EducaçãoLéo Miranda. Do \“Mundo Geográfico\” - YouTube Marcelo Batista. Do \“Aprendi com o Papai\” - YouTube

O dia em que a história teve fim

Publicado em 26/05/2022 às 06:00.

Marcelo Batista

Na quinta passada, entre várias postagens nos stories do Instagram, percebo que repetidamente alguns alunos começam a soltar mensagens de luto para um colega de profissão que havia ido embora. Não o conhecia, mas vendo a tristeza de vários alunos, resolvi entender melhor a situação. O professor de história Júlio César Lorens Júnior havia sido assassinado pelo vizinho, de 67 anos, no bairro Santo Antônio, na região centro-sul de Belo Horizonte. Com todo o escândalo da superexposição virtual, na internet um vídeo expunha a cena com toda a sua crueldade. O professor apertou um spray de pimenta na direção do outro homem, que, em troca, desfere golpes de faca e deixa Júlio Lorens à espera da morte.

Já tive problemas com um vizinho em 2016. Na época, ele se sentia muito incomodado com o fato de que meus cachorros latiam, na visão dele de maneira excessiva, mesmo que os latidos fossem recorrentes somente durante o dia. Após algumas ameaças do vizinho, que era da polícia, resolvi abandonar o local onde morava na época em busca de mais tranquilidade. Quando vi a situação desse colega de profissão inevitavelmente pensei: poderia ter sido eu. Ele deixou para trás a esposa e três gatos. Na minha época éramos somente eu, minha esposa e nossos três cachorros. Mas eu tive a chance de continuar. Por empatia ou por uma afinidade profissional, depois desse episódio da facada acabei morrendo também um pouquinho. Quem vai continuar as aulas do professor? A história geral, pelo menos naquele contexto vai ficar com um conteúdo sempre inacabado.

Nesta semana a educação também tem sangrado, aos poucos, no Brasil. Nos últimos dias, a discussão sobre o homeschooling tem se tornado ainda mais quente, visto que o projeto foi aprovado na Câmara dos deputados na semana passada. Para piorar, nesta terça fortaleceu ainda mais a discussão sobre a PEC 206/2019, que propõe o pagamento de mensalidades nas universidades públicas. De alguma forma, todos os educadores têm sangrado, aos poucos.

Mas não tem sido somente pelos pincéis e pelo tablado que a morte tem nos visitado na educação nos últimos dias. Meu grande amigo, também professor, perdeu hoje o seu irmão, ainda muito jovem, de forma repentina. No sábado, ao saber que a situação dele se agravara, teve que abandonar a sala de aula para acompanhar a família. Desde então, de certa forma, compartilhei o sofrimento do meu amigo e a expectativa pela recuperação, que soube hoje, pela manhã, que não viria. Meu amigo é o caçula de quatro irmãos, eu também. Nossos irmãos mais velhos - meu e desse amigo querido -  têm uma idade parecida. Por amor e também por empatia, também sofri e de alguma forma muitos alunos também se condoeram por uma situação terrível:com razão. De alguma forma, para muitos de nós alguns ciclos se fecharam - e a educação, aqui em Beagá ou no Brasil, ficou um pouco mais triste.

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