Divergências territoriais desde 1881 colocam fogo na final entre Chile e Argentina

Wallace Graciano - Hoje em Dia
04/07/2015 às 07:25.
Atualizado em 17/11/2021 às 00:45

Em seus 99 anos de história, a Copa América recebeu partidas épicas. Na final da 44ª edição do torneio, nesse sábado (4), às 18h30, no estádio Nacional, em Santiago, Chile e Argentina, porém, levarão a campo uma rivalidade que extrapola a esfera esportiva. E para entendê-la é preciso voltar no tempo e analisar o cenário político que cerca os vizinhos.   Os dois países dividem 5.150 quilômetros de fronteira. E foi por conta de três ilhas do Canal de Beagle que Chile e Argentina acirraram suas divergências territoriais. Em 1881, as duas nações assinaram um acordo sobre o estreito, considerado ponto geograficamente estratégico, pois separa os oceanos Atlântico e Pacífico, além de servir de ponte para a Antártida.   Os anos se passaram, mas os países continuaram divergindo sobre os limites do estreito. Foi então que, em 1977, o Tribunal Internacional de Haia considerou as ilhas como chilenas, gerando o repúdio argentino. A situação quase levou os dois à guerra. A solução só veio com mediação do Papa João Paulo II, em 1984.   Guerra das Malvinas   As divergências entre os dois países atingiram seu ápice em 1982. Naquele ano, a Argentina tentava recuperar a soberania das Ilhas Malvinas, sob o domínio do Reino Unido desde 1833. Para isso, contava com o apoio dos vizinhos durante o conflito contra os britânicos.   Mas ocorreu o contrário. Ainda vivenciando as divergências sobre o Canal de Beagle, o Chile optou por ajudar secretamente o Reino Unido. Segundo acusam os argentinos, aviões britânicos com insígnias chilenas sobrevoavam a Patagônia e usavam bases andinas para suas operações militares.   Mais de 30 anos se passaram, mas os platinos não se esqueceram dos episódios. A prova disso veio na canção “Decime qué se siente”, versão da música “Bad Moon Rising”, do Creedence Clearwater, que é entoada pela torcida argentina durante os torneios que a albiceleste participa.   A música foi criada para a Copa do Brasil, e teve uma nova versão direcionada aos chilenos nesta Copa América. Porém, ao contrário da letra original, que tirava sarro dos brasileiros, os argentinos optaram por atacar os andinos com uma canção carregada de ódio.   Na nova música, os argentinos se mostram amargurados pela postura chilena na Guerra das Malvinas e acusam os rivais de traidores. Não bastassem as divergências políticas, os platinos extrapolaram seu ranço ao tocarem na ferida dos vizinhos com a trágica lembrança do tsunami, na costa do Chile em 2010.   Pela paz   O contexto fez com que a organização da Copa América aumentasse a segurança para a decisão de hoje. Foram destinados 2 mil ingressos para a torcida argentina, que irá permanecer isolada em um setor do estádio Nacional. A grande preocupação é com os torcedores platinos que compraram entradas pela internet. Como não se sabe exatamente quantos, o reforço policial é necessário.   Disputa no campo   Focados apenas na disputa dentro de campo, os jogadores do Chile e da Argentina preferem deixar a rivalidade de lado e promoveram o clima de paz para a final da Copa América. “Será uma partida muito disputada. Mas é preciso haver respeito entre colegas”, disse o chileno Mena, do Cruzeiro. O argentino Javier Mascherano deu voz ao ala andino. “Tomara que as pessoas entendam que o futebol é esporte, e não guerra”.   A tensão política levada aos gramados não é novidade do continente sul-americano. Ao longo da história, o futebol ficou como segundo plano em diversas oportunidades e foi manchado por rivalidades territoriais e, até mesmo, xenofobia. E engana-se quem acredita que esse contexto se resume ao período bélico da Primeira e Segunda Guerra Mundial ou da tensão da Guerra Fria.   Na última edição da Eurocopa, em 2012, diversos países ameaçaram boicotar o torneio, que era sediado simultaneamente na Polônia e Ucrânia. As demais nações europeias questionavam as condições humanas ucranianas e acusavam o governo local de maus tratos a ex-premiê do país Iulia Timochenko, que foi presa supostamente por abuso de poder.   Não bastassem os boicotes dos chefes de estado aos jogos disputados na Ucrânia, as partidas sediadas pelos poloneses foram marcadas por manifestações racistas por parte dos donos da casa.   A história voltou a se repetir em outubro do ano passado. O jogo entre Sérvia e Albânia, que estava sendo disputado em Belgrado, pelas Eliminatórias da Euro-2016, terminou em confusão. Tudo porque o zagueiro sérvio Mitrovic tentou arrancar a bandeira do vizinho bálcã de um drone que sobrevoava o campo. Ao ver aquela cena, os albaneses partiram para cima do rival para defender seu brasão, transformando a partida em uma verdadeira batalha campal, que contou com a invasão de campo da torcida. 

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