A violência não é só problema de segurança, mas também de saúde pública. A constatação é de um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) feito em Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, sobre a dificuldade dos profissionais de saúde em lidar com vítimas de crimes.
O trabalho de campo foi realizado em 2012, nas 58 unidades de atenção primária do município, a partir da análise de 316 questionários respondidos por médicos generalistas, enfermeiros, auxiliares de enfermagem e agentes comunitários.
Segundo a tese da psicóloga Renata Cristina de Souza Ramos, mestre em Promoção à Saúde e Prevenção à Violência, 58,2% dos entrevistados afirmaram ter conhecido alguém que, depois, foi assassinado.
Há relatos de mães que tiveram filhos mortos por envolvimento com tráfico de drogas; crianças com marcas de agressão; mulheres violentadas pelos parceiros; pessoas feridas por arma de fogo.
Uma agente de saúde do bairro São José diz que já teve pacientes assassinados e que atende mulheres vítimas de violência doméstica. “Elas fazem de tudo para esconder o que sofrem, por vergonha, medo ou por dependerem financeiramente do marido”, relata a servidora, que pediu anonimato.
Silêncio
Situações como essa, segundo Renata Ramos, contribuem para a subnotificação dos casos de violência.
Ela alerta que a falta de preparo dos profissionais para lidar com o problema impede o preenchimento da ficha de notificação, que é obrigatória e deve ser enviada à Secretaria Municipal de Saúde.
“O levantamento correto dos dados e a capacitação dos funcionários contribuiria para a promoção de espaços mais saudáveis”, diz a especialista. No entanto, Renata lembra que a violência deve ser combatida com investimentos em educação e justiça, além da saúde.
Capacitação para melhorar acolhimento dos pacientes
Médico do Posto de Saúde da Família Porto Seguro, no bairro Nova União, em Ribeirão das Neves, Fernando Ocampo conta que os profissionais de saúde da cidade lidam diariamente com problemas sociais. Ele, por exemplo, atende pessoas que usam drogas e álcool em excesso.
“Há pacientes que chegam agressivos, querendo atendimento urgente, sendo que trabalhamos apenas com medicina preventiva”. Ocampo diz que as situações são delicadas, mas que ele não vai além do que a profissão permite.
Nesse PSF, o atendimento específico é realizado apenas uma vez por mês, quando trabalha um psiquiatra. “Os profissionais precisam ser mais capacitados para acolher vítimas de violência”, diz o boliviano, há 15 anos no Brasil.
Para o Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sindi-Saúde) – Núcleo Ribeirão das Neves, faltam programas para ensinar aos profissionais como fazer uma abordagem mais eficaz e segura dos pacientes.
Aumento
A Secretaria Municipal de Saúde informou que um trabalho de sensibilização com os profissionais fez as notificações de violência subirem 60% em relação a 2012.
O Núcleo de Cultura da Paz também estaria qualificando as equipes para o acolhimento. Já as famílias das vítimas são encaminhadas ao serviço de saúde mental para acompanhamento.