Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Juízes se julgam

Publicado em 08/08/2023 às 06:00.

Não é fácil a vida de juiz. Não se tenha dúvida. Mesmo que se trate de um árbitro de futebol, as funções se demonstram difíceis e desafiadoras. Julgar é algo extremamente delicado, às vezes perigoso.

O juiz também se torna alvo de julgamento e o primeiro julgamento é pessoal. Os juízes se julgam e são eles, repetidamente, muito severos consigo mesmos.

Vimos o caso Sérgio Moro. Considerando o feito da Lava-Jato, tida como a maior operação contra corrupção do mundo, o magistrado paranaense passou de herói-defensor do interesse público a réu perante setores da opinião pública.

Penso comigo mesmo, ao ler o e-mail do desembargador Rogério Medeiros Garcia de Lima, em que relata seus sentimentos ao rever uma foto de quando iniciava a carreira. Tinha 27 anos de idade, completados em 4 de setembro de 1989. Ele raciocina, escrevendo: “Em 4 de outubro próximo (de 2023), completarei 34 anos de magistratura. Faço contas: com 33 anos de vida, eu já era juiz em Belo Horizonte, após ter passado pelas comarcas de Bonfim, Visconde do Rio Branco e Montes Claros. Meu tempo de judicatura já passou disso.
 
A idade atual, nem conto. Com duplo sentido.

Sem falar nos três anos como promotor de justiça (1986/89), quando atuei em Perdões, Raul Soares e Caratinga.

Morei em sete cidades, durante quase nove anos.

Vida dura, muitos processos, muito trabalho, algumas ameaças e permanente angústia. Ser imparcial é um esforço freudiano: a tal da "sublimação".

E a solidão de julgar? Eu e a máquina de datilografar, outrora. Eu e o computador, hoje. Depois a assinatura. A canetada de antigamente. Hoje, assinatura eletrônica. Não é fácil.

Externamente, um magistrado (sobretudo um desembargador) encarna a enganosa imagem de poder e glamour. Nada disso. Pesam os anos de estrada, sacrifícios, desenraizamento, mudanças de lugares, climas e culturas. Pouco tempo para o lazer, a família e os amigos.

E ao aproximar do outono, embora orgulhoso da trajetória pessoal, observo o entorno e me entristeço. Esse tempo todo passou, vieram tecnologias, comodidades e mais conforto.
Contudo, todavia, no entanto...”

Realmente, o ilustre magistrado tem razão em usar as adversativas. Se o mundo está em ebulição, com incêndios que roubam milhares de vidas humanas e ameaçam com perigos e dores extremas o futuro, pensamos em nós, mas acima de tudo nas gerações vindouras. O que podem esperar nossos filhos e os filhos de nossos filhos? Os donos ou inquilinos no poder podem contribuir para a resposta, reduzindo a inquietação que nos atropela e destrói, incessantemente.

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