
Mesmo que o senso comum aponte que os mais vulneráveis estariam mais expostos a golpes virtuais, especialmente os idosos, as pesquisas não comprovam isso. No ano passado, uma ampla consulta do DataSenado, que entrevistou quase 22 mil pessoas, indicou que os mais afetados são jovens entre 16 e 29 anos, que correspondem a 27% das vítimas. A faixa com mais de 60 anos, considerada vulnerável por ter migrado para uma realidade totalmente nova, digital, já na idade aduta, representa 16% delas.
O coordenador do Instituto DataSenado, Marcos Ruben de Oliveira, explica que os resultados da pesquisa "não evidenciam que os idosos sofrem mais golpes", ainda que haja maior participação dos jovens na população brasileira.
A diferença entre os golpes a que estão submetidos os mais novos e os mais velhos está na natureza da fraude. Os golpes para os mais velhos geralmente são os enquadrados como estelionato, crimes contra o patrimônio que consistem em ludibriar alguém para obter vantagem própria, em prejuízo da vítima, popularmente conhecidos pelo artigo 171 do Código Penal. Nesse grupo está classificada uma gama de exemplos que se tornam cada vez mais engenhosos, desde clonagem de cartão, golpe do Pix, central de banco fictícia, até a captura de dados por telefone e pela internet. Ou seja, trata-se de uma engenharia social em que os criminosos montam falsas centrais telefônicas e vasculham e cruzam dados disponíveis pelas redes sociais ou invadindo bancos de dados.
Os jovens também caem nessas tramóias. Mas geralmente os golpes possuem um outro perfil, segundo o economista Luciano Póvoa, consultor do Senado para a área de regulação econômica.
"São seduzidos por promessas de emprego pela internet e ganhos fáceis sem sair de casa, por exemplo. Alia-se a isso fatores como baixa escolaridade, dificuldade em identificar conteúdos falsos e o tempo de uso dos celulares. Os jovens estão muito mais expostos a golpes virtuais, diante da maior frequência de uso da internet".
De acordo com pesquisa realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic), ligado a Unesco, que avalia os usuários de internet por frequência de uso, 99% dos jovens entre 16 e 24 anos declararam que estão conectados à internet todos os dias ou quase todos os dias. O percentual cai para 96% na faixa etária entre 10 e 15 anos. Os brasileiros acima de 60 anos são os menos expostos: 88% dos consultados disseram que se conectam todos os dias ou quase todos os dias.
Crimes cibernéticos
O Senado está atento a essa nova realidade. Uma das providências mais recentes foi criar, no dia 25 de março, a Frente Parlamentar de Apoio à Cibersegurança e à Defesa Cibernética que será presidida pelo senador Espiridião Amin (PP-SC). Instituída pela Resolução 55/2024, a frente será mista, composta inicialmente por 18 senadores e quatro deputados federais.
"O que se pretende com esta frente é debater, conscientizar e criar através da interface público-privada um mecanismo para a sociedade se defender e atualizar-se em matéria de segurança cibernética", explica Esperidião Amin.
Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2024 revelam um aumento de 13,6% no número de estelionatos digitais entre 2022 e 2023. Em contrapartida, houve uma redução de quase 30% de roubos físicos a bancos e demais instituições financeiras.
Diante dessa migração dos crimes reais para os digitais, a frente pretende desenvolver mecanismos para ajudar a combatê-los. Ela vai debater temas como elaboração de políticas públicas de defesa cibernética, criação de uma agência reguladora nacional responsável pela coordenação de respostas a ataques cibernéticos, e instauração de parcerias entre a indústria de cibersegurança e órgãos públicos para o desenvolvimento de tecnologias e inovações no setor.
A mesma pesquisa realizada pelo DataSenado demonstrou que 24% dos brasileiros com mais de 16 anos foram vítimas de algum golpe digital. Estima-se que mais de 40 milhões de pessoas perderam dinheiro em função de algum crime cibernético.
O Brasil, em 2022, sofreu mais de 103 bilhões de tentativas de ataques cibernéticos. Só em 2024, as estimativas são de que violações de dados provocaram prejuízos da ordem de R$ 2,3 trilhões para os brasileiros.
A América Latina destaca-se como a região com maior dificuldade de respostas a incidentes cibernéticos, com aproximadamente 42% das organizações latino-americanas expressando preocupações com esse tipo de crime, segundo a pesquisa Global Cybersecurity Outlook de 2025, realizada pelo Fórum Econômico Mundial (WEF). Além disso, conforme levantamento do fórum, existe uma escassez de 4,8 milhões de profissionais qualificados em cibersegurança.
Comissão de Direito Digital
O Senado possui uma comissão permanente para tratar dos temas relacionados ao mundo digital: a Comissão de Comunicação e Direito Digital (CCDD), criada em 2023 como parte de uma reestruturação dos colegiados da Casa.
Atualmente, a comissão analisa 106 projetos de lei sobre esse tema e já aprovou 23 desde a sua criação. Composta por 17 senadores titulares, a CCDD possui duas subcomissões em funcionamento: uma permanente para debater a desigualdade e a exclusão digital no Brasil e outra temporária para viabilizar o surgimento de juizados especiais para julgar crimes cibernéticos.
Um dos primeiros projetos aprovados na CCDD tratou de extorsão digital. O PL 1.049/2022, que agora aguarda relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), tipifica o crime, acrescentando um artigo no Código Penal para incluir a extorsão digital no rol de crimes. O projeto também estabelece o aumento da pena em até dois terços nos casos em que o crime provocar a paralisação de serviços essenciais à população e comprometer dados relacionados aos sistemas de educação, saúde e segurança pública. A proposta foi apresentada pelo senador Angelo Coronel (PSD-BA).