A Prefeitura de Belo Horizonte recebeu no fim da tarde de ontem a notificação da Justiça Federal determinando a retirada das capivaras da orla da Lagoa da Pampulha. Especialistas apontam alternativas diferentes para selar o destino dos hospedeiros do carrapato-estrela, transmissor da febre maculosa.
“O Município analisa a melhor forma de cumprir a decisão judicial. Não há prazo para isso”, informa a prefeitura, por meio de nota. A liminar foi expedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, acatando ação movida por uma associação de moradores da Pampulha.
Em 4 de setembro, Thales Martins Cruz, de 10 anos, morreu após contrair a febre maculosa. Quinze dias antes, o garoto, que era escoteiro, participou de atividades no parque ecológico às margens da lagoa.
A Justiça determinou o isolamento das capivaras para que não haja contato com a população, evitando a propagação da doença. Professor do Departamento de Veterinária da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Tarcísio Antônio Rego de Paula é contra a medida, que ele chama de “tiro no pé”.
“A retirada das capivaras não vai acabar com o carrapato-estrela na orla da Pampulha. Vai desequilibrar o que já está desequilibrado. Sem esse hospedeiro, os parasitas sairão picando tudo que é animal que encontrar pela frente. Se um gambá for tomar água na lagoa e se infectar, há o risco de ele espalhar a doença, porque anda pelos telhados das residências”, alerta o especialista.
O Conselho Municipal de Saúde de BH manifestou-se contrário à retirada das capivaras da orla da Lagoa da Pampulha; na semana passada, o manejo dos animais e o combate à febre maculosa foram debatidos em reunião entre representantes do Ministério Público Estadual, PBH e outros órgãos públicos
Ele defende a vasectomia ou ligadura de trompas das capivaras adultas, para impedir a reprodução. “No primeiro contato com os carrapatos, os filhotes são infectados e se tornam amplificadores da febre maculosa. Sem a reprodução, as adultas já contaminadas vão morrendo progressivamente, sem a necessidade de algo mais radical”, afirma.
A medida foi aplicada com sucesso em Viçosa, de acordo com o professor da UFV. Ele ressalta que a esterilização é diferente da castração. “Se castrar a capivara, o animal perde o comportamento de grupo e a defesa do território”.
Medida drástica
Com mais de 20 anos de experiência no controle de carrapatos, o sanitarista Romário Cerqueira Leite, professor da Escola de Veterinária da UFMG, diz que o manejo das capivaras pode transferir o problema da Pampulha para outro lugar. Além disso, é uma alternativa muito cara, que requer um planejamento complexo.
“São animais que vivem em vários grupos, e se isso não for respeitado no terreno para onde forem levados, haverá uma competição e maus-tratos entre eles. Foi o que aconteceu quando tentaram retirá-los pela primeira vez”, destaca. Em 2014, 52 capivaras foram capturadas e levadas para um cativeiro na Fundação Zoobotânica, onde 38 morreram.
Segundo o sanitarista, uma medida adotada mundialmente, como foi feito na Inglaterra na década de 1980, com a explosão do mal da vaca louca, é o abate sanitário. “É feita a captura do animal e ele é anestesiado até a morte. Depois, dá-se destinação à carcaça, que pode ser enterrada ou queimada. As capivaras se reproduzem muito rapidamente e a disseminação da febre maculosa vira um ciclo vicioso. É necessária uma medida drástica, não tem meio termo”, avalia.
Ele participou em uma ação semelhante no Lago do Café, em Campinas (SP), onde 13 capivaras foram exterminadas.
Apoio técnico
O Ibama informou ontem que os técnicos que atuam em BH estavam fora da cidade. O instituto poderá dar apoio no manejo das capivaras, caso haja solicitação da prefeitura.