(FLAVIO TAVARES)
A paixão do mineiro por boa cerveja vem rendendo ótimos frutos para a economia do Estado. Com uma infinidade de sabores, a produção da bebida artesanal por aqui dobrou desde 2014, com crescimento estimado em 20% ao ano de lá pra cá. Em 2018, Minas bateu o recorde, com produção média de 2,1 milhões de litros por mês, ou 25 milhões no ano.
De acordo com o Ministério da Agricultura em Minas Gerais, existem atualmente 241 microcervejarias registradas aqui, a maior parte delas (51) na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Números robustos que já renderam ao Estado o apelido de “Bélgica brasileira”.
Conforme dados do Caged, Minas também foi o Estado que mais gerou empregos no setor de janeiro a outubro do ano passado, com 278 vagas em cervejarias artesanais independentes, com até quatro colaboradores, e 382 em grandes indústrias, acima de 100 funcionários.
Flávio TavaresCapa Preta é uma das 15 cervejarias instaladas no Jardim Canadá, em Nova Lima, pólo de fabricação da bebida
De acordo com Marco Falcone, vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Cerveja e Bebidas em Geral (Sindbebidas) e cervejeiro sócio da Falke Bier, o sucesso é um reflexo da mudança cultural, que inseriu o apreço pela degustação no paladar do mineiro.
“O crescimento de 20% ao ano vai na contramão da economia e do cenário das cervejas industriais, cujas vendas caíram 3% no ano passado, seguindo o caminho inverso. Os jovens descobriram que eles podem escolher entre uma variedade enorme de cervejas, não apenas as opções clara ou escura”, diz.
Para Kelvin Azevedo, presidente da Associação dos Cervejeiros Artesanais (ACervA Brasil), o crescimento do setor pode ter sido ainda maior, já que constantemente surgem novas cervejarias ciganas, que terceirizam a produção dos rótulos para os grupos maiores. “Acreditamos que o Estado possa ter crescido até mais de 100% nos últimos cinco anos, porque surgiram muitas cervejarias ciganas, sem chão de fábrica. Toda hora eu fico sabendo de uma nova”, diz.<EM>
Jardim Canadá
Pólo de maior concentração em Minas, o bairro Jardim Canadá, em Nova Lima, [/TEXTO]a 20 quilômetros do centro de BH, reúne cerca de 15 pátios cervejeiros.
Uma das marcas mais tradicionais da região, a Krug Bier produziu, sozinha, 200 mil litros no ano passado. Herwig Gangl, um dos sócio da cervejaria, atribui o crescimento da marca à conquista de espaço nas gôndolas.
“Conseguimos espaço nas prateleiras dos supermercados e as cervejas artesanais puderam chegar mais facilmente ao consumidor. Além disso, a concorrência cresceu e os preços caíram, o que também deixou a bebida mais atrativa”, afirma.
Para 2019, a marca tem uma meta ousada. “Esperamos que a produção cresça 30%, um desafio grande, mas que é viável” afirma Gangl, que se prepara para lançar três rótulos ainda no primeiro semestre deste ano.
FLAVIO TAVARES Popularização e espaço nas gôndolas elevaram a produção da Krug Bier para 200 mil litros em 2018, diz Herwig Gangl
Vizinha da Krug, a cervejaria Küd também viu o faturamento estourar. Nos últimos três anos, a produção praticamente dobrou e o espaço passou por três expansões. “O mercado brasileiro como um todo está aberto para a cerveja artesanal. Houve uma mudança na cultura do consumo, e uma vez que você apura o paladar, é difícil voltar atrás”, afirma Bruno Parreiras, sócio-proprietário da marca.
André Bastos, sócio da cervejaria Capa Preta, acredita que o histórico de boas produções é um dos fatores que favorece a região. “Temos uma história bem construída em Minas, nos últimos 20 anos, com cervejarias que despontaram nacionalmente e internacionalmente. Nova Lima se tornou um polo, o que também contribui para a troca de experiências entre produtores e consumidores”.
Nova legislação libera parques cervejeiros dentro de BH
Em 2019, passou a valer uma nova lei, sancionada pelo prefeito Alexandre Kalil (PHS) em setembro de 2018, que permite a produção de cervejas artesanais no perímetro urbano da capital. Até o ano passado, as microcervejarias e os “brewpubs”, fábricas com bar acoplado, eram considerados indústrias e sua instalação só era permitida no complexo industrial e em grandes avenidas.
Como efeito da nova legislação, fábricas menores, com até 720 metros quadrados, terão exigências de localização e fiscalização sanitárias semelhantes a bares, o que possibilitará a criação de mais empresas dentro da cidade. Por causa da norma antiga, os estabelecimentos se concentravam principalmente na Região Metropolitana, em cidades como Nova Lima, Contagem e Ribeirão das Neves.
Para Kelvin Azevedo, presidente da ACervA Brasil, a mudança deve incentivar ainda mais o mercado cervejeiro local. “Foi uma vitória para o setor. Vai reduzir problemas de zoneamento e burocracias, favorecendo a produção e o surgimento de novas cervejarias”, diz.
Com a mudança, algumas marcas já se preparam para abrir filiais dentro da capital, como a Falke Bier, que fica em Ribeirão das Neves e vai inaugurar um “brewpub’ em fevereiro, na rua Major Lopes, bairro São Pedro, região Centro-Sul de BH. “Já sabemos de várias outras marcas que pretendem abrir também. A tendência é que Minas exploda ainda mais como pólo cervejeiro”, diz Marco Falcone, sócio-proprietário da Falke.
Obstáculos
Apesar dos incentivos, o empresário Bruno Parreiras, sócio na cervejaria Küd, faz uma ressalva aos novos empreendedores. No mercado há nove anos, ele garante que ainda existem desafios e barreiras a serem vencidos.
“Não é só cerveja e alegria. É um mercado prazeroso de trabalhar, mas tem uma série de particularidades que tornam mais difícil o trabalho do empreendedor. A questão tributária é complexa, temos dificuldade de precificação, já que a matéria-prima é atrelada ao dólar, e há restrição de fornecedores, principalmente de garrafas e malte”, pondera.