Mudança de estratégia

Bandidos 'refinam' golpe do aniversário para fisgar vítimas e aumentar lucro

Ana Paula Lima
apaula@hojeemdia.com.br
19/06/2023 às 12:21.
Atualizado em 19/06/2023 às 17:19

Bandidos que aplicam o golpe do aniversário estão sofisticando a abordagem das vítimas para ganhar a confiança delas e garantir o lucro. Fazem isso à medida em que o crime vai se tornando mais conhecido da população, em geral após os casos serem divulgados pela polícia e na imprensa. Só em 2023, pelo menos 44 boletins de ocorrência por estelionato foram registrados em Minas por pessoas que viram a promessa de ganhar um presente, no dia do aniversário, se transformar em um rombo na conta bancária. Em várias situações, o prejuízo superou R$ 10 mil.

Levantamento feito pelo Hoje em Dia a partir dos BOs mostra que houve situações em que os criminosos falaram que o “mimo” era enviado por antigos colegas de trabalho, citando exatamente a última empresa ou órgão onde o aniversariante foi empregado.

Em outros casos, para “justificar” a taxa de entrega – despesa improvável quando se está recebendo um presente –, mentiam alegando que foi feita uma primeira tentativa de envio, mas não havia gente em casa, ou que o endereço original informado pelo remetente estava errado. A segunda visita, portanto, só poderia ser feita se houvesse a concordância de pagamento da tarifa – na verdade, um pretexto para a quadrilha ter acesso ao cartão da vítima e usar os dados para fazer as compras não autorizadas.

R$ 20 mil foi o prejuízo dado por bandidos a um morador de Uberlândia, de 71 anos. Ele foi atraído para a armadilha com a promessa de que receberia chocolates. Cartões da filha dele também foram usados para pagar a “taxa de entrega”

Outra estratégia para tornar a conversa verossímil é oferecer à pessoa a opção de retirar o presente na loja física ou a comodidade de recebê-lo no próprio endereço, mediante um pagamento “irrisório” – as taxas, em geral, variam de R$ 6 a R$ 8. A segurança dada pela suposta existência de um ponto de venda fixo e o valor baixo do delivery serviam de isca.

Tática refinada

Estelionatários têm tempo de sobra para criar estratégias para agir, afirma o delegado aposentado Islande Batista – que por 36 anos trabalhou na Polícia Civil mineira, parte deles investigando fraudes e roubos. 

“À medida em que o golpe se torna conhecido ou a população vai ficando mais alerta, os golpistas estudam novas formas para ludibriar a possível vítima. Pensam: ‘vamos lapidar isso aqui’”, diz. “Tudo para obter a vantagem indevida”. 

De acordo com o policial, quando a vítima cai na conversa, fica cara a cara com o golpista e começa a desconfiar de uma armação, o bandido, em geral, sai de cena. 

Foi exatamente o que aconteceu com uma moradora do bairro Serra, em Belo Horizonte. Após o motoqueiro enviado por uma suposta floricultura avisar que os cartões da idosa “só ficavam processando” na máquina, sem completar a operação, ela suspeitou estar diante de uma cilada. 

Segundo a mulher relatou à polícia, o entregador, “assustado”, disse que “não faria isso com ela” e foi embora. Mas já era tarde: a senhora descobriu depois duas compras fraudulentas, uma delas de R$ 14.999,99.

Nesses casos, tentar memorizar a placa da moto e guardar características físicas do piloto para repassá-las à polícia é uma dica, diz Batista. O que está fora de cogitação é enfrentar o criminoso. “Jamais parta para cima, pois quem está fazendo a entrega não é uma pessoa de bem. Pode agredir”, diz.

A Polícia Civil informou, por meio da assessoria, que abriu inquéritos para apurar os crimes de falsos presentes.

Como funciona o golpe

No golpe do aniversário, alguém entra em contato, por telefone ou WhatsApp, com o “alvo” informando ter chocolates, flores ou outro mimo para presenteá-lo. Como a pessoa de fato está comemorando a data, acredita na oferta, confirma o endereço de entrega e fica aguardando o motoboy. Quando ele chega com a sacola da loja, informa ao aniversariante que há uma taxa de frete a ser paga apenas no cartão.

“Aí existe o golpe. A vítima passa o cartão uma, duas, três vezes, às vezes muito mais, e o motoboy avisa que está sem sinal e que então retornará ao local com uma nova máquina”, explica a delegada Bianca Prado, em vídeo divulgado pela Polícia Civil de Minas. Há casos em que o entregador passa o cartão em duas, três máquinas diferentes, antes de “desistir” da transação e ir embora. Em geral, as vítimas digitam a senha nos equipamentos, e muitas afirmam que a tela mostrava o valor “correto” da taxa ou estava escura.

A pessoa só descobre que caiu num golpe quando chegam notificações bancárias das compras no smartphone, avisos do banco de operações que foram bloqueadas por suspeita de fraude ou ao tirar o extrato da conta. 

Orientações da Polícia Civil para não ser enganado

- sempre que receber um telefonema sobre presentes, confira nos canais oficiais da empresa se há algo sendo mesmo enviado;
- verifique se existe alguma taxa, porque normalmente não são cobradas tarifas de frete de presentes;
- caso receba o presente, não pague a taxa no cartão;
- caso opte pelo pagamento no cartão, ou qualquer vez que for utilizar um cartão em uma máquina, olhe o visor, não entregue o cartão na mão do operador, fique com a máquina em mãos, verifique o valor que está sendo cobrado e faça a operação apenas uma vez; 
- não repita a operação apenas porque o operador pediu; 
- caso tenha sido vítima de um golpe desses, avise imediatamente o banco, comunique o gerente para bloqueio da transação e procure a delegacia mais próxima de casa

 *Colaboraram Gledson Leão e Pedro Melo.

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