A efervescência do Carnaval de BH está longe de ser um fenômeno recente. Na década de 1930, quando a capital ainda era jovem, as pessoas já ocupavam as ruas do Centro ao som de marchinhas e sambas, participando de batalhas de confetes em o que antes eram chamados de “blocos sujos”.
Esse início da folia na cidade ainda é muito claro na mente de José Luiz Lourenço, o Mestre Conga, grande guardião da história festiva de Belo Horizonte.
Aos 90 anos, o sambista mineiro mostra que está com a memória afiada e relata detalhes sobre a criação de cada uma das primeiras escolas de samba da capital, enumerando datas, nomes e localidades.
Ele lembra que, em 1938, foi criada a Pedreira Unida, na Pedreira Prado Lopes, região Noroeste, escola que logo deu origem a outras. Mas a alegria do povo durou pouco.
“Quando veio a guerra (1939- 1945) e os pracinhas foram lutar na Europa, as manifestações populares foram proibidas. O Carnaval ficou parado até acabar o conflito”, lembra Mestre Conga.
Escolas
A partir de 1946, a realidade mudou. Moradores de bairros então periféricos, como Santo André, Lagoinha, Santo Antônio e Concórdia, se encontravam na avenida Afonso Pena para brincar o Carnaval, caprichando nas fantasias.
Escolas de samba eram criadas em diversos pontos da cidade, como a Escola Surpresa, na Pedreira, e a Unidos do Prado, na região Oeste.
“Havia também vários bailes de gafieira e, por ser menor de idade, eu só entrava para as aulas de dança, nas matinês. Foi o pessoal que conheci nesses bailes que me levou para a escola Remodelação da Floresta, em 1947”, conta Mestre Conga, lembrando que participava da bateria tocando tamborim feito artesanalmente com ripa de telhado, couro e tachinhas de sapateiro.
No ano seguinte, a Remodelação da Floresta o indicou para o concurso Cidadão Samba, realizado pela Rádio Inconfidência. Conga mostrou que tinha samba no pé e venceu o primeiro título carnavalesco, lhe rendendo uma faixa e um prêmio em espécie.
“Nunca ganhei muito dinheiro com samba, mas conquistei experiência e conhecimento. Esse foi o verdadeiro lucro que eu tive”, diz o pai de três filhos, que trabalhou como sapateiro, funcionário público e entregador de jornais
Em 1950, Conga passou a investir no Carnaval com maior seriedade.
Junto a amigos do bairro Concórdia, na região Noroeste, fundou o Grêmio Recreativo Escola de Samba Inconfidência Mineira, onde atuou como folião e “maioral” (nome informal dado ao presidente da escola) até 2006. Sem ele, a agremiação perdeu forças e desfilou somente até 2010.
Observador
Há dez anos, Conga prefere observar o Carnaval à distância. Está feliz em saber que houve uma renovação e os blocos de rua voltaram a fazer parte da cultura da capital.
“O mais bonito nisso é que não há disputa entre o melhor, não tem vaidade. Não como nas escolas, em que há sempre os privilegiados e os desprezados”, observa.
Fica feliz em ver que as escolas voltaram a desfilar na Afonso Pena, mas Conga acredita que poderia haver mais. “O ideal continua sendo a construção de um espaço permanente com arquibancadas e camarotes”, destaca.