Guilherme da CunhaAdvogado pós-graduado em Direito Tributário e deputado estadual, coordenador da Frente Parlamentar pela Desburocratização

Mais sofisticado que a mentira

21/05/2021 às 18:15.
Atualizado em 05/12/2021 às 04:59

A verdade está cada vez mais relegada ao segundo plano no debate público, cedendo espaço a uma batalha de narrativas. É algo mais sofisticado que as fake news. Na maior parte das vezes, pedaços deliberadamente selecionados dos fatos são pinçados, tirados de contexto e expostos como se fossem a verdade inteira.

Semana passada, vimos isso acontecer em Brasília, após a votação do parecer do relator do projeto de capitalização (popularmente conhecida como privatização) da Eletrobrás. O parecer incorporou diversas emendas que desfiguraram o projeto original, incluíram privilégios e subsídios. O Novo votou contra o parecer, para restabelecer o texto original. Imediatamente, entusiastas da guerra de narrativas pinçaram a votação, omitindo que era referente apenas ao parecer, e criaram correntes de whatsapp dizendo que o Novo votou contra a privatização.

Isso aconteceu também em Minas, não apenas no whatsapp, mas em manchete de jornal e em reunião da CPI na Assembleia. O jornal O Tempo estampou que a remessa de vacinas para os municípios mineiros não é igual para todos os municípios. No mesmo dia, o prefeito de Betim, e dono do jornal O Tempo, compareceu à Assembleia, fez um discurso indignado sugerindo que a cidade dele estava sendo prejudicada e que BH e Juiz de Fora estariam sendo privilegiadas, e se retirou sem sequer aguardar os debates. A verdade completa é que a distribuição de vacinas, conforme estabelecido pelo Ministério da Saúde, não leva em conta a população absoluta das cidades, mas sim a dos grupos prioritários que devem ser atendidos. Juiz de Fora, cujo número de habitantes é bastante parecido com Betim, possui cinco vezes mais pessoas do primeiro grupo prioritário, 30% mais no segundo grupo, igual número no terceiro e o dobro no quarto, mas isso foi omitido ou ignorado.

Ao distorcer a verdade, a guerra de narrativas tira o foco dos reais problemas, nos afasta das soluções e induz desconfiança entre lados que deveriam trabalhar juntos. Quem a pratica demonstra desrespeito duplo com a população: por tentar manipulá-la, e por colocar possíveis ganhos políticos pessoais à frente do bem comum.

Não espero mudança de comportamento de quem faz uso disso. Espero, todavia, que cada vez mais pessoas desenvolvam senso crítico para perceber a manipulação, rejeitem quem faz isso e divulguem a verdade completa com a mesma determinação daqueles que espalham meias-verdades mentirosas. Quem coloca ganho político pessoal acima da verdade só vai parar quando sentir prejuízo, e só o cidadão engajado pode fazer a conta desse prejuízo chegar.

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