Na semana passada escrevi o artigo “o sábio e sua lição de generosidade”. E contei a história do ancião que assegurou: “quando eu morrer, vou ao inferno”.
O jovem que dialogava com ele, conhecendo as virtudes de bondade e generosidade do ancião, encheu-se de preocupação. Afinal, “se ele vai para o inferno, estou perdido, porque já fiz muitas maldades na vida”.
Mas o sábio o tranquilizou:
- Eu vou ao inferno porque esse será o meu pedido. Se eu não for, como vou te resgatar de lá? Como vou resgatar outras pessoas que merecem ser tiradas do inferno?
Depois que o artigo foi publicado, fiz mais uma leitura, como é o meu costume. Porque o Hoje em Dia tem uma equipe espetacular de revisores. E, quando eu me equivoco em alguma norma culta, eles me salvam com a providencial correção.
Ocorre que nos passou despercebida uma particularidade do verbo “ir”: quando seguido da preposição “ao”, significa “deslocar-se até um lugar para uma tarefa ou missão, com o propósito de regressar”. Já com a preposição “para”, o significado é “deslocar-se até um lugar e lá permanecer”.
Ih, lá vem o chato. Não entendi nada.
Calma, leitor. Essa “chatice gramatical” é para dizer que, no artigo da semana passada, na parte em que eu disse que o sábio “vai para o inferno”, eu deveria dizer que ele “vai ao inferno”, porque o propósito dele é resgatar as pessoas e depois retornar.
Que utilidade isso tem para mim? Que importância isso tem na minha vida?
Sou capaz de adivinhar esses questionamentos do leitor. Bem, isso pode até ser uma filigrana gramatical. Talvez não faça diferença na vida de muitas pessoas. Mas, quanto mais preciso for o uso da linguagem, menor será a chance de mal-entendidos.
No caso dos estudantes, que se prepararam para um concurso ou para o Enem, há uma motivação a mais: essas filigranas caem na prova. Mas não sejamos chatos como aquele sujeito que se julgava sabedor de tudo sobre a Língua Portuguesa. E desejaram o inferno ele. É que, ao dialogar com um amigo, este lhe disse:
- Eu vou para o estádio assistir ao jogo.
E eis a correção do chato:
- Você vai apenas para assistir ao jogo e depois voltará para casa?
- Claro - disse o amigo - com a intenção de dizer: “claro, idiota”.
- Se vai e volta, então você não vai “para o” estádio. Você vai “ao” estádio.
O amigo ficou pensativo. E o pretenso “sabe tudo” quis saber o que houve:
- Estou pensando: eu não sei de te mando “ao” inferno ou “para o” inferno.
A todos, e sem chatice, desejo bons estudos.