Perspectiva RacialUm espaço para mostrar como o racismo se revela no cotidiano, a fim de que toda a sociedade compreenda a importância de se engajar nessa luta. Andreia Pereira é doutora em Literatura (UnB), servidora pública federal, jornalista, professora, pesquisadora e palestrante.

Este mês vai ser longo

01/11/2021 às 19:57.
Atualizado em 05/12/2021 às 06:10

Chegou o mês da Consciência Negra. Mês em que, aos montes, pessoas negras serão convidadas para dar palestras, entrevistas e até estampar anúncios publicitários e capas de revistas. Neste mês, as empresas vão lançar suas campanhas de conscientização e produzir conteúdos sobre diversidade acompanhados das hashtags #blacklivesmatter, #consciencianegra, #naoaoracismo e por aí vai. Sem falar nas pessoas brancas que vão ler um artigo de no máximo 20 linhas na internet para ter “argumento” para debater com uma pessoa negra, muitas vezes, questionando e/ou invalidando nossa luta. Vou te falar: haja paciência! 

E olha que não é ironia! Não adianta se posicionar contra o racismo neste mês se, ao longo de todo o ano, suas atitudes cotidianas só revelam que o seu comprometimento com o antirracismo é uma fraude. O ato falho é certeiro. Mais cedo ou mais tarde, a máscara cai. É o que acontece com as empresas que não investem numa política antirracista. A Zara, o Carrefour, a Farm, a Bombril e tantas outras (que poderiam inclusive ocupar todo o espaço deste artigo) não me deixam mentir. E olha que essas marcas estampam o rol de práticas que extrapolaram o espaço da empresa e ganharam publicidade, graças, inclusive, à potência da internet e do ativismo negro. Pense na quantidade de casos de racismo que não são filmados, que não caem na rede. 

O mesmo vale para as relações interpessoais cotidianas, sobretudo entre familiares, amigos e colegas. Não adianta postar na internet #naoaoracismo ou #somostodosiguais se o tratamento que você dá ao coleguinha negro no trabalho é hostil. Pois saiba: achar que o colega negro não sabe do que está falando é racismo! Esperar o primeiro erro do colega negro para apontar que ele não é capaz é racismo também!

Não adianta, o racismo é como mofo. Se não for tratada a causa, vai continuar proliferando. Ainda que o silêncio seja a (pior) escolha, todos sentem o cheiro, o ambiente fica desagradável e a saúde daqueles que não são imunes fica suscetível. A melhor tática sempre será reconhecer o problema.

Reconhecer-se racista e estar disposto a aprender sobre nossa luta, a fim de tornar o antirracismo um exercício diário.

Não espere, por via das dúvidas, cair do céu uma pessoa preta para te ensinar a como não ser racista. Assuma a responsabilidade, afinal, são as pessoas brancas que possuem privilégios e perpetuam a estrutura racista. E quando digo isso, não significa que você, enquanto pessoa branca, deve sair por aí falando aos quatro cantos que não é racista e que precisamos combater o racismo. A sua primeira tarefa é de escuta. Quem está sempre acostumado a ditar o discurso não está habituado a ouvir. Ouça-nos. Leia livros e artigos de pessoas negras. Siga influenciadores negros. Assista a filmes que tratam da negritude. Estude história, a nossa história. Esteja disposto a aprender e depois a gente volta a conversar. 

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