Oito anos depois de aprovada a Política Nacional de Resíduos Sólidos no país, que prevê o manejo adequado dos materiais, a plena implantação da coleta seletiva em Minas Gerais ainda esbarra na falta de gestão nos municípios e de recursos. Como resultado, 44% dos habitantes do Estado ainda não fazem a separação do lixo antes de descartá-lo.
O dado consta em pesquisa do Ibope, a pedido da cervejaria Ambev, e que ainda será divulgada. Para especialistas, o número mostra o tamanho do desafio que é reduzir os impactos do lixo na natureza, assunto debatido globalmente hoje, quando se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente em mais de cem países, dentre eles o Brasil.
“Deixar de reaproveitar os resíduos significa descartar irregularmente materiais que vão contaminar solos e lençol freático, podendo afetar a água e os alimentos que consumimos. Sem contar o desperdício que é abrir mão da reciclagem”, afirma o professor Raphael Tobias de Vasconcelos, do Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental da UFMG.
Segundo o diretor de gestão de resíduos da Fundação de Meio Ambiente (Feam), Renato Teixeira Brandão, desde 2009, o Estado auxiliou mais de 200 cidades na implantação da coleta seletiva. Em algumas, porém, o projeto não foi adiante por conta de mudanças de prefeitos. “A gestão de resíduos sólidos é uma atribuição dos municípios, mas os planejamentos são feitos com visão de apenas quatro anos. Quando muda o gestor, o trabalho é abandonado”.
Além disso, a falta de recursos em plena crise econômica tem travado a realização de iniciativas desse tipo em várias localidades. O custo de se fazer a coleta separando os materiais recicláveis é, pelo menos, três vezes maior do que a convencional, frisa Brandão.
por ano nos oceanos
Prefeituras
Em muitos casos, nem mesmo o Plano Municipal de Resíduos Sólidos, que deveria ser formulado pelas prefeituras, foi traçado. O documento serviria para orientar as ações de destinação ambientalmente adequadas dos rejeitos nas cidades.
Mas, conforme o Ministério de Meio Ambiente, apenas 161 das 853 cidades mineiras fizeram esse trabalho – o equivalente a 18%. Em nota, a pasta informa que “o governo federal tem procurado desenvolver ações para apoiar técnica e financeiramente os municípios na plena execução da Política Nacional de Resíduos Sólidos”.
Onde já foi feito o trabalho, a execução das metas evolui lentamente. Em Belo Horizonte, por exemplo, apenas 36 bairros têm coleta seletiva porta a porta, ou seja, 7,3% dos 487 existentes. Segundo a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), são recolhidos 35% de materiais recicláveis nos lixos doméstico e público.
Os maiores desafios para ampliação da coleta, segundo o órgão, são a captação de recursos para a instalação de equipamentos e aquisição de novas tecnologias, além da dificuldade na construção de outras unidades para processamento de recicláveis.
“Vale mencionar também a colaboração das pessoas em segregar corretamente os resíduos para o recolhimento, sem misturar, por exemplo, orgânicos aos recicláveis, além do apoio dos cidadãos no sentido de conservar os equipamentos de coleta seletiva ponto a ponto nos Locais de Entrega Voluntária (LEVs)”, informou a SLU em nota.
Em BH, 125 mil domicílios são atendidos pela coleta seletiva porta a porta; recolhimento dos materiais recicláveis acontece uma vez por semana
Expansão
Em meio a falta de recursos para expandir a coleta seletiva na capital mineira, prefeitura e associações de catadores se unem para tentar melhorar os números. Atualmente, são recolhidas cerca de 520 toneladas de resíduos recicláveis por mês na cidade.
A SLU espera, neste ano, ampliar a quantidade de equipamentos da coleta seletiva ponto a ponto. Atualmente, há contêineres instalados em 70 endereços nas nove regionais de BH. Nesses espaços, chamados de Local de Entrega Voluntária (LEV), a população pode depositar os produtos.
Ganhos
O que é recolhido é destinado a sete associações de catadores e trabalhadores com materiais recicláveis. Ainda segundo a SLU, essas entidades buscam novas tecnologias, como esteiras elétricas, e maior capacitação na triagem.
O trabalho é considerado benéfico tanto para o meio ambiente quanto para pessoas que atuam na área, como Marilda Cândida de Sousa, de 52 anos, que trabalha como catadora de resíduos há 18.
Com o salário mínimo que recebe mensalmente, ela criou sete filhos, com idades entre 31 a 8 anos. “Consigo muita coisa graças ao meu trabalho. Sempre sustentei meus filhos sozinha porque pensão de pai eu nunca pedi. Minha menina até fez faculdade de administração”, comemora.
Com boa parte dos filhos já no mercado de trabalho, Marilda Cândida começa a fazer novos planos. Um deles é reformar a casa onde mora. “Já vivi na rua com meus meninos, mas acabei ganhando uma casa em Ribeirão das Neves (Grande BH). Quando der, quero fazer outra porque essa está ruim demais”.