Cartão eletrônico elimina cobrador nos ônibus da RMBH

Rosildo Mendes - Hoje em Dia
22/12/2013 às 08:15.
Atualizado em 20/11/2021 às 14:57

(ANDRÉ BRANT/HOJE EM DIA)

Se dirigir um ônibus nas principais ruas e avenidas de Belo Horizonte e região metropolitana já é um martírio, imagine ter que conduzir, prestar atenção no trânsito, receber dinheiro, contar, dar troco, liberar a roleta e ainda ter que anotar o número de usuários ao fim de cada viagem. Essa é a rotina diária de vários motoristas de coletivos que trabalham na capital mineira. A recompensa: um acréscimo de 20% sobre o teto salarial, que gira em torno de R$ 1.580.    Atualmente, em 463 dos 3.091 ônibus do transporte metropolitano, ou seja, 15% da frota, o condutor acumula a função de cobrador, segundo o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG).   No entanto, esse número pode triplicar no próximo ano, segundo Carlos Henrique, diretor de comunicação do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário de Belo Horizonte e Região Metropolitana (STTR/BH).   Ele diz que nas linhas em que for constatado que pelo menos 70% dos usuários pagam com o cartão eletrônico, o cobrador poderá ser eliminado.   O alerta é confirmado por um gerente da empresa Rodap Transportes, que pediu para não ser identificado. “Já é uma tendência nacional a substituição da função do cobrador pelo motorista/cobrador”, afirma.    Carlos Henrique não concorda com a dupla função e diz que a entidade acionou a Justiça sob a alegação de que dar troco e controlar o acesso dos passageiros pode tirar a atenção do profissional e colocar em risco os usuários. “Se não podemos usar telefone celular enquanto dirigimos, não faz sentido que os motoristas possam receber e dar o troco”.   Demora    Os reflexos do acúmulo da função do motorista é sentido pelos passageiros. “A viagem demora mais”, afirma o maçariqueiro Jonas Silva Malaquias Alves, de 26 anos.   Outros dizem que, além do atraso, há também a preocupação com a falta de segurança, pois, na opinião deles, o motorista pode se distrair ao desenvolver as duas tarefas.    O Hoje em Dia entrou em um desses coletivos e pôde constatar que a situação não desagrada apenas aos passageiros. Um dos profissionais, que preferiu não se identificar, denunciou que é obrigado pela empresa a dirigir e cobrar e quem se recusa, pode ser punido. “Em alguns casos, eles dão advertência e até mandam embora”.   “A empresa fala que não pode cobrar e dar o troco com o ônibus em movimento. Mas, se eu não fizer isso, não consigo cumprir o horário”, diz.   O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros Metropolitano (Sintram) não quis se pronunciar sobre o caso.    Empresa descumpre decisão da Justiça   A Vianel Transportes, empresa de ônibus que atua em Sabará, na Grande BH, não poderá manter motorista trabalhando também como cobrador. A decisão é da 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que confirmou decisão da Justiça do Trabalho da 3ª Região (MG), que proibiu o acúmulo de função.    No entanto, mesmo com o parecer do TST há mais de um ano, a empresa ainda não acatou a decisão da suprema corte. O Ministério Público do Trabalho e a Vianel não se pronunciaram sobre o motivo de a empresa ainda obrigar o condutor a desenvolver as duas funções.   A decisão do TST se deu em recurso de revista da empresa em ação civil pública ajuizada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte e Região Metropolitana (STTRBH). A sentença favorável ao sindicato foi proferida pela 18ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte e mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.   A empresa recorreu da decisão ao TST. A relatora, ministra Kátia Magalhães Arruda, destacou que o recurso de revista, em razão de sua natureza extraordinária, não permite a revisão das provas, mantendo a decisão da Justiça mineira.   Outros países   Mesmo tendo um parecer contra a dupla função, a falta de um cobrador, na opinião do especialista em transporte e trânsito Silvestre de Andrade, não deveria ser um problema.  Ele explica que, na Europa e nos Estados Unidos, o sistema em que o motorista é obrigado a acumular a função funciona há mais de 40 anos. “Nesses países, a maioria dos usuários tem um cartão de transporte e quem paga no dinheiro tem que dar a quantia exata”.   No Brasil, segundo ele, para que esse sistema funcionasse, reduzindo as dificuldades dos profissionais, a cobrança teria que acontecer com o carro parado.   Além disso, os usuários deveriam usar o cartão ou pagar o valor exato em dinheiro. Em BH, há apenas 21 pontos de compra e recarga de cartões, segundo o DER.    No Congresso, proposta para proibir dupla função   A dupla função de motoristas de ônibus, que também atuam como cobradores, pode acabar em todo o território nacional. Em abril deste ano, o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) apresentou um projeto de lei que altera o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), pedindo a inclusão da proibição da dupla tarefa dos condutores.   Segundo a assessoria de imprensa do parlamentar, o projeto aguarda votação na Comissão de Viação e Transporte, na Câmara dos Deputados. Na avaliação do deputado, se dirigir e falar ao celular é proibido porque tira a atenção do motorista, receber dinheiro, dar o troco e liberar a catraca eletrônica afetam ainda mais a concentração do motorista.   Pelo projeto, a dupla função passaria a ser infração gravíssima. Embora o motorista seja autuado, a intenção é a de que apenas a empresa de ônibus sofra as punições. No entanto, não fica claro na proposta as formas como as empresas seriam responsabilizadas, pois está prevista apenas punição ao condutor que dirigir “em concomitância com a função de cobrador ou qualquer outra atividade que desvie a atenção no trânsito”.

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