Com ápice em equipes de ponta, jogadores de renome reforçam a Segunda Divisão do Mineiro

Gláucio Castro - Hoje em Dia
22/06/2015 às 07:32.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:35

(Leonardo Morais e Eugênio Moraes )

Quando o Santos levantou a taça de campeão brasileiro em 2002, o atacante André Dias foi um dos jogadores que deram a volta olímpica em pleno Morumbi. O goleiro Fábio Noronha, 39 anos, já vestiu a camisa 1 do Fluminense em um clássico contra o Flamengo diante de quase 100 mil pessoas no Maracanã. Revelado pelo Atlético, o meia Ramon chamou a atenção do Corinthians, chegou badalado ao Parque São Jorge e defendeu também o rubro-negro carioca.

Após experimentarem o ápice na carreira, o dia a dia destes três agora é bem mais modesto. André, Fábio e Ramon se preparam para disputar a terceira divisão do Campeonato Mineiro. Acostumados com altos salários, estrutura de primeiro mundo e estádios lotados, eles convivem atualmente com outra realidade. Apesar do antagonismo, todos afirmam que vale tudo para continuar fazendo o que mais gostam.

“Meu corpo um dia vai parar. Eu sei. Mas, enquanto eu aguentar, quero permanecer dentro de campo”, avisa Fábio Noronha, que assinou contrato com o Nacional, de Uberaba, no Triângulo Mineiro. Disputar as divisões inferiores de qualquer estadual pode revelar situações surpreendentes. A contratação de Noronha, que atuou pelo Democrata-GV no Módulo I do Mineiro, é uma delas.

“Foi muito engraçado e nunca tinha visto isso. Fui contratado por uma torcedora que entrou em contato comigo pela rede social”, explica. A fanática pelo Nacional é Janaína Sudário, 32 anos, da Associação Avante Naça. Empresária do setor imobiliário, ela conversou antes com o presidente do time, que deu o aval para a contratação. “Então fui atrás dele, fiz o contrato em nome da minha empresa e repassei ao clube. Não ganho nada, apenas o prazer de ajudar o time da minha cidade, já que as autoridades e alguns dirigentes não o fazem”, alfineta.

Noronha começou a carreira no Flamengo e passou pelo Fluminense. Apesar do início promissor, o goleiro não conseguiu nenhum outro contrato com times da primeiro divisão. “Tenho negócios no Rio de Janeiro que me rendem algum dinheiro. Não daria para parar de trabalhar, mas eu ainda estou em campo porque costumo brincar que nasci goleiro. Vou até onde meu corpo aguentar”, garante o jogador, que chegou a ser preso em 2012, acusado de agredir a mulher.

Curiosidades

Em suas andanças por clubes do interior, Noronha viveu situações curiosas. “Uma vez, a gente tinha acabado de almoçar e só tinha jogo às 17 horas. Ligaram para o quarto lá pelas 13 horas e mandaram a gente descer pois a diária tinha vencido. Esperamos no saguão do hotel até a hora do jogo.” Em outra oportunidade, antes de uma viagem de ônibus de 17 horas, os jogadores lancharam só pão com manteiga.

Democrata aposta em atletas com passado em grandes clubes

Com 101 anos de história, o Democrata, de Sete Lagoas, é uma das equipes mais tradicionais do futebol mineiro. Mas, nas últimas temporadas, o Jacaré decepcionou e vai jogar a terceira divisão do Mineiro. Para tentar voltar ao Módulo II, a diretoria do clube aposta em atletas rodados.

O zagueiro Álvaro, 37 anos, com passagens por São Paulo, Atlético, Inter, Flamengo e futebol espanhol é o mais velho da turma dos experientes do time. André Dias, 34 anos, ex-atacante de Santos e Cruzeiro, e Ramon, 27 anos, revelado na Cidade do Galo, com passagens por Corinthians e Inter, completam a lista. Entre um treino e outro, o trio tenta se adaptar à estrutura de um clube do interior mineiro.

“O que eu tive no Cruzeiro e nos Emirados Árabes é difícil você encontrar em qualquer clube, mas não adianta viver de passado ou futuro. O meu momento é o presente e o meu presente é o Democrata, que tem um projeto muito organizado para subir”, revela André Dias.

Sem falar em valores, o jogador confessa que hoje recebe um salário praticamente irrisório em comparação aos clubes pelos quais atuou. “Encaro esta competição como um recomeço. Depois que saí do Santa Cruz, em 2013, eu tinha praticamente encerrado a carreira. Estava sem clube. Vim para o Democrata porque acho que vai ser uma coisa boa para mim e para o time. Não sou hipócrita em esconder que espero ter boas atuações aqui e conseguir outros contratos”, comenta.

Revelado pelo Mirassol, do interior paulista, o campeão mineiro pelo Cruzeiro, em 2011, teve três passagens pelo futebol internacional. Vestiu a camisa do Spartak de Moscou, em 2004, e, de 2007 a 2010, defendeu o Al Ain e Al Wasl, dos Emirados Árabes Unidos.

