Vinícius da Costa Gomes*
Assunto viral do último momento: uma passageira de um avião pede a outra que ceda o lugar na janela para o seu filho. A passageira se nega, o menino chora e o celular filma. Novidade? Depende. Talvez o caso em si seja algo novo, mas há um detalhe comum e cotidiano: CELULAR NA MÃO: LUZ, CAMERA E AÇÃO!
Não posso nem irei discutir a atitude da mãe ou mesmo a atitude da viajante. Até poderia, mas como sempre digo: sou professor de Direito e não comentarista da vida cotidiana. A ideia é utilizar um caso em evidência para ensinar Direito, então: “BORA LÁ!”
O debate jurídico pode ocorrer em várias áreas. O direito do consumidor, por exemplo, trataria do direito da passageira permanecer, afinal ela comprou aquele assento. Mas, como professor de Constitucional e Penal vou ficar no tema: DIREITO DE IMAGEM.
A proteção à imagem é um aspecto da privacidade, logo, protege a todos decidir sobre a exposição ou não de sua imagem. Gilmar Mendes, citando William Prosser, traz quatro meios básicos de violação da privacidade: 1) intromissão na solidão do indivíduo; 2) exposição pública de fatos privados; 3) Exposição do indivíduo de modo inexato ou censurável; e, 4) Apropriação do nome e da imagem.
Veja que, independentemente do motivo, a pessoa que filma a passageira que está tranquila “na sua” o faz violando o direito à imagem dela. Primeiro, ela viola a solidão da viajante. Segundo, expõe publicamente algo que é privado, afinal, a ninguém interessa aquele momento. Há possibilidade de violação ao terceiro aspecto, já que, de certa forma, há uma crítica aparente no vídeo. A impressão inicial é que a exposição é para “cancelar” a passageira. Por fim, ela se apropria da imagem quando captura e divulga. Veja: a exposição só poderia ocorrer com a autorização da passageira e o vídeo demonstra que isso não ocorreu.
“Mas, prof. ela ganhou dinheiro, está fazendo propaganda remunerada!”. Não importa. A violação já ocorreu e quem filmou pode responder por isso! Inclusive, pode-se até discutir se foi vantajosa ou não a exposição para a passageira. Possível até alegar que não houve prejuízo, já que ela foi contratada por grandes marcas. Mas, o grande ponto é: não houve permissão, logo há violação. O comportamento ou os atos posteriores não alteram esse ponto.
No entanto, talvez o mais relevante é lembrar: a privacidade não acabou e não é permitido a todos filmarem e expor quem quiserem da forma como quiserem! Muito cuidado, apesar da facilidade da tecnologia, do ímpeto atual por fotografar e filmar a tudo e a todos, ainda existe o direito à privacidade. Permanece o direito à liberdade do indivíduo decidir ou não sobre aquilo que pertence única e exclusivamente a ele. “Prof. existe exceção? uma brechinha?”. Brecha não, mas existe exceção a essa regra. “Qual prof?”. Só posso dizer: “Aguarde um pouco, em tempos de fácil acesso a filmagens e, ao mesmo tempo, pouca reflexão sobre o direito do outro, garanto que logo logo volto aqui para explicar as exceções ao caso!”
*Mestre e especialista em Direito. Professor da Nova Faculdade, Promove, Kennedy, Universidade Santa Úrsula e Faculdade Universo. Assessor da Ouvidoria de Prevenção e Combate à Corrupção da Ouvidoria Geral do Estado. Membro da Comissão de Educação Jurídica da OAB/MG. Professor online nas horas vagas: @profviniciusgomes (instagram, YouTube, Facebook, TikTok e X)