Agora é lei: o projeto que institui no Estado do Rio o nebuloso "Programa de Resgate de Valores Morais, Sociais, Éticos e Espirituais" foi sancionado na quinta-feira (17) pelo governador Sérgio Cabral (PMDB). A responsável pela iniciativa é a deputada Myrian Rios (PSD), atriz e também missionária da Renovação Carismática Católica.
Na sexta-feira (16), a chamada "lei dos bons costumes" foi um dos assuntos mais comentados - e criticados - no Twitter entre usuários brasileiros. A finalidade do programa não está clara. Na justificativa do projeto apresentada à assembleia e divulgada pela deputada em redes sociais, ela afirma que a sociedade "vem cada dia mais se desvencilhando dos valores morais, sociais, éticos e espirituais", acrescentando que, sem eles, "tudo é permitido, perde-se o conceito do bom e ruim, do certo e errado".
Segundo Myrian, que posou nua para revistas masculinas no fim da década de 1970, quando se casou com o cantor Roberto Carlos, o objetivo principal é "conscientizar e reinserir valores para construir um futuro melhor".
Redação
O texto da lei estabelece que o programa deverá envolver "diretamente a comunidade escolar, a família, lideranças comunitárias, empresas públicas e privadas, meios de comunicação, autoridades locais e estaduais, organizações não governamentais e comunidades religiosas" na chamada revisão dos valores.
Após uma chuva de críticas, a deputada escreveu no Twitter que "em momento algum se faz discriminação contra qualquer religião ou sexualidade". Um dos críticos havia escrito para ela que "a discriminação é clara, evidente, preconceituosa e ilegal; em especial contra gays e ateus".
Parlamentar
Eleita em 2010, Myrian já declarou no plenário da assembleia: "Ora, se somos todos iguais, com os mesmos direitos, eu também tenho que ter o direito de não querer um funcionário homossexual, se for da minha vontade".
No mesmo discurso, ela insinuou que a luta contra a homofobia estimularia a pedofilia, depois disse que foi mal interpretada e pediu desculpas. Na sexta, a deputada disse que o projeto trata do "resgate de valores da vida". Perguntada sobre como a questão do aborto seria abordada no programa, ela declarou: "Sou completamente contra. Isso é um valor moral."
Segundo Myrian, a definição das prioridades será uma atribuição do governo estadual. Estão previstos convênios com prefeituras e ONGs. Indicada como órgão gestor, a Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos foi procurada pela reportagem, mas divulgou apenas uma nota, informando que a lei "ainda precisa de um decreto regulamentando-a e indicando os critérios de execução". "Ao publicá-la, o governador entende que se trata de um programa importante, mas não é uma lei autoaplicável", acrescentou.
O secretário Zaqueu Teixeira (PT) não quis dar entrevista.
Avaliação
Professora da Faculdade de Educação da UFRJ, Tania Zagury avalia que seria mais válido o governo investir na qualificação do magistério. "Cidadania e valores éticos não surgem por meio de decretos ou leis. É quase uma volta da moral e cívica, com o risco de se misturar a questões religiosas. O Estado deve ser laico, não pode interferir nisso." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.