Liga dos Campeões é só lembrança na trajetória de Ramon

“Eu lembro até hoje do meu primeiro jogo na Champions. Parecia que eu estava sonhando”, relembra o meia Ramon, 27 anos, enquanto se prepara para a estrear na terceira divisão do futebol mineiro. A queda foi brusca, principalmente salarial, mas não suficiente para derrubar o jogador, que assume ter cometido erros fora de campo.

“Cheguei a ganhar R$ 3 milhões a R$ 4 milhões por ano no CSKA. Aqui ainda nem acertei o salário, mas estou encarando tudo como um recomeço. Quero voltar à disputar a Série A do Campeonato Brasileiro”, diz confiante o pai do pequeno João Pedro, de quatro anos.

O nascimento do filho e a perda repentina do pai, vítima de um infarto, há dois anos, fizeram Ramon parar e repensar a vida. “Sei que errei muito. Mas não me arrependo de nada. Tudo aconteceu muito rápido e muito cedo na minha vida, principalmente dos 16 aos 24 anos, quando eu saí da pobreza em Nova Era e fui viver na Europa com muito dinheiro. De dois anos para cá, estou praticamente reconstruindo minha vida. Meu pai morreu e sou o único homem da família. Precisava mudar”, assume Ramon.

Para o atleta, o que mais pesou foi a ascensão meteórica. “Comecei no Atlético ganhando R$ 3 mil, depois o valor saltou para R$ 40 mil e mais para frente R$ 50 mil. Fui para o Corinthians ganhando R$ 80 mil e depois para a Europa. Isso mexeu com a minha cabeça”, revela o principal reforço do Democrata para 2015.

Assim como o companheiro André Dias, Ramon prefere não se apegar ao passado para tentar uma guinada na carreira. “Tenho o mesmo respeito por todos aqui no Democrata, como tinha quando disputava a Champions. A vida é feita de momentos”, avalia o jogador. Ramon conta que comprou imóveis com o dinheiro que ganhou, mas não o suficiente para garantir ao filho João Pedro a vida que ele gostaria de dar. Por isso tenta recomeçar a carreira.

Quando surgiu no Galo, em 2005, o meia foi apontado com uma das revelações do clube. Logo despertou o interesse do Timão e foi parar no Parque São Jorge. Após passagem apagada pelo Corinthians, acabou vendido ao CSKA, de Moscou, em 2007, que o repassou ao Krilia Sovetov, também da Rússia, e depois ao Flamengo.

O Rubro-Negro carioca, em 2010, foi o último grande clube que ele vestiu a camisa. De lá para cá, Ramon atuou pelo Bahia, Náutico, Consadole Sapporo, do Japão, Remo, Brasiliense, Goianésia e Araxá, até chegar ao Democrata.

Experiência do técnico Wantuil Rodrigues é a arma do Valério

A diretoria do Valério, de Itabira, preferiu não apostar em nenhum atleta de renome. A peça mais importante do time não entrará em campo. Do banco de reservas, o técnico Wantuil Rodrigues, que trabalhou em 23 clubes até hoje como treinador, espera passar sua bagagem para dentro das quatro linhas e ajudar o Valério a subir ao Módulo II. “Vamos apostar mais na base. Tenho boa experiência com este tipo de trabalho. Vamos ver se a gente consegue fazer os jogadores renderem o máximo. A verba de contratações, inclusive para os clubes grandes, está bem mais curta.

Então, essa é a melhor saída. O interior de São Paulo, onde eu também fui treinador, usa sempre essa metodologia e dá muito certo”, explica o técnico, que já conquistou torneios juniores por Atlético e Cruzeiro. Em 1997, quando fazia parte da comissão técnica da equipe principal da Raposa, Wantuil levou o time B celeste ao vice-campeonato da Copa Centenário. Quem também terá um “reforço” importante no banco de reservas é o Formiga, que contratou o massagista Tita, ex-Cruzeiro, que inclusive atuou na Seleção Brasileira com Felipão.

Sem apoio, Ituiutabano muda de nome e vai atuar em Frutal, no Triângulo

Por falta de apoio, a diretoria do Ituiutabano também resolveu deixar a cidade de Ituiutaba, no Pontal do Triângulo, e se mudar para Frutal, a 201 quilômetros de distância. Apesar de ainda constar na Federação Mineira de Futebol (FMF) com o mesmo nome e escudo, a equipe vai disputar a competição como Atlético de Frutal.

Quinze equipes de várias partes de Minas Gerais jogarão a Segunda Divisão do Campeonato Mineiro, que na verdade corresponde à terceira, já que a FMF divide suas competições em Módulo I, Módulo II e Segunda Divisão. A disputa terá a primeira rodada no dia 26 de julho. Pela primeira vez, a Segunda Divisão permitirá apenas cinco atletas acima dos 23 anos por equipe, mudança que dividiu opinião das diretorias dos clubes do interior mineiro na reunião do conselho técnico, realizada em abril deste ano.

Os 15 participantes estão divididos em três grupos, separados por região. Os dois melhores colocados avançam ao hexagonal final, onde todos se enfrentam. Aqueles que somarem o maior número de pontos serão declarados campeão e vice, em 29 de novembro.

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