Doutor em Direito pela UFMG e Analista Político

Minas Gerais e a Síndrome de Peter Pan

07/08/2020 às 16:31.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:14

Quem pelas telas do cinema, da TV, dos livros ou palcos de teatro não se lembra do clássico Peter Pan, do escritor J. M. Barrie, que retratava o garoto que se recusava a crescer, que vivia na terra do nunca, vestia de verde e podia voar? O tema ganhou novo contorno quando em 1983 o psicólogo norte-americano Dan Kiley lançou o livro “Peter Pan Syndrome: men who have never grown up”, sobre o comportamento masculino de homens que “nunca crescem”.

Em 2018, o também psicólogo Jordan Peterson transporta Peter Pan e seu inimigo, o capitão Gancho, para o mundo dos negócios, sobre crescer ou não crescer, em face de sacrifícios e desafios a serem percorridos. Sim, crescer exige sacrifícios, isto é inevitável. Querendo ou não, algo será sacrificado. Segundo Peterson, Peter Pan representa o empreendedor que vive sonhando em abrir um negócio exitoso sem assumir riscos e partir para a ação.

Peter Pan não quis evoluir, a zona de conforto se mostrava adequada e segura. Afinal, crescer “dá muito trabalho”. Transportando para uma análise interfederativa, especificamente sobre Minas Gerais, somos um Estado de grandes dimensões, considerado síntese do Brasil, pelas suas condições geográficas, econômicas e sociais. Já dizia Guimarães Rosa que “Minas são muitas”, com suas ricas heterogeneidades regionais. 

Nossas montanhas, nosso patrimônio material e imaterial, nossas paisagens, o potencial do turismo e da economia criativa, em destaque em termos a melhor gastronomia do país, aliado ao pujante setor agropecuário e à força da atividade minerária, poderiam nos posicionar em outro patamar em âmbito nacional. Em uma rápida reflexão e análise percebemos a síndrome de Peter Pan encarnada em parte das nossas elites política e econômica, adaptadas e à vontade numa zona de conforto que limita e até impede projetos e iniciativas inovadoras com potencial para promover um desenvolvimento sustentado que possa elevar de forma substancial a qualidade de vida dos mineiros. 

Temos uma infraestrutura bem aquém das nossas reais necessidades, para não dizer bem precária. Muitas e representativas vocações que não são potencializadas, seja pela normatização burocrática e desconectada com a realidade atual, ou por omissões ou ações sem sinergia, falta de coesão e isoladas entre os chamados stakeholders do nosso processo de desenvolvimento regional, prejudicando atrações de significativos investimentos nacionais e internacionais.

Há muito perdemos nossa força política nacional. A economia e imagem do Estado foram profundamente abaladas pelas tragédias recentes de Mariana e Brumadinho. Choramos juntos pelas famílias que sofreram perdas irreparáveis em detrimento da irracionalidade de setores que agiram sobrepondo os ganhos à dignidade humana.

O equilíbrio e a capacidade de diálogo, características inerentes ao nosso povo, são importantes e louváveis, mas não são suficientes. Minas precisa crescer. Deixar a terra do nunca, sair desta quase letargia e com sacrifício e atuação obstinada de todos alcançar elevados patamares de desenvolvimento e qualidade de vida, deixando para trás em definitivo esta nociva síndrome de Peter Pan.

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