Com obras atrasadas, ameaça de transbordamento do ribeirão Arrudas continua

Ricardo Rodrigues - Hoje em Dia
02/12/2015 às 06:55.
Atualizado em 17/11/2021 às 03:10

(Editoria de Arte)

Para evitar o transbordamento do ribeirão Arrudas no período chuvoso, sete bacias de contenção deveriam ter sido construídas na região do Barreiro, em Belo Horizonte. No entanto, parte das obras sequer foi licitada pela prefeitura.

Os córregos têm impacto direto ao longo dos 47 quilômetros do maior curso d’água da capital, pois fazem parte da sub-bacia do Arrudas. O investimento previsto na intervenção em seis deles, financiada pela Caixa Econômica Federal, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), é de R$ 234,7 milhões.

Na primeira fase das obras foram gastos R$ 68,4 milhões nos córregos Olaria e Jatobá. A etapa final, ao custo de R$ 29,3 milhões, deveria ter sido iniciada em 2014 e concluída neste ano. Porém, a Secretaria Municipal de Obras informa que a licitação foi adiada por tempo indeterminado “para equalizar os critérios e reajusta-los junto ao agente financiador”.

Aberta em 13 de janeiro de 2015, a licitação foi impugnada no mês seguinte pelo Sindicato da Construção Pesada (Sicepot). O presidente da entidade, Emir Cadar Filho, explica que foram questionados os critérios da prefeitura por causa de erros no orçamento, como itens do projeto que não constavam na planilha de custos.

“Com a correção do orçamento, a obra deve ser licitada no próximo ano”, diz Emir. Estão previstos tratamento de fundo de vale, construção de bacias de detenção de cheias, desapropriação de imóveis, remoção e reassentamento de famílias e urbanização de áreas remanescentes.

Longa espera

Enquanto isso, as pessoas continuam convivendo com o risco de transbordamento do Arrudas, como o que ocorreu em 18 de novembro, no bairro Betânia, Oeste de BH.

Com um guarda-chuva na mão, o aposentado Hermínio José Barbosa, de 80 anos, acompanha o início das obras nos córregos Túnel e Camarões, contratadas por R$ 63,1 milhões. A previsão era a de que elas começassem em 11 de junho de 2014, para serem finalizadas em 10 de junho de 2016. A estimativa da prefeitura, no entanto, é a de que sejam finalizadas no segundo semestre de 2017.

Atento ao trabalho de retificação da calha do Camarões e de instalação de interceptores de esgoto, Hermínio afirma que em todo período chuvoso a água entra na casa onde ele mora há 18 anos, na rua Bispo da Paz. “Os moradores daqui fizeram vaquinha para asfaltar a rua. Agora, a máquina vem e quebra tudo”, lamenta o aposentado.

As obras incluem duas barragens de contenção e áreas de reserva, canalização dos córregos, alças de acesso e sistema viário em duas avenidas, implantação de ciclovia, de paisagismo e parque linear, além de remanejamento de interceptores de esgoto.

Efeitos

Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Marcos Polignano avalia que o atraso das obras compromete a tentativa de bloquear a água de chuva nos afluentes, impedindo que o volume total siga para o Arrudas, minimizando os impactos.

Medo ronda o Barreiro em época de confraternização
O momento é de confraternização. Mas, para as famílias que moram no Olaria, Tirol, Diamante, Vale do Jatobá e outros bairros do Barreiro, o fim de ano vira sinônimo de apreensão. O temor é que o ribeirão Arrudas transborde com os temporais e inunde as residências.

“O prazo de entrega foi só mais uma promessa. A conclusão dessas obras ficará para o sucessor do prefeito Marcio Lacerda”, lamenta o metalúrgico aposentado Paulo Ferreira de Sena, de 75 anos. Ele mora há 48 em frente ao córrego Olaria, no bairro homônimo.

Segundo ele, o curso d’água encheu quatro vezes em novembro, por causa da chuva forte. “Cada vez desmorona um pouco mais das margens e arranca um pouco dos gabiões (proteção feita com pedras e telas de arame)”, diz.

Estudante da 7ª série da Escola Municipal Alfredo Vilhena Valadão, Dalety Ester da Silva, de 16 anos, reclama das obras paralisadas. “O lixo fica retido no córrego, que transborda com qualquer chuva”, afirma.

Segundo a estudante Lorena Cristina Silveira dos Santos, também de 16 anos, o bairro fica alagado e a escola isolada quando chove muito. Ela afirma que a prefeitura demoliu casas às margens do Olaria e o volume de entulho aumenta desde 2012.

“É um descaso”, acrescenta Iury Rodrigues Costa, de 17 anos. “A ponte sobre o Olaria não tem guarda-corpo, a gente tem de caminhar no meio da rua, pois há risco de cair lá embaixo”, critica.

Pároco da igreja de Santa Gema, no Olaria, Silvério Siqueira de Moura, de 51 anos, diz que a população se queixa do mau-cheiro, dos escorpiões e da falta de segurança pela ausência de iluminação na avenida principal.
“Isso aqui é um desleixo total. Começou a escurecer, o perigo aumenta. Tem tanto pernilongo que quase carrega a gente. O que tem de rato faz gato fugir de medo”, brinca o padre.

Remendo

Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, Marcos Polignano destaca que o maior impacto na demora das obras é na avenida Teresa Cristina, por onde segue o Arrudas. “A bacia de detenção do córrego Bom Sucesso ficou pronta, mas as outras não estão funcionando”.

Para Polignano, é preciso mudar a política urbana, centrada em canalizações de córregos e impermeabilizações. “As bacias de contenção não são suficientes para resolver o problema. O conjunto da obra é ruim. A água é necessária à cidade, faz parte do ciclo da natureza. Há alternativas ao barramento, que é um remendo de um projeto de cidade que não capilariza a água”.

“O prazo de entrega foi só mais uma promessa. A conclusão dessas obras ficará para o sucessor do prefeito Marcio Lacerda” (Paulo Ferreira de Sena, morador do bairro Olaria)

“As bacias de contenção não são suficientes para resolver o problema (do transbordamento do ribeirão Arrudas)” (Marcos Polignano, presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas)

ALÉM DISSO

Sudecap informa que está limpando e fazendo a manutenção preventiva e corretiva do córrego Jatobá, na região do Barreiro, afluente do ribeirão Arrudas. O serviço preventivo é feito anualmente pela empresa Conservasolo. Entretanto, no portal da Prefeitura de BH, saneamento e drenagem urbana não parecem receber a devida atenção. Para se ter uma ideia, a “Carta de Inundações de Belo Horizonte”, que prevê obras de urgência e emergência nesta área, foi atualizada pela última vez em 4 de setembro de 2012, às 10h11. O Arrudas nasce em Contagem, na região metropolitana, desce por parte da capital até desaguar no rio das Velhas, em Sabará. É formado por vários córregos que nele desembocam: Jatobá, Barreiro, Bonsucesso, Cercadinho, Piteiras, Leitão, Acaba Mundo, Serra, Taquaril, Navio-baleia, Santa Terezinha, Ferrugem, Tijuco e Pastinho. Apesar da limpeza da maioria das nascentes que formam o ribeirão, quase todo o esgoto produzido em BH e Contagem é despejado sem tratamento no Arrudas, o que compromete as bacias dos rios das Velhas e São Francisco.

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