Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Na época da febre amarela

02/05/2016 às 19:12.
Atualizado em 16/11/2021 às 03:14

Inúmeros estrangeiros deixaram de vir ao Brasil no tempo da febre amarela, que campeava e assustava as populações de grandes cidades como o Rio de Janeiro. Mas também sofriam os que viviam no interiorzão, submetidos a toda sorte de provações. Segundo li, não sei onde, trata-se de doença infecciosa aguda, geralmente muito grave, mas limitada a certas regiões tropicais da América do Sul e África. Para não ser exceção, o Brasil padeceu com a doença, transmitida pelo Estegonya fasciatus, e que pode voltar ao Brasil nas asas do Aedes aegypti, como alerta a OMS.

No ano da Proclamação da República, o povo carioca estava em pé de guerra: altas temperaturas, água faltando e a febre deixava inúmeros mortos. Os jornais tinham assunto. Os republicanos exaltados marcaram um comício, no Largo da Lapa. O governo proibiu. Para o problema da água, conseguiu-se um jovem engenheiro de 29 anos, Paulo de Frontin, que prometeu eliminá-lo com execução de um plano apresentado à municipalidade. O projeto demorou, atrasou alguns dias mais do que o esperado, mas o povaréu pode logo homenagear o fazedor do milagre.

Sem atropelos e pancadarias como no imposto do tostão, agiu à época o médico sanitarista Oswaldo Cruz, fundador da medicina experimental brasileira. Coube-lhe a missão de acabar com a febre amarela e a varíola no Rio de Janeiro, na gestão do presidente Rodrigues Alves. Um desafio. A campanha causou uma rebelião na Escola Militar, com ameaças de arrancamento dos trilhos dos bondes e dos lampiões da iluminação pública.

O movimento “Quebra-Lampião” contava com apoio dos positivistas, contra a lei da vacinação obrigatória. Eclodiu em 14 de novembro de 1904, mas foi dominado pela guarnição federal, à frente o general Hermes da Fonseca. Esteve ameaçado o governo de Rodrigues Alves, aconselhado a refugiar-se num navio de guerra. Contestou, no Catete: “meu lugar é aqui”.

A vida de Oswaldo Cruz vale um romance. Nascido em São Luiz do Piratininga (SP), ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro aos 14 anos e concluiu o curso com a tese “Da veiculação microbiana pelas águas”. Foi à França aprofundar-se durante três anos. Regressando, recebeu incumbência de estudar e combater a epidemia de febre bubônica em Santos, que já ameaçava o Rio. Instalado na Fazenda de Manguinhos um instituto para produção de soros e vacinas, o diretor do estabelecimento pediu ao cientista francês um conceituado bacteriologista para gerir a parte técnica. Roux respondeu que esse homem já se encontrava no Rio de Janeiro e se chama Oswaldo Cruz.

O centro de produção de antipestoses tem hoje o seu nome. Nomeado diretor da Saúde Pública do Rio, fez realizar uma campanha antiamarílica que alcançou efeitos extraordinários. Em 1907, afirmou que a doença endêmica fora eliminada. Mais: também as de peste bubônica e de varíola.

No Brasil, em 1906 Anatole France, da Academia de Letras da França, comentou com Cruz: “O senhor fez o mesmo que Hércules. Matou a hidra. É um benfeitor da humanidade”. Bastante debilitado, Cruz faleceu em Petrópolis em 1917, com apenas 45 anos. 

No século 21, com todo arsenal científico e tecnológico, seguimos em guerra contra a dengue, a zika e a chikungunya.

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