Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Nossa gente e a febre amarela

Publicado em 26/01/2017 às 19:27.Atualizado em 15/11/2021 às 22:34.

“Velho como a serra”, expressão comum em tempos pretéritos, algo muito antigo, antigório, como dizia meu avô. Ambos correspondem aproximadamente à febre amarela, que ora começa a aterrorizar o país mal informado. O fenômeno já fora registrado pelo facultativo mineiro Pedro Salles, em sua “História da Medicina no Brasil’, cuja segunda edição é de 2004. 

“Pedroca”, como o chamava Juscelino, era seu colega de turma e de colação de grau em 1927. Formaram-se na primeira escola médica instalada da nova capital (hoje UFMG) e que resultara do esforço coletivo dos profissionais belo-horizontinos, com ênfase os da Santa Casa.

Se alguém recorrer a um Guia do Centro Nacional de Epidemiologia do Ministério da Saúde, edição de 1998, ficará sabendo mais. A febre amarela é uma infecção viral, de gravidade variável, cujo quadro típico tem evolução bifásica, ou seja, com períodos de infecção e de localização. O início da doença é repentino, com febre, calafrios, cefaleia, mialgias, prostração, náuseas e vômitos. Não vou entrar em detalhes. Só acrescento que o diagnóstico é clínico, epidemiológico e laboratorial. 

Há a febre amarela urbana, FAU, e a silvestre, FAS, tendo como reservatório o homem no primeiro caso e os macacos no segundo. Na FAU, a transmissão se processa através da picada do superconhecido Aedes aegypti e, na FAS, pelos mosquitos silvestres do gênero Haemagogus.

Em 5 de agosto de 1872, nasceu no interior de São Paulo o bebê que recebeu o nome de Oswaldo Gonçalves Cruz na pia batismal. Formado em medicina no Rio de Janeiro, estagiou por três anos no Instituto Pasteur, em Paris, discípulo de Émile Roux. De volta, combateu um surto de peste bubônica em Santos e outras cidades portuárias, instalando um instituto para produção de soro adequado, cuja importação era demorada e cara.

Quando Rodrigues Alves foi presidente da República, Oswaldo Cruz começou uma campanha de erradicação de varíola e de febre amarela, no Rio. Organizou batalhões de “mata-mosquitos” para vacinar obrigatoriamente a população. Esta se revoltou, o mesmo acontecendo com a Escolta Militar. Constituía um absurdo a invasão das casas e imunização forçada e o movimento recebeu o nome de Revolta da Vacina. 

Como se sabe, o Rio de Janeiro, depois cognominada Cidade Maravilhosa, era uma das mais sujas do mundo, mas o jovem Oswaldo não se intimidou. Foram vistoriados milhares de prédios, extintos focos de larvas, limpas calhas e telhados, ralos e tinas. Removeram-se toneladas de lixo dos quintais, habitações e terrenos, e carroças de lixo. 

Não custou ser apontado como “inimigo do povo” pelos jornais e nos discursos na Câmara e no Senado, nas caricaturas e modinhas de Carnaval. Houve quebra de lampiões de iluminação pública, enquanto a capital federal se prestava a criadouros de transmissores de males, que se tornaram endêmicos: problemas de ontem se repetem hoje, para inquietação e dor dos brasileiros.

Oswaldo Cruz dirigiu em sua época a campanha contra de febre amarela em Belém, cidade em que houve muitas mortes no último fim de semana. Mortes desta vez, a tiros.

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