O Dia Internacional da Prostituta, ou "Puta Day", é celebrado em todo o mundo no dia 2 de junho. Mas, mais do que celebrar, a data é marcada por reunir e dar visibilidade às principais reivindicações das profissionais do sexo. No Brasil, a principal pauta da categoria é que a dita profissão mais antiga do mundo seja, de fato, reconhecida e regulamentada como uma profissão.
Ao longo desta semana, a Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig) promove uma série de ações voltadas para as prostitutas de BH, que inclui bazar, dia de beleza, o lançamento do livro "A Voz das Putas" nesta sexta-feira (7) e a oficialização da cessão de um casarão histórico da rua Guaicurus à Aprosmig, o que será feito com a instalação de uma placa anunciando o que o imóvel se tornará no futuro: o Museu do Sexo.
Segundo a presidente da Aprosmig, Cida Vieira, a associação conta com 3.500 prostitutas cadastradas, que atuam no entorno e na rua Guaicurus. Só que sem a regulamentação da profissão, elas continuam à margem de diversos direitos e submetidas a todo tipo de violência, inclusive, institucional.
"Este evento que estamos promovendo esta semana é uma forma de falar sobre a necessidade de dar direitos e políticas públicas às profissionais do sexo, e também sobre a questão da violência contra as mulheres. É um direito delas serem vistas como mulheres trabalhadoras. É importante dizer: respeite o trabalho sexual das mulheres. É um trabalho digno como outro qualquer e é com esta renda que elas sustentam a casa, os filhos, a família", conta Cida.
Sobre a violência institucional, ela lembra que a própria falta de direitos e de políticas públicas para estas trabalhadoras já é uma forma de violência. Segundo ela, isso é potencializado na prática quando, por exemplo, as mulheres vão a um posto de saúde e se identificam como prostitutas e o profissional de saúde demonstra receio de tocar nelas para examinar. Ou quando tentam registrar uma ocorrência de estupro e têm sua denúncia deslegitimada ao anunciarem com o que trabalham.
E a própria saúde integral dos corpos dessas mulheres acaba ficando ameaçada. "É um direito que reivindicamos também e que poderia vir com a regulamentação da profissão. Porque a saúde da mulher que é prostituta acaba sendo focada somente na região pélvica. Quando elas vão a um médico, por exemplo, e falam que são prostituas, o atendimento é todo direcionado a esta área, mas sabemos que é importante cuidar da saúde integral", explica.
Ocupação ou profissão?
A única política pública voltada para a categoria de profissionais do sexo na história do Brasil foi a inclusão do trabalho na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), o que veio a acontecer somente em 2002 com a reedição da listagem. Até então, a profissão era considerada proibida no país.
Definir a prostituição como uma ocupação coloca o trabalho no mesmo rol da categoria dos profissionais autônomos. Ou seja, as profissionais do sexo continuam descobertas de direitos trabalhistas. Como diz a própria definição da CBO no Ministério do Trabalho, "os efeitos de uniformização pretendida pela Classificação Brasileira de Ocupações são de ordem administrativa e não se estendem às relações de trabalho".
"A maioria destas mulheres gostaria de ter o reconhecimento e o respeito pelo trabalho que exercem. Porque quando você não é reconhecido, você é excluído do acesso aos serviços de saúde e políticas públicas, a garantia de direitos fica uma coisa meio solta, perdida. A regulamentação, então, abarcaria tudo isso: os direitos trabalhistas e o direito de ir e vir com dignidade", explica a psicóloga Elizabeth de Magalhães Fernandes, que trabalha na Aprosmig.
A série de ações realizadas pela associação por conta do Puta Day é uma forma de visibilizar as prostitutas e suas pautas. "As mulheres que estão aqui são mães, filhas, avós e putas. Elas estão aqui cuidando da família, trabalhando com dignidade, sustentando suas casas, pagando suas faculdades, as escolas dos filhos. Elas pagam seus impostos como qualquer outro profissional. É daqui que elas tiram o seu sustento. E é por isso que elas também querem e precisam de direitos", conclui.
Casa de Florinda
O casarão histórico instalado na rua Guaicurus, além de poder servir de sede para a Aprosmig, que atualmente se instala nos fundos de um estacionamento na mesma rua, irá se tornar o Museu do Sexo em Belo Horizonte.
"Conseguimos este casarão por meio de uma parceria com a prefeitura em 2016 e, além do usufruto, também temos a missão de revitalizá-lo e reformá-lo. Para isso, vamos pedir ajuda de empresários de Belo Horizonte. Ali, pretendemos contar a história da rua Guaicurus, junto com todas as histórias que já passaram por aqui", explica a presidente da Aprosmig, Cida Vieira.
Ela conta que o casarão, que hoje é um patrimônio da cidade, pertecenceu a uma senhora chamada Florinda, que se prostituía na rua Guaicurus e acabou criando a casa para ela e outras mulheres trabalharem com mais segurança.
"As histórias circulam pelos quartos, passam pelos corredores, descem as escadarias e vão para a rua. A Guaicurus pulsa história o tempo todo e por isso que este resgate histórico é necessário. É uma rua que, por exemplo, já teve glamour nas décadas de 50 e 60. Os casarões e hotéis aqui já foram cabarés. E as prostitutas são as protagonistas destas histórias", lembra a psicóloga Elizabeth Fernandes.
O ensejo de uma retomada cultural da rua começou com o Carnaval de Belo Horizonte. Um dos maiores blocos da cidade desfila pela Guaicurus. Hoje, também é um dos palcos da Virada Cultural de Belo Horizonte.
E a Aprosmig quer mais. "É uma forma de ocupar os espaços que a gente tem na cidade e a rua Guaicurus é um importante espaço. Vamos transformá-la em uma passarela da cultura, e já estamos pensando em, por exemplo, organizar uma festa junina pro ano que vem", revela Cida Vieira.
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