Belo Horizonte, 2 de novembro de 2019
Caro leitor,
Sei que os últimos tempos não têm sido fáceis. Algumas notícias, tristes, apareceram neste jornal ao longo desta semana. Porém, aproveito o espaço para lhe contar uma novidade que já tem aquecido o coração de muita gente. O projeto “Carta pra você”, lançado no fim de outubro pelo Movimento Gentileza, em parceria com a Prefeitura de BH e os Correios. Já ouviu falar? Pois bem. Funciona assim: uma criança – ou até mesmo um adulto – matriculada na rede municipal escreve uma cartinha que deverá ser entregue a um idoso. O objetivo é promover interação entre as gerações, estimulando a troca afetiva.
Com o propósito de narrar as duas partes, acompanhei o caminho de uma carta feita por Ana Carolina Gonçalves, de 10 anos. A menina, que estuda na Escola Municipal Francisca Alves, no bairro Santa Terezinha, na Pampulha, pôs no papel os sinceros desejos endereçados à dona Maria Altina Ferreira, de 78. Em uma tarde chuvosa, ao lado dos colegas que também redigiam com empenho e dedicação – afinal, a letra precisa ser legível, alertava a professora –, a remetente mencionou que as pessoas, nos tempos atuais, não têm tido tempo para afetos.
A flor vermelha na cabeça e o cuidado com as frases chamaram-me a atenção. No texto, Ana Carolina dizia que nunca era tarde para praticar gentileza e que o ato deveria ser feito com mais frequência. Dobrou o papel e guardou dentro do envelope, que me foi entregue para levá-lo à dona Maria. Eu e o fotógrafo Maurício Vieira até recebemos um “mimo”: uma caixa de chocolates, acompanhada por uma bela mensagem, e abraços, seguidos por uma breve sessão de selfies.
Emocionado com a atitude tão cativante, mal esperei para ver a reação da senhora que me receberia no dia seguinte no Instituto Geriátrico Afonso Pena (Igap), no Santa Efigênia. Ao entrar no hall, lá estava a sorridente Maria com uma camisa vermelha que brilhava. Nos levou para o quarto onde dorme há dois anos, quando veio de Divinópolis, no Centro-Oeste de Minas. Um adesivo marcava o nome dela na cama, que tinha um rádio ao lado. Ela falou que gostava de ouvir forró e até me convidou para frequentar o instituto, pois “havia muitas mulheres” e seriam necessários homens para formar duplas. Respondi que sim.
Quando soube o que eu levava, dona Maria ficou ansiosa para conhecer o conteúdo da carta. Revelou que não sabia ler, pois não aprendeu na roça, e me pediu que contasse o que estava escrito. Os olhos lacrimejados acompanharam a leitura. “Vai ficar comigo?”, perguntou, aos risos. “É claro que sim”, respondi, de pronto. Pegou o papel e guardou. Nos contou que ficou muito feliz e se mostrou animada ao saber que as colegas também receberiam, em breve, cartinhas: “É coisa linda demais”. Após abraços carinhosos, nos acompanhou de volta ao hall e se despediu. “Fala para ela vir me ver?”, solicitou.
Naquele momento, percebi a potência dos gestos e das palavras sinceras. A gentileza, como havia aprendido com Ana Carolina, deve, mesmo, ser feita a todo momento. Afinal, como ela mesma diz, uma hora pode ser tarde demais.
Se você quiser saber mais sobre o projeto, acesse aqui.
Grande abraço, espero que nos encontremos mais pelas páginas do Hoje em Dia.
Com carinho,
Lucas Eduardo Soares