Kênio PereiraDiretor Regional em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário. Advogado e Conselheiro do Secovi-MG e da CMI-MG.

Comprador é induzido a erro por construtora

Publicado em 31/03/2017 às 19:33.Atualizado em 15/11/2021 às 13:57.

Diante do fato da Associação Brasileira das Incorporadoras ter divulgado que, somente em 2016, ocorreram mais de 44 mil rescisões de contratos de venda de unidades na planta – sendo a maioria motivadas pelo descumprimento do prazo de entrega, além da crise econômica – constata-se que a postura das construtoras em não devolver amigavelmente o crédito do adquirente motivou também o enorme crescimento dos processos judiciais.

Os jornais Bom Dia Minas e MG TV da TV Globo, do dia 29/03, abordaram na matéria “Advogado tira dúvidas sobre desistência de compra de imóveis” os abusos que as incorporadoras têm praticado, pois é direito incontestável do comprador rescindir o contrato se não foi lavrada a escritura pública de compra e venda. A multa em geral é limitada pelo STJ em 10% sobre o valor que o comprador pagou, sendo ilegal a pretensão da construtora cobrar 80%.

Diante da complexidade da terminologia que envolve a engenharia e o direito imobiliário, há construtor que se aproveita da boa-fé do consumidor e cria cláusulas abusivas que afrontam o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. Por exemplo, estabelece no contrato de R$ 1 milhão, que após pagar 40% do preço do imóvel durante a obra, deverá quitar os 60% restantes mediante financiamento bancário, além de estabelecer que o comprador passará a arcar com a taxa de condomínio e IPTU após a Baixa de Construção/Habite-se, dando a entender que será possibilitada a ocupação imediata do apartamento pelo comprador. Ocorre que o contrato determina que a construtora somente transferirá a posse do imóvel após receber o valor total da compra. Aí consiste a má-fé.

Para que o banco conceda o crédito, é exigida a matrícula do apartamento individualizada no Cartório de Registro de Imóveis, que somente é obtida 30 dias após a construtora entregar ao cartório o Habite-se e a CND do INSS. A construtora que não entrega o registro da unidade individualizada impede que o comprador quite sua dívida. A construtora aproveitando-se da sua falta de providências acaba se beneficiando da sua ineficiência, pois além da dívida do comprador ser corrigida pelo INCC ou IGP/IGP-M, passa, a partir do Habite-se, a cobrar juros de 1% ao mês sobre o saldo devedor. Isso onera o consumidor em torno de 19% ao ano, ou seja, R$114 mil a mais por ano, tomando-se por base um contrato de R$1 milhão.

Assim, o comprador é lesado, pois já poderia ter quitado a dívida se a construtora tivesse entregado o documento apto a financiar o imóvel. Na escola de Direito aprendemos que “ninguém pode se beneficiar da própria torpeza”.

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