Flávio Aburachid*
Professores habitam vários espaços e desempenham vários papéis em uma sociedade. São responsáveis, juntamente com as famílias e outras estruturas e pessoas, pela transmissão de ferramentas e conhecimentos que proporcionam, em maior ou menor grau, o desenvolvimento intelectual, físico, social e emocional, que abrem o caminho para o desenvolvimento de cada aluno e, consequentemente, da sociedade.
Nas artes, os professores são, muitas vezes, retratados de forma carinhosa, como pelo nosso poeta mineiro da pequenina Miraí, Ataulfo Alves, sentindo a dor da saudade da professorinha que lhe ensinou o “beabá”, na mesma estrofe em que se interroga sobre o paradeiro de Mariazinha, seu primeiro amor, na obra prima que se encerra com simplicidade e beleza absoluta com o verso “eu era feliz e não sabia”.
No cinema, Jerry Lewis fez Um Professor Aloprado, James Clavell dirigiu Ao Mestre com Carinho e Robin Williams dá vida ao professor John Kesting, em Sociedade dos Poetas Mortos, entre tantas obras inspiradas em quem exerce essa admirável profissão.
Nesses tempos de tecnologias e interconexão, que ainda não compreendemos totalmente, muitos ofícios são atropelados ou transformados, e é necessária a adaptação, ou disrupção, como defendem os pensadores do tema. Sobre o ofício do professor nesse contexto, num Seminário acadêmico recente, tratou-se do uso de ferramentas de inteligência artificial no ensino, como ferramenta de motivação e facilitadora do processo.
É inevitável ter o coração tocado ao se tocar no assunto professores. Certamente, cada um dos leitores possui, num lugar especial da mente e do coração marcantes recordações de alguns de seus professores das salas de aulas, das quadras esportivas e de tantos que encontramos em tantas outras situações da vida. Nesse lugar, em mim, mora D. Creusa, minha professora no 2º e 4º ano, com quem aprendi, na infância, o “beabá”, a tabuada, o mapa-mundi e tantas coisas. Porém, o que eu não sabia por décadas, era que a maior lição de D. Creusa, estava por vir. Já cinquentão, graças à internet, reencontrei D. Creusa e vários colegas de sala, da época, no Instituto Armanelli, e, desde então, estivemos com ela algumas vezes.
Ela vinha aos nossos encontros com o mesmo carinho dos tempos da tabuada, e parecia ver, por detrás dos cabelos grisalhos de cada um de nós, a criança sua aluna. Contava-nos histórias vivas, lembrava-se perfeitamente de cada um e, como se não bastasse, trouxe-nos uma caixa de “retratos”, como dizia, guardados por todo esse tempo, e um brilho indescritível no olhar, à medida em que apontava a cada um nas fotos em preto e branco, de baixa definição. Como não se emocionar com essa verdadeira professora?
Esse artigo é uma reverência amorosa à D. Creusa, que partiu recentemente, deixando-me fortemente desconfiado que ela tinha, na prática, a resposta para a questão que ecoa na minha cabeça desde o seminário sobre Inteligência Artificial na sala de aula.
*Engenheiro Civil, Especialista em Sistemas de Informação, professor do curso de Engenharia Civil das Faculdades Kennedy e Promove.