Em 27 de outubro de 2002, com quase 53 milhões de votos, mais de 61% dos votos válidos, Lula foi eleito presidente do Brasil. Os cenários político e econômico eram outros, mais favoráveis, tanto em âmbito interno quanto externo.
Lula externalizava o homem simples que chegou ao poder na quarta tentativa, carismático e com imagens ética e popular positivas refinadas pelo trabalho dos seus marqueteiros no período eleitoral. Encontrou fértil campo político interno, com uma transição em mares calmos com o então presidente FHC.
Tinha uma equipe de articuladores liderada por José Dirceu e logrou êxito nas tratativas iniciais com o Congresso Nacional, colocando companheiros em postos chaves de comando nas duas casas legislativas, o que é muito importante para qualquer governante.
Em âmbito internacional, transitou com desenvoltura entre principais lideranças globais, inclusive Obama, que disse que Lula “era o cara”! Os cenários atuais são bem diferentes. O mundo está em uma grave crise econômica, em destaque a situação dos Estados Unidos e da China. A pandemia da Covid que não dá sossego e uma guerra absurda da Ucrânia com consequências negativas em âmbito global.
No aspecto político, o país está absolutamente polarizado e radicalizado. Uma população mais aguerrida e com forte poder de mobilização e manifestação. E Lula não é mais aquela novidade e expectativa positiva que foi em 2003. Até os avestruzes do Palácio do Planalto sabem da simpatia por medidas de inchaço e ineficiência da máquina pública, além dos escândalos de corrupção nos seus governos, mensalão, petrolão, etc. Ou foi conivente ou omisso. Seu duro núcleo político foi abatido em pleno voo, a começar por José Dirceu, seu principal articulador político, com posteriores condenações por corrupção gravíssimas.
Em âmbito internacional, o charme de outrora não existe mais na mesma intensidade. Não tem como fingir que nada ocorreu. O próprio Obama, que havia o chamado de “o cara”, disse textualmente em seu livro “Uma Terra Prometida” que a reputação de Lula se assemelhava a “ter os escrúpulos de um chefe de Tammany Hall” (referência aos “donos” que mandavam no Partido Democrata no passado) e “circulavam rumores sobre clientelismo, comissões, propinas que somavam bilhões”.
A articulação política se mostra frágil, a começar pelas batidas de cabeça nas definições da PEC da Transição. Sem condições de impor nomes petistas para o comando do Congresso Nacional, caminha para aceitar com olhos virados e gosto de fel na boca as reeleições de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco às presidências da Câmara dos Deputados e do Senado, respectivamente.
Lembram do orçamento secreto que na campanha o próprio Lula disse ter transformado Bolsonaro em “bobo da corte” e “refém do Congresso”? Pois é, não se fala mais do seu fim pelo presidente eleito. Estes e outros fatos demonstram um Lula, um PT e seus partidos aliados frágeis, sem rumo e estratégia. Talvez pela primeira vez um eleito não terá uma lua de mel, o saboroso período entre a eleição e a posse.
Para o jornal financeiro britânico Financial Times, Lula enfrentará "divisões profundas e finanças no limite". O americano Wall Street Journal escreveu: "o maior país da América Latina está apostando novamente no populismo de esquerda que fracassou tantas vezes no passado".
Para a Economist, a "polarização perdurará após a posse de Lula em 1º de janeiro". "Em vez de um retorno triunfante e arrebatador, a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais brasileiras na noite de domingo foi um processo lento e tenso. Seu governo promete ser ainda mais difícil", escreve o artigo assinado por Michael Stott, editor de América Latina do Financial Times.
Aguardemos o que está por vir! Pobre país pobre, esse nosso Brasil.