Guilherme da CunhaAdvogado pós-graduado em Direito Tributário e deputado estadual, coordenador da Frente Parlamentar pela Desburocratização

Em que mundo eles vivem?

11/12/2020 às 19:46.
Atualizado em 27/10/2021 às 05:17

O Poder Judiciário parece viver em uma ilha da fantasia. Enquanto o Brasil sofre com a crise da pandemia, desemprego, queda do PIB e da renda média da população, juízes e desembargadores não apenas mantêm intactos seus rendimentos, como reiteradamente recebem acima do teto constitucional da remuneração do serviço público.

Em 2020, juízes e desembargadores mineiros receberam, em média, R$61.140,93 mensais em seus contracheques, segundo dados do CNJ. O teto do serviço público, vale lembrar, é de R$39.293,00, equivalente ao salário de um ministro do STF. Os recebimentos acima do teto ocorreram em 73,6% dos contracheques, mostrando que, para quem julga o que é legal ou ilegal, um limite constitucional é mero detalhe.

Dois fatores levam a esse privilégio: primeiro, o salário bruto médio já é próximo ao teto. Mais precisamente, R$33.080,72. O segundo, e principal deles, os penduricalhos que o Judiciário criou para si e julgou, também para si, constitucionais e corretos. São eles que levam o rendimento médio a sair de R$33 mil para mais de R$60 mil a cada mês. E os penduricalhos não estão sujeitos ao teto e, na grande maioria das vezes, nem a descontos previdenciários ou de imposto de renda.

Enquanto o cidadão comum que ganha acima de R$ 4,6 mil sofre com o desconto de 27,5% de imposto de renda em seu salário, os juízes e desembargadores mineiros, com sua média de ganhos de R$ 61 mil, pagam menos imposto do que quem ganha abaixo de R$ 3,7 mil, cuja alíquota é 15%. Em média, eles pagam apenas 11,9% de imposto de renda sobre seus ganhos.

E tende a piorar. O STF na semana passada julgou que 90,25% do salário dos ministros do Supremo, estabelecidos no artigo 37 XI, da Constituição, como teto remuneratório dos servidores de todos os poderes nos Estados, na verdade significam 100% para os juízes e desembargadores. Ou seja, o STF, que é o órgão máximo do Judiciário e guardião da Constituição, ignorou-a por completo e elevou o teto do Judiciário (e só do Judiciário) nos Estados.

Há na Assembleia uma proposta de emenda à Constituição Mineira, idealizada pelo deputado Cleitinho e da qual sou um dos subscritores (PEC 44/2019), que acabaria com os penduricalhos e recebimentos acima do teto, mas ela simplesmente não caminha. E, considerando a recente decisão do STF ignorando o texto expresso da Constituição para ajudar os colegas de Judiciário, tenho pouca esperança que, caso aprovada, não seja posteriormente derrubada em Brasília. A saída seria termos um STF melhor, mas até isso está difícil de sonhar, tendo em vista que Kássio Nunes, último ministro a ser indicado pelo Presidente da República e que permanecerá no STF pelos próximos 27 anos, foi um dos que votaram a favor do teto especial para o Judiciário. Tá difícil, viu...

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