Kênio PereiraDiretor Regional em MG da Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário. Advogado e Conselheiro do Secovi-MG e da CMI-MG.

Rateio de gastos pela Fração Ideal às vezes fere a lógica

23/04/2021 às 20:22.
Atualizado em 05/12/2021 às 04:45

Interessante como muitos condôminos que defendem ser correto dividir despesas de conservação e manutenção pela fração ideal nos edifícios residenciais compostos de apartamentos tipo e cobertura ou de prédios de salas e com lojas no térreo, pois afirmam que a “lei assim impõe” e ignoram simples cálculos matemáticos. Basta verificar as perícias judiciais, nas quais os engenheiros e experts analisam esses condomínios e confirmam que os custos do rateio das despesas decorre do uso e conservação das áreas comuns (portaria, faxina, escadas, energia elétrica, elevadores, áreas de lazer) que são utilizadas igualmente por todas as unidades, mesmo que de tamanhos diferentes nos edifícios residências.

Com as perícias que se baseiam em fatos concretos, vemos injustiças cometidas contra lojas que pagam por despesas que só beneficiam as salas ou os apartamentos. Ao cobrar de uma loja valor que a mesma não gera ou de uma cobertura 50 a 150% a mais (conforme a fração ideal) por serviços que estão à disposição de todos igualmente, esse valor abusivo configura enriquecimento sem causa que beneficia as unidades menores. A fração ideal nesses casos fere o artigo 884 do Código Civil.

Ninguém de boa-fé pode defender a ideia de que uma pessoa deve pagar a mais por um serviço que não utiliza em maior proporção que seus vizinhos. Para camuflar que desejam levar vantagem, utilizam como argumento que “a fração ideal é determinada obrigatoriamente pela lei”. Entretanto, o mesmo artigo 1336 estipula que tal critério não é absoluto, está sujeito às particularidades do caso concreto e da razoabilidade, pois estipula: “salvo disposição em contrário”. Portanto, o legislador previu que havendo unidades de tamanhos diferentes, cabe aos condôminos implementarem uma regra que não utilize a fração ideal, pois esta só é viável quando as unidades são de tamanhos iguais, como se verifica na maioria dos edifícios. 

LEI X JUSTIÇA

Muitas vezes o que está previsto em lei, é injusto. No banco da Faculdade de Direito os advogados aprendem: “nem tudo que é legal é lícito”. A discriminação racial era legal, prevista em leis, até relativamente pouco tempo em diversos países, felizmente tais leis foram extintas. As mulheres, no mundo todo, sofreram muito até terem seus direitos reconhecidos, para poder votar, estudar, receber herança ou trabalhar. Há países em que são proibidas de dirigir automóveis, sair sozinhas; podem ser surradas a vara caso exponham um calcanhar que seja etc.

Nesses países isso é legal, mas as pessoas sensatas consideram uma barbaridade totalmente injusta e errada. Esses exemplos deveriam ser expostos nas assembleias de condomínio nas quais vários condôminos insistem em cobrar a mais da cobertura ou do apartamento térreo, sem conseguir explicar o porquê. Não se pode confundir quota de condomínio com imposto (IPTU e ITBI), pois este que é cobrando com base no valor de vendas do imóvel.

A lei não proibe a cobrança com base na fração ideal, mas nos casos citados, esse critério se mostra imoral, razão que justifica quem o defendo rejeitar a realização de perícia, pois a matemática e a lógica provam a injustiça. Não é necessário ser um jurista ou matemático para se ter bom senso. Mas, os vizinhos, sendo maioria, no afã de manter sua taxa de condomínio menor, para continuar a punir quem adquiriu uma unidade maior, simplesmente colocaram a “culpa na Lei”, como se fosse criada para lesar ou criar cobranças sem lógica. Lamentavelmente muitos não entendem que, o direito pode estar na lei, contra a lei e além da lei.

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