Jovens e idosos ignoram riscos e infecções por HIV crescem em Minas

Malú Damázio
mdamazio@hojeemdia.com.br
Publicado em 01/12/2017 às 06:00.Atualizado em 02/11/2021 às 23:58.
 (Flávio Tavares)
(Flávio Tavares)

O número de jovens e idosos infectados pelo vírus HIV cresceu de forma expressiva em Minas na última década. Só entre os adolescentes de 15 a 19 anos, o contágio foi cinco vezes maior, passando de 37 casos em 2007 para 201 no ano passado. Entre os maiores de 65, os registros triplicaram no mesmo período, de acordo com dados da Secretaria de Estado de Saúde (SES). 

O salto nas notificações vai na contramão das melhores condições de diagnóstico e tratamento da Aids. Disponibilizados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), os remédios têm menos efeitos colaterais e a testagem para confirmar a contaminação é rápida. Hoje, Dia Mundial de Luta contra a Aids, especialistas em saúde garantem que a doença ainda parece distante para a maior parte das pessoas. 

“São pessoas que estão por toda parte no nosso convívio, no prédio, na escola, na academia, na faculdade, no trabalho. Mas, quando eles falam, logo são taxados pela sociedade. Não existe uma cara da Aids”
Irene Adams
Imunologista

Embora a população tenha cada vez mais conhecimento, muitos ignoram os riscos e acreditam que não serão contaminados, mesmo diante do sexo desprotegido. “As escolas até trabalham as Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) com os adolescentes, mas existe um enorme abismo entre ter a informação e adotar o comportamento correto”, afirma a médica Irene Adams.

Imunologista, ela coordena o Projeto Ammor, iniciativa de promoção da saúde e prevenção de Aids para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social e pessoas que vivem com o HIV em BH. “A maior parte dos jovens não se reconhece nesse discurso. Acha que, mesmo transando sem camisinha, a doença não vai acometê-los”, acrescenta a especialista, que trabalha na área há 30 anos.

Segundo o infectologista e professor da Faculdade de Medicina da UFMG Dirceu Greco, grande parte da população vive uma aparente impressão de que o HIV está superado. “As pessoas param de falar, parece que ele desapareceu. Só que isso vem acompanhado de uma série de mudanças na vida sexual da população, que hoje é mais precoce. O sexo está mais casual e frequente para todos”, diz.

Sem reforço

Nem sempre o comportamento “sexualmente empoderado”, como classifica a professora da Escola de Enfermagem da UFMG Vânia de Souza, é acompanhado de um reforço na prevenção contra o vírus. 

“As políticas públicas estão voltadas, acertadamente, para a possibilidade de se ter prazer em qualquer idade. Isso é bom, mas precisa ser conjugado com medidas de redução da vulnerabilidade à infecção”
Vânia de Souza
Professora da Escola de Enfermagem da UFMG

Especialista em infecções transmitidas por meio de relação sexual, ela observa que, para os idosos, a disseminação do vírus também está relacionada à vida sexual mais ativa na terceira idade.

“Os idosos estão vivendo uma experiência nova de sexo. Hoje, há vários viúvos ou divorciados que passaram a vida toda com um parceiro, sem adotar qualquer medida de prevenção, e que agora têm vida sexual ativa. Muitos acham que a mesma relação que tinham no casamento irá perdurar nas relações momentâneas”.

Histórias de superação e muito preconceito marcam quem convive com o vírus

Levar uma vida saudável é possível, mas, para muitos soropositivos, a infecção é um segredo guardado a sete chaves. “Hoje, o tratamento é infinitamente melhor, mas o que não mudou foi a ignorância das pessoas. Poucos sabem que é completamente viável conviver com o HIV e que o contágio só ocorre em situações muito específicas, por isso, quem descobre o vírus ainda se sente forçado a esconder”, lembra a imunologista Irene Adams. 

Devido ao preconceito, a médica defende que contar sobre a carga viral é uma escolha de cada um. É o caso da dona de casa Cláudia*, de 37 anos. Só a mãe dela e as duas filhas sabem. “Já namorei homens que nunca mais olharam na minha cara quando contei sobre o vírus. Cheguei a perder empregos porque tinha que fazer exames a cada seis meses”, conta. Ela foi infectada aos 21 anos pelo ex-companheiro, que morreu em decorrência da doença. Desde então, Cláudia segue à risca o tratamento e tem carga viral indetectável.

Qualidade de vida

A recepcionista Laura*, de 51 anos, sai de Ribeirão das Neves, na Grande BH, todos os dias, para trabalhar na capital. Alegre e comunicativa, ela fala da família com brilho nos olhos. “Minha filha me dá muito orgulho e meu marido sempre me apoiou e esteve ao meu lado”. Laura é soropositiva e descobriu a doença aos 32 anos, quando a infecção já estava em estágio avançado.

Após passar seis meses internada no hospital, correndo risco de morrer, tentou, aos poucos, recuperar a qualidade de vida. Mas o tratamento contra a Aids ainda era incipiente no fim dos anos 1990. Ela tomava 20 comprimidos ao dia, chegou a perder a visão de um olho, teve tuberculose e uma grave infecção nos rins.

Hoje, Laura comemora que este seja um passado distante. “Não tem nem comparação. A pessoa que convive com o HIV atualmente consegue ter um dia a dia muito mais tranquilo e digno. Tomo somente uma pílula diária e estou saudável, nem lembro do vírus”, diz.

* Nomes fictícios

SAIBA MAIS

Qual a diferença entre Aids e HIV?

O HIV é o vírus da Aids, muitas pessoas vivem por anos com ele no organismo sem apresentar sintomas. Ainda assim, elas podem transmiti-lo para outras pessoas. A Aids é a doença, quando a pessoa desenvolve as infecções oportunistas e adoece ou quando tem o sistema imunológico comprometido.

Como é a transmissão?

O vírus está presente no sangue, sêmen, secreção vaginal e leite materno de soropositivos e pode ser transmitido quando há contato direto com esses fluidos. As principais formas de contágio são durante relações sexuais (anal, oral ou vaginal) desprotegidas, transfusões de sangue, compartilhamento de instrumentos que perfurem ou cortem, como agulhas e seringas, e de mães infectadas para filhos durante gravidez, parto e amamentação.

Como se prevenir?

Usar preservativo masculino ou feminino durante relações sexuais, utilizar material esterilizado ou descartável em consultórios, barbearias, estúdios de tatuagem e piercing e salões, não compartilhar lâminas de barbear ou de depilar, agulhas ou seringas. 

Onde procurar ajuda em Belo Horizonte? 

Associação de Cidadãos Posithivos - Sempre viva: realiza acolhimento e orientação de pessoas com HIV, além de oferecer atendimento psicológico, oficinas temáticas e terapêuticas, cursos de capacitação. Participa do programa BH de Mãos Dadas Contra a Aids, da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA). Endereço: Rua dos Caetés, 461, sala 504 - Telefone: 31 3213 9149

Onde posso retirar preservativos gratuitamente na capital?

Em todos os 157 postos de saúde e nos 33 Centros de Referência de Assistência Social do município.

Fonte: ACP - Sempre Viva 

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