Com uma garrafa PET cheia d’água na mão e um rodo com esponja e sabão na outra, o menino W., de 14 anos, dá brilho aos para-brisas de carros parados em semáforos de Belo Horizonte. Enquanto o trabalho ilegal ajuda motoristas a enxergar melhor pelo vidro, ele não vê um futuro brilhante pela frente. “Quero arrumar um emprego bom, mas hoje é tudo muito difícil”, afirma o jovem.
Essa poderia ser apenas a história de um garoto disposto a ganhar a vida fazendo bicos. Mas, alheias às campanhas educativas e políticas públicas de acolhimento, milhares de crianças e adolescentes ainda trocam atividades essenciais, como brincar e estudar, por dinheiro. Prova disso é que o índice de trabalho infantil aumentou em mais da metade das cidades mineiras com população acima de 100 mil habitantes.
Em uma década, 16 dos 29 municípios mais populosos do Estado registraram acréscimo de crianças de 10 a 14 anos exercendo trabalho remunerado. Os dados estão no último Censo, de 2010, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Belo Horizonte lidera o ranking, com salto de 22%. Na época, a pesquisa do IBGE apontava a existência de quase 6 mil menores na informalidade, como o caso de W., que trabalha ao lado do irmão mais velho em sinais na região da Pampulha.
O menino recebe R$ 50 por dia pelo serviço de lavagem de para-brisas. Quem também recebe uma grana, mas não revela o lucro das vendas é P., de 15 anos. O adolescente trabalha de manhã e à tarde vendendo balas, chocolates e bebidas em carrinho, mas estuda à noite. “Passo uma parte do dinheiro para a minha mãe. Não tem como ficar sem trabalhar”, conta o jovem, morador do bairro Ribeiro de Abreu, região Norte de BH.
Causas
Exclusão social, fatores econômicos e principalmente questões culturais são apontadas como causas do trabalho infantil. A análise é do procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) Rafael Dias Marques. Coordenador nacional de Combate à Exploração da Criança e do Adolescente do MPT, ele explica que a agricultura familiar responde pela maioria da informalidade infantil nas cidades do interior. Já nos centros urbanos, o destaque fica por conta do comércio ambulante.
“Os pais acreditam que trabalhar é uma atividade educativa. Para eles, isso é melhor que roubar ou se envolver com drogas. Mas são questões distintas, sem a possibilidade de comparação.ugar de criança é na escola”, reforça Rafael Marques.
Segundo o procurador, desconstruir esse paradigma exige atuação conjunta dos entes federativos e permanentes campanhas de conscientização. O servidor, no entanto, vê avanços no combate. “Com relação ao trabalho nas ruas, por exemplo, diminuiu bastante. O mais complicado é no meio rural, onde a fiscalização ainda tem mais dificuldade de chegar”.
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