Blog do LindenbergCarlos Lindenberg, jornalista, ex-comentarista da BandMinas e Rádio Itatiaia, e da Revista Exclusive. Autor do livro Quase História e co-autor do perfil do ex-governador Hélio Garcia.

Os erros e acertos do STF e de Bolsonaro no caso de Daniel Silveira

Publicado em 28/04/2022 às 06:30.

Já não há a menor dúvida que o presidente da República deu um nó no Supremo Tribunal Federal ao conceder ao deputado federal Daniel Silveira, do PTB do Rio de Janeiro, o indulto pessoal, ou a graça, como querem alguns com alguma ironia.

O fato é que se de um lado, o presidente emparedou o STF, de outro, o ministro Alexandre de Moraes também inviabilizou a carreira parlamentar do deputado pelo Rio de Janeiro, tornando-o inelegível, até porque Bolsonaro também teria se antecipado ao intervir no processo antes que ele transitasse em julgado. Ou seja, os dois lados teriam cometido falhas processuais porque o trânsito em julgado se aplicaria nos casos em que não há mais possibilidade de recurso – o que não seria o caso de Daniel Silveira, condenado em 20 de abril.

Aliás, quem levanta essa tese é o ex-ministro do Supremo Sepúlveda Pertence, que diz com todas as letras que, no caso do indulto presidencial, não se exige o trânsito em julgado. “Mas, para a graça, é necessário porque ele tem caráter individual”, diz o ex-ministro, que foi procurador geral da República, ministro do Supremo e presidiu a Corte em 1997.

Para o ex-ministro, “o indulto e o ato presidencial da graça são institutos diferentes". A graça – continua – é uma medida individual enquanto o indulto é uma medida coletiva, e citou os erros do presidente por não ter esperado o trânsito em julgado e ter beneficiado um aliado político – o que infringe e compromete o princípio constitucional difuso da impessoalidade.

De qualquer forma, o Supremo está com uma batata quente nas mãos, ainda que a argumentação de Sepúlveda Pertence possa fazer sentido.

Mas, não bastasse isso, o fato de o deputado Daniel Silveira ter sido visto ontem desfilando sem tornozeleira na Câmara dos Deputados não deixa de ser um escárnio porque a sua condenação, antes mesmo de ela acontecer, já lhe impunha essa obrigação. Ora, a tornozeleira serve para monitorar pessoas com restrição de liberdade e, no caso do deputado, na verdade, o seu dispositivo estava desligado desde a Páscoa, sem que ele comunicasse ou recarregasse a bateria desde então, o que mostra o deboche do parlamentar com a decisão do Supremo.

Contudo, tanto o presidente da Câmara, Arthur Lira, como o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, defendem a tese, já em análise no Supremo Tribunal Federal, de que só o Legislativo poderia cassar o mandato de um congressista – fato que ficou evidente quando a ministra Carmen Lúcia, que presidia o Supremo, mandou para o Congresso o processo em que o então senador Aécio Neves era passivo da perda do mandato – o que aliás foi desconsiderado pelo Senado, mas acabou obrigando Aécio a disputar não mais o Senado, mas a Câmara dos Deputados.

Aécio, por sinal, parece que perdeu a disputa pela qual lutava para que o ex-governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, fosse o candidato do PSDB à Presidência da República. Eduardo Leite anunciou ontem que será candidato novamente ao governo do Rio Grande do Sul.

O fato é que a decisão do Supremo de condenar o deputado Daniel Silveira a mais de oito anos de prisão, ainda que o ex-presidente do STF, Sepúlveda Pertence, possa ter razão em sua fundamentação, tornou-se hoje o principal ponto de atrito entre o Supremo e os demais Poderes, sobretudo com essa interpretação de que somente o Legislativo pode cassar o mandato de um parlamentar – uma consulta que já está no STF – o fato é que, no frigir dos ovos, Daniel Silveira deve ficar  inelegível.

Pelo menos na visão do ministro Alexandre de Moraes, para quem o Supremo deverá analisar ainda se o indulto – ou a graça – estão de acordo com a Constituição. E cita o exemplo: se houver desvio de finalidade, ou seja, se ficar caracterizado que o presidente atendeu a demandas pessoais e não ao interesse público.

Não custa lembrar que, desde a Constituição de 1988, é a primeira vez que um  presidente da República concede esse tipo de perdão a um único condenado pela Justiça – o que pode mudar todo o sentido do que será analisado pelo Supremo Tribunal Federal ao longo dos próximos dias, em que o coração do país certamente baterá com maior pulsação.

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