Nas últimas semanas, maratonei a série sobre a vida do cantor mexicano Luis Miguel e percebi alguns paralelos interessantes com o futebol. "Micky", ou “O Sol do México”, como é conhecido, alcançou o estrelato ainda criança, mas pagou um preço alto. Seu pai, Luisito Rey, viu no filho a chance de realizar seus próprios sonhos frustrados e, por isso, o explorou ao extremo. Impôs treinos exaustivos, manipulou sua carreira e chegou ao ponto de drogá-lo para que suportasse a intensa rotina de shows e programas de TV.
Já na vida adulta, Luis Miguel se dá conta das falcatruas do pai, incluindo desvios financeiros, enquanto enfrenta outro drama: o desaparecimento da mãe, um mistério jamais resolvido. Os impactos disso foram evidentes. Entre festas, excessos e relacionamentos conturbados, ele desenvolveu uma profunda dificuldade em confiar nas pessoas – afinal, nem seu próprio pai foi leal a ele.
Se essa história soa familiar no mundo do futebol, não é coincidência. Muitos jogadores carregam cicatrizes de uma infância conturbada ou de um amadurecimento precoce forçado. Seja por desestrutura familiar ou pelo sucesso em idade ínfima, não é raro ver jovens atletas enfrentando dificuldades emocionais ao chegar à fase adulta. O acesso repentino a dinheiro e fama, sem o suporte adequado, pode torná-los vulneráveis a decisões impulsivas e a um ciclo de instabilidade. Além disso, assim como Luisito Rey enxergava no filho uma fonte de renda, há pais que depositam todas as fichas no futebol como salvação financeira da família, muitas vezes cobrando além do limite.
A formação de um atleta vai muito além dos treinos. O contexto de vida de cada jogador é um fator determinante para sua evolução. Os clubes precisam reconhecer isso e investir em um suporte adequado, que inclua assistência social, acompanhamento psicológico e uma integração real entre esses profissionais e a comissão técnica. Nem sempre o talento sobrevive a uma infância turbulenta, mas com o apoio certo, é possível reescrever a história.