Manoel HyginoO autor é membro da Academia Mineira de Letras e escreve para o Hoje em Dia

Sempre Neruda

13/10/2020 às 17:16.
Atualizado em 27/10/2021 às 04:47

Pablo Neruda, o grande poeta chileno, recordava com enlevo que o tempo no continente latino-americano é um mês amplo e florido, também cheio de bandeiras. No início do século 19, em 1810, e em setembro, despontaram ou se consolidaram as insurreições contra o domínio espanhol em numerosos territórios da América do Sul. E não só nos domínios espanhóis, podemos dizer, porque foi no nono mês, num dia 7, que se declarou a independência do Brasil, às plácidas margens do Ipiranga, em 1822. Quem não aprendeu? Foi muito importante para o mundo a cadeia cíclica de movimentos que brotaram nas novas terras, como observou Neruda.

Mas, em 2020, assim que passou aquele mês e a primavera, também os jornais noticiaram a venda do arquivo do poeta, conservado na Espanha, em que ele atuou em guerra e nas letras.

A coleção seria leiloada, em 8 de outubro, dividida em 238 lotes, variando os preços de 50 a 80 mil euros.

Cancelado em março, devido à pandemia, o leilão do arquivo com mais de 600 peças. A coleção, que inclui manuscritos, objetos pessoais, primeiras edições e livros dedicados ao escritor colombiano Gabriel Garcia Márquez e ao ex-presidente chileno Salvador Allende, deveria ser leiloada em um único lote, em 19 de março, na Galeria La Suite, em Barcelona. Porém, o evento foi suspenso devido ao distanciamento entre as pessoas, resultante de medidas sanitárias.

Antes, houvera interesse do Chile, cujo governo esclareceu que não dispõe de recursos para o investimento total – 850 mil euros, por causa da pandemia. Também os Estados Unidos não quiseram assumir. Segundo o colecionador espanhol Santiago Vivanco, viticultor e apaixonado por Neruda, ele não poderia manter a coleção consigo, pelo seu alto valor. Em parcelas, pode ser que algum ricaço ou alguns ricaços se interessem.

 A esta altura, o poeta diria, como o fez em um de seus livros: “Estas memórias, ou lembranças, são intermitentes, por momentos, me escapam, porque a vida é exatamente assim. A intermitência do sonho nos permite suportar os dias de trabalho. Muitas de minhas lembranças se toldaram ao evocá-las, viraram pó, como um cristal irremediavelmente ferido.

...”Do que deixei escrito se desprenderão sempre como nas árvores de outono e como no tempo das vinhas – as folhas amarelas que vão morrer e as uvas que reviverão no vinho sagrado. Minha vida é uma vida feita de todas as vidas; as vidas do poeta”. Neruda faleceu no Chile, em 1973, dois anos após receber o Prêmio Nobel de Literatura.

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