Dez anos depois, Antônio Carlos volta a ser palco de vandalismo, construções irregulares e lixo

Raul Mariano
rmariano@hojeemdia.com.br
13/06/2017 às 20:42.
Atualizado em 15/11/2021 às 09:04

(Lucas Prates)

Uma década depois da conclusão das obras de duplicação da avenida Antônio Carlos, a paisagem da via começa a ter novamente os contornos do passado. Apesar da revitalização e criação de pista exclusiva para o Move, o corredor voltou a ser palco de vandalismo, acúmulo de lixo, aglomeração de dependentes químicos e inúmeras construções irregulares.

Aos poucos, o investimento de R$ 61 milhões feito pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) em desapropriações e remoções na avenida vai se mostrando insuficiente. Em vários trechos da via, barracas improvisadas com madeira, plástico e papelão já estão montadas em encostas.

Hoje, de acordo com a PBH, há 270 áreas com ocupações irregulares na capital mineira

Em terrenos como o que pertencia à extinta empresa de ônibus Transoto, localizado em uma das alças do viaduto Moçambique, o número de construções é cada vez maior. A ocupação já foi mostrada pelo Hoje em Dia há um mês. Porém, desde então, nenhuma proposta para o reassentamento das famílias situadas no local foi feita pela PBH.

Pelo contrário, o espaço que antes só contava com uma construção de alvenaria agora tem quatro edificações de tijolos. Segundo os moradores, o local, batizado de “Vila da Paz”, já tem nove famílias. Em breve, esse número subirá para 14.

Uma das futuras residentes é a cozinheira Juliana Passos. Mãe de três filhos, ela corre contra o tempo para terminar a casa que, por ora, terá apenas um cômodo. Desempregada há oito meses e devendo três de aluguel, ela conta com a ajuda de familiares para sobreviver. 

“O pai dos meus filhos parou de pagar a pensão e agora o caso está na Justiça. Enquanto isso, estou tentando me virar. Pagar aluguel desempregada não tem jeito. Tive que vir”, explica. 

em breve serão 14

Lucas Prates

Barracas improvisadas com madeira, plástico e papelão estão montadas em encostas

Cientes da irregularidades das construções, os moradores esperam por algum posicionamento favorável do poder público sobre o terreno. O pedreiro Wagner dos Santos, que mora em uma barraca enquanto constrói a própria casa, afirma que nem os antigos donos da área nem a PBH deram parecer definitivo sobre o local. 

“Isso aqui era uma área abandonada, cheia de mato, que servia inclusive para práticas de coisas erradas. Hoje está tudo limpo e só tem trabalhador aqui. Estamos apenas tentando um lugar para morar e sair do aluguel”, argumenta.

Conforme a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), 12 lotes às margens da Antônio Carlos foram desapropriados pela prefeitura. Em três deles foi feita a desapropriação integral e o restante parcialmente. Assim, as áreas remanescentes continuam sendo propriedades particulares. 

Em nota, a PBH afirmou que todos os procedimentos adotados às desapropriações têm como prioridade respeitar a dignidade e a segurança dos envolvidos no processo. 

“Além disso, os preceitos constitucionais e legais aplicáveis à desapropriação são seguidos à risca com o objetivo de respeitar os direitos e as garantias fundamentais dos cidadãos, inclusive com o prévio depósito da indenização arbitrada judicialmente ou do pagamento de indenização acordada”.

Notificações foram feitas na área e polícia diz que tem atuado para combater irregularidades

Não bastasse a multiplicação das moradias irregulares, a Antônio Carlos também está marcada por uma série de problemas. O lixo acumulado em diversos pontos da via, as pichações em estações de transferência do Move e a presença de centenas de usuários de crack, principalmente na região da Lagoinha, são alguns deles.

A PBH, por meio da Regional Nordeste, informou que o setor de fiscalização notificou, embargou as obras e aplicou multa por descumprimento do embargo nas construções da Vila da Paz. Segundo o órgão, a medida foi tomada uma vez que os responsáveis pelas edificações não apresentaram a documentação legal, como o projeto arquitetônico aprovado pela prefeitura. 

Segundo o Executivo municipal, os proprietários do terreno já foram identificados e notificados para construírem um muro na área. Eles teriam alegado ao município que já ingressaram com ação judicial de reintegração de posse e aguardam o deferimento de liminar para efetivarem a desocupação e adoção de medidas que impeçam novas invasões.

“Dessa forma, a prefeitura esclarece que o poder de polícia da fiscalização é administrativo e que todas as medidas permitidas pela legislação estão sendo tomadas. O local está sendo acompanhado pela Fiscalização, em parceria com a Polícia Militar”.

Sobre o lixo, a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) informou que uma ação para conscientizar a população será deflagrada na próxima segunda-feira; o órgão garantiu que a varrição na avenida e nas margens é feita regularmente

Quanto às barracas de lonas erguidas em outros pontos, a PBH informou que trata-se de moradias sem características de habitação permanente, ocupadas por pessoas em situação de rua.

Polícia

Sobre o vandalismo, o major Flávio Santiago, chefe da Sala de Imprensa da PM, garante que todos os atos em flagrante são coibidos e que o patrulhamento é feito. No entanto, ele destaca a importância da participação da comunidade para denunciar os fatos. Sobre os usuários de droga, o oficial também diz que a corporação tem atuado. 

“Não temos dúvida de que o usuário de crack também promove crimes. Em média, 3 mil usuários são conduzidos por ano. O uso não foi descriminalizado, mas despenalizado. O usuário vai ser detido, mas vai retornar. Esse é um caso de saúde pública. Uma série de ações conjuntas para melhorar as condições sociais dessas pessoas precisa ser feita”.

Carência de programas habitacionais

Para o urbanista Sérgio Myssior, a fragilidade do programa habitacional adotado pelo município é o primeiro grande motivo para que as construções irregulares voltem a crescer em locais como a Antônio Carlos. Ele destaca que, considerando o fluxo metropolitano de pessoas, a Grande BH tem um déficit habitacional de pelo menos 150 mil imóveis. 

“O poder público poderia apostar em programas como o aluguel social, por exemplo. É uma forma de a pessoa ter uma habitação regular e, com isso, se distribuir melhor no tecido urbano. E não é apenas ter uma moradia, mas viver em um local adequado para essa moradia”, sugere Myssior.

  

(LUCAS PRATES)

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(LUCAS PRATES)

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(FLAVIO TAVARES)

(LUCAS PRATES)

(LUCAS PRATES)

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