Formado exclusivamente por mulheres, Baque de Mina leva maracatu às ruas de BH

Lucas Buzatti
05/03/2019 às 19:44.
Atualizado em 05/09/2021 às 16:50

(Lucas Buzatti)

"Mulher tocando maracatu de baque virado é, por si só, uma atitude política". A reflexão é da percussionista Daniela Ramos, que rege e assina a direção musical do Baque de Mina, que desfilou pelas ruas do Centro e do Funcionários pela sétima vez nesta terça-feira (5). 

O grupo percussivo, que sai como bloco durante o Carnaval, dedica-se ao gênero musical de uma das principais expressões populares pernambucanas e hoje conta com 21 mulheres na bateria.

"Quando assumi a direção, em 2017, propus que fosse um grupo exclusivamente composto por mulheres. Então, hoje, já não há homens participando em nenhuma posição. Atualmente, também vemos várias baterias pela cidade compostas exclusivamente por mulheres, o que é muito importante, já que são espaços que os homens ocupam facilmente, simplesmente por serem homens"Daniela RamosPercussionista, regente e diretora musical do Baque de Mina

Daniela Ramos explica que o grupo surgiu em 2013 e foi se reconfigurando ao longo dos últimos anos. "O Baque de Mina foi fundado, curiosamente, por um homem. A proposta era fazer uma inversão de papéis, porque o maracatu de baque virado é uma manifestação popular pernambucana que, na sua origem, não podia ser tocada por mulheres. As mulheres dançavam e os homens tocavam. Então, quando o Celso Soares criou a proposta, a ideia era inovar com um grupo em que as mulheres tocariam e os homens dançariam", relembra. "Só que, em 2015, o feminismo evoluiu e isso começou a gerar alguns questionamentos sobre lugar de fala e o protagonismo da mulher", completa.

"Além da bateria, temos a rainha do Carnaval, Cristal Lopes, e a maravilhosa Juhlia Santos de porta-estandarte. O Baque de Mina se preocupa, dentro do grande espectro do feminismo, em colocar as mulheres trans e negras em posição de destaque", explica.

Para Juhlia Santos, que leva o estandarte desde o ano passado, o Baque de Mina também luta pelas mulheres trans e por travestis. "Quando a Daniela me fez o convite, no ano passado, a princípio tive receio, porque sabemos que esses grupos hegemônicos de mulheres também podem ser transfóbicos. Mas percebi que o Baque de Mina cumpre o compromisso de naturalizar nossos corpos nesses espaços. Eu sou travesti e componho esse espectro do transfeminismo, reivindicando as mulheridades e o feminino, no qual me reconheço. Afinal, não podemos limitar ser mulher somente à genitália", observa.Lucas Buzatti

Baque de Mina é composto exclusivamente por mulheres

Questão racial

A questão racial é outro ponto importante levantado por Juhlia Santos, que também foi porta-estandarte de vários outros blocos da capital. "Dentro do recorte racial e de classe, temos que nos dar conta de que várias mulheres não ocupam esses espaços porque não se sentem confortáveis. Temos que tornar esses espaços seguros para as mulheres negras, naturalizando sua estada, fazendo com que sintam-se abraçadas. A representatividade só existe com nossos corpos presentes".

Batuqueira do Baque de Mina desde 2019, Selma de Souza concorda. "Precisamos ter voz e mostrar que também damos conta, que conseguimos tocar um instrumento muitas vezes melhor que os homens. Sem contar que, quando estamos juntas, temos outra visão, conseguimos conversar sobre assuntos que não nos sentimos confortáveis com homens por perto", afirma. "A mulher, ainda mais a mulher negra, é descriminada em tudo. Por isso, precisamos ter força e coragem para estar nesses lugares e lutar contra o que vem por aí nestes próximos anos".

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