Ângela Mathylde Soares*
Sempre foi de conhecimento geral e amplamente difundido que o ensino muda a qualidade de vida das pessoas, abrindo oportunidades para a conquista de estabilidade e realização. Contudo, a realidade brasileira mostra uma certa dificuldade para quem quer entrar no mercado de trabalho após a graduação e receber de maneira justa.
Uma pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), parte do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontou que o número de pessoas com ensino superior completo e empregadas em São Paulo cresceu 15,5%, entre os anos de 2019 e 20 22. Entretanto, a alta foi para vagas que não exigiam curso superior, ou seja, em busca de um emprego para sobreviver e pagar as contas. Os especialistas estão aplicando para vagas de áreas diferentes de sua formação, que acabam oferecendo também um nível salarial menor.
A análise ainda revelou que as principais vagas ocupadas pelos graduados são de vendedores e balconistas, registrando um aumento de 22%, em três anos. No mesmo período, o número de profissionais de nível superior completo trabalhando o equivalente ao nível médio para enfermagem subiu 45%.
O nível de escolarização brasileira está cada vez maior, devido a diversas ações e projetos desenvolvidos pelo governo Federal, nas últimas décadas, incentivando e permitindo a adesão de pessoas de todas as classes e condições sociais ao ensino superior, gratuitamente ou através de financiamento em universidades particulares. Para se ter uma ideia, o Censo da Educação Superior 2022, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) mