dupla mais de perto. Mas os avós de Martine torceram, mesmo que de longe, para que a neta chegasse ao ouro. Normando Soffiati, de 80 anos, mal encerrava uma ligação telefônica, nesta quinta à tarde, e o celular já começava a tocar novamente. A série de quase dez ligações seguidas tinha uma justificativa: a neta, Martine Grael, acabara de conquistar o ouro no torneio olímpico de vela.
“É a maior emoção da minha vida”, resumiu, entre uma ligação e outra, enquanto tentava ingressar na área onde seria realizada a premiação, na Marina da Glória, na zona sul do Rio.
Normando acompanhou a regata junto com a mulher, Márcia Soffiati, de 74 anos, mas preferiu assistir pelo telão, enquanto Márcia ficou à margem da água, vendo os barcos ao longe.
“Torço muito, tinha muita expectativa por essa medalha”, disse a avó de Martine. “A gente sabia que teria medalha, só não sabíamos a cor”, completou Normando. “Martine tem muito sangue frio. Ela soube esperar o momento de definir a regata”. Sem conseguir entrar na área de premiação, o casal assistiu à cerimônia das medalhas separado da neta por um alambrado.