Minas vira ‘agreste’: Estado vive a pior seca dos últimos 60 anos

Tatiana Lagôa
tlagoa@hojeemdia.com.br
06/06/2017 às 19:51.
Atualizado em 15/11/2021 às 08:57
 (Flávio Tavares)

(Flávio Tavares)

Com o solo e os rios secos não tem plantação, alimento e muito menos emprego. Os postos de saúde lotam de pacientes desnutridos e com doenças provocadas pela baixa imunidade, fruto da fome. Essa pode não ser a realidade da maioria dos moradores do Sudeste. Mas, para muitos dos que vivem em 94 cidades mineiras em situação de emergência por conta da seca o quadro é bem parecido.

A luta pela sobrevivência tende a se agravar e atingir mais municípios ainda em 2017, ano que caminha para ser o pior das últimas seis décadas em termos de disponibilidade hídrica. É o que mostra a terceira reportagem da série sobre reflexos da escassez do recurso publicada pelo Hoje em Dia

Os dias têm sido difíceis na pequena Mato Verde, no Norte do Estado. Dos 12,8 mil habitantes, pelo menos um terço vive do agronegócio – ou, pelo menos, vivia quando tinha água para manter a atividade. “Não tem como plantar e falta água para os animais. Milhares de moradores caminham para ficar completamente sem renda e ainda nem estamos no período mais crítico de seca, que é julho”, afirma o prefeito da cidade, Oscar Lisandro Teixeira. 

Em situação de urgência decretada tanto pelo Estado quanto pelo governo federal, Mato Verde é abastecida por caminhões-pipa e alimentos são distribuídos para os mais carentes. Os seis postos de saúde tiveram aumento considerável de pacientes. “Com a falta de alimentação, as pessoas ficaram mais frágeis e vulneráveis às doenças corriqueiras. Até o alcoolismo aumentou”, conta.

Dificuldades

Varzelândia, também no Norte, é outro município castigado pela seca. Metade dos 20 mil habitantes vivem exclusivamente da agricultura e pecuária. Hoje, estão em grave dificuldade financeira. “Essas pessoas estão tentando emprego na cidade, mas não temos vagas”, afirma a prefeita Valquíria Cardoso.
Até mesmo a educação está ameaçada com a falta de água. Nesta semana, duas escolas públicas do município precisaram de abastecimento com carros-pipa para não fechar as portas.

só piora nos últimos anos

Os problemas com a falta de água refletem uma das maiores crises hídricas vivenciadas pelo Estado. Diretor de Operação Metropolitana da Copasa, Rômulo Perilli diz que a média histórica de chuvas nas últimas seis décadas em Minas é de 1.535 milímetros por ano. O número começou a cair em 2014, quando foram 950 milímetros. 

A situação em 2017, porém, está pior do que há quatro anos. De janeiro até a primeira quinzena de março, choveu 410 milímetros. Em 2014 foram 440. “Tem 60 anos que não temos um índice tão baixo até março”, afirma. 

Em função do baixo nível dos rios, até mesmo os racionamentos e rodízios foram antecipados no Estado. A estratégia de economia do recurso já foi colocada em prática em 16 cidades mineiras. “Estamos saindo do período chuvoso com uma situação próxima ao que deveria estar no mês de julho. É muito grave e preocupante”, observa Perilli.

Conflitos

E como falta água até mesmo para consumo humano, a instalação de empresas está inviabilizada em partes do Estado. Em 62 pontos de diferentes bacias houve a chamada Declaração de Área de Conflito (DAC), feita pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam).

A medida indica que há maior necessidade de utilização do recurso naquele local do que a disponibilidade dele. Dessa forma, se tornam inviáveis novas outorgas de uso, explica o gerente de Pesquisa e Desenvolvimento de Recursos Hídricos do Igam, Thiago Figueiredo Santana. “Declaramos DAC quando as solicitações de outorgas superam a disponibilidade hídrica estimada estatisticamente”.

A partir daí, é formalizado um processo coletivo em que comunidade e empresas chegam a um consenso sobre um rateio da água disponível. No fim, é emitida uma portaria coletiva, o conflito dado por encerrado e novas outorgas liberadas. Há casos, porém, que o DAC existe há 15 anos. 

Rodízio é antecipado em alguns municípios para garantir abastecimento no futuro

Com o risco do desabastecimento rondando várias cidades mineiras, 16 municípios tiveram rodízio ou racionamento implantados antecipadamente neste ano. O Norte, mais uma vez lidera os casos, com 11 localidades nessa situação.

“Os rodízios normalmente ocorrem na fase mais crítica da seca. A medida visa garantir o abastecimento futuro, principalmente no Norte”, afirma o diretor de Operação Metropolitana da Copasa, Rômulo Perilli.

Ações no Congresso também tentam amenizar o quadro. Uma delas é a aprovação da renegociação, junto aos bancos, das operações de crédito rural de custeio e investimento. A medida, válida até 30 de setembro, é para os agricultores dos 168 municípios da área da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

“Minas Gerais é um grande produtor de alimentos, mas depende da água para progredir. Precisamos de projetos de garantam essa água de qualidade para a população”, afirma a deputada federal Raquel Muniz (PSD), autora da recém-aprovada Comissão Externa, na Câmara dos Deputados. 
Formada na maior parte por deputados mineiros, a comissão irá investigar os problemas hídricos em todo o território mineiro e apresentar propostas para fazer frente aos problemas provenientes da seca.

Emergência

Até 10 de maio, 66 cidades mineiras tiveram decretada, pelo Ministério da Integração Nacional, situação de emergência por seca ou estiagem. Para amenizar a seca por aqui, a União está investindo R$ 620,4 milhões em 162 municípios do semiárido, segundo a pasta. O Estado recebeu outros R$ 2 milhões para ações emergenciais nos três primeiros meses de 2017.

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