Com a camisa do Atlético, o argentino Carlos Galván fez 57 partidas, marcou três gols e, apesar de contabilizar apenas um título estadual, duas décadas depois de deixar o clube ainda convive com o carinho do torcedor alvinegro. Com 46 anos – ele fez aniversário na última segunda-feira –, o hermano há cinco exerce a função de treinador e, após passar por várias divisões, sonha com uma oportunidade num clube gigante; segundo ele, sem se importar com o país.
Cria do Racing, onde chegou aos oito anos e saiu aos 22, Galván veio para o Atlético sem grande holofote, mas, em pouco tempo, ganhou o carinho da Massa. Durante os 16 meses que permaneceu no clube mineiro, colocou em prática o tradicional “DNA argentino” e, pela péssima situação financeira do clube, acabou sendo negociado com o Santos.
Em 2001, o ex-zagueiro talvez vivera um dos momentos mais especiais de toda carreira. No reencontro com o Atlético, em pleno Mineirão, viu o torcedor adversário entoar o seu nome e, ao ouvir o hino do clube pelo qual fora vice-campeão brasileiro, “traiu” por alguns minutos o Peixe. Ao verem o argentino cantando junto com os donos da casa, os companheiros de time o questionaram e até o chamaram de louco por aquele ato.
Como mais uma prova de amor ao clube mineiro, Galván tatuou no braço direito o Galo Volpi, marca registrada dos atleticanos. Segundo ele, um gesto para mostrar o quão importante é o Atlético em sua vida.
Nesta entrevista exclusiva ao Hoje em Dia, o argentino ‘mais atleticano’ do planeta conta como tem sido o desafio como treinador, relembra a briga com o goleiro Fábio Costa, no Brasileirão de 1999, fala da relação com os ex-companheiros de clube, diz sentir vontade de retornar a Belo Horizonte para assistir a uma partida do alvinegro e muito mais.
O que você faz hoje, depois de alguns anos fora das quatro linhas? Ser treinador de um grande clube é seu maior sonho?
Atualmente sou treinador e fui jogador até 2013. Há cinco anos exerço a função de técnico. Dirigi na primeira divisão, na segunda e também na terceira, e sigo somando experiências para seguir em qualquer país num clube grande. É o que eu mais gostaria para saber para onde estou apontando. É minha realidade.
Há 20 anos, você defendia o Atlético vice-campeão brasileiro. O que mais te marcou naquele time?
Neste vice-campeonato do Brasileiro, o que mais me marcou foi o primeiro grupo que tínhamos. Era um grupo realmente de amigos, e até hoje mantemos contato. Pessoas boas e muito trabalhadoras. Nos fizemos muito forte nas mãos do Humberto Ramos. Ele consolidou uma equipe e, dentro de campo, confiávamos muito uns nos outros. Foi uma pena não conseguirmos o título deste campeonato tão buscado pelo Atlético.
Hoje, o Atlético tem um Centro de Treinamentos que é referência no mundo. Contudo, em 1999, as coisas eram bastante diferentes. Quais foram as principais dificuldades que aquele grupo enfrentou?
Sei que o Centro de Treinamentos do Galo é referência no mundo porque estive lá durante o Mundial com a seleção argentina. Tive a sorte de conhecê-lo. É espetacular, e impressiona a quantidade de campos que tem. A verdade é que é uma maravilha e um exemplo a ser seguido por todos os clubes do continente. Foi muito bom ver alguns ex-companheiros lá trabalhando, como o Marques, na gerência, assim como Hernani, Edgard, Neguete, Valdir, nas categorias de base, e também o Lincoln, como representante. Foi uma alegria enorme. Sinceramente, naquela época não tivemos muitas dificuldades; a gente tinha condições de trabalho, e demonstramos isso dentro do campo.
O clube tinha dificuldades financeiras e precisou te vender ao Santos. Foi uma grande decepção para você naquela época?
Sim. Foi uma decepção para mim. Eu queria muito que o Atlético tivesse me comprado naquela época. Queria ficar no clube, principalmente por estar com minha esposa em Belo Horizonte, e minha filha estava prestes a nascer. Realmente saiu uma oferta do Santos, e o Galo não podia recusar. Se tivesse ficado, ficaria muito encantado, porque foi um clube que me marcou bastante. Apesar dos 20 anos que se passaram, tenho contato com os torcedores e vejo que o carinho segue muito grande.
Aquele duelo contra o Vitória, em que houve uma briga generalizada no Independência, foi um dos que mais te marcaram? O que você lembra daquele dia?
Perdemos de 2 a 1 no Independência, onde o Fábio Costa foi bastante provocador. Não era necessário, pois faltava pouco para terminar o jogo. Eu fui mais para separar, pois até o momento não havia uma briga. Quando saí correndo para isso, ele (Fábio Costa) veio e me deu um chute, como todos viram. Ali, perdi a cabeça. Realmente foi uma batalha campal, onde eu estava ‘imparável’ e não sosseguei até acertá-lo da maneira que eu queria.
Você tem uma tatuagem do Atlético no braço. Sonha em voltar a BH para acompanhar um jogo junto aos torcedores?
Sim. Tenho o Galo tatuado no braço. Não apenas como uma recordação, mas sim porque foi o clube que mais me identifiquei na minha carreira futebolística. Sem dúvida que em algum momento voltarei para assistir a uma partida, mas tranquilo, sem chamar atenção. Não quero mídia nem nada disso.
Você enfrentou o Atlético jogando pelo Santos e teve o nome gritado pelos torcedores. Foi um dia especial?
Quando joguei contra o Atlético, no Mineirão, a verdade é que foi uma sensação rara. Lembro que estava aquecendo no campo e aí escutei o hino do Galo. Aquilo me trouxe várias recordações, e eu comecei a cantar junto. Alguns dos meus companheiros de Santos viram aquilo e me perguntaram o que eu estava fazendo. Lembro que disse a eles para não se preocuparam porque ganharíamos com um gol meu. Me olharam como se pensassem que eu era um louco. Realmente estava (risos). Quando entramos no campo, a torcida gritou o nome de todos os jogadores e, depois, também o “ê ô ê ô, o Galván é o terror” e o “doutor, eu não me engano, o Galván é atleticano”. Jamais vi algo parecido e jamais vou me esquecer daquilo.
Quantos filhos você tem atualmente? Sabem do seu amor pelo Atlético?
Tenho duas meninas. A mais velha é mineira e tem 18 anos. O respeito e o carinho que tenho pelo Atlético, ela também tem. Ela conhece bem a minha vida no futebol. Por sorte, tive uma carreira muito vitoriosa, em clubes que não pensava atuar.
Sonha em trabalhar no Atlético ou no Racing? Qual o significado de ambos na sua vida?
Sonhar não custa nada. Sonhar é grátis. Então não me custa sonhar em trabalhar no Atlético ou no Racing. Um é o clube que me formou, que fiquei dos 8 aos 22 anos, e logo fui para o Galo. Em pouco tempo no Galo, tive a sorte de me apaixonar por um clube. Se não fosse o Atlético, não chegaria nesta idade com tanto sucesso na carreira. São dois clubes que me marcaram para sempre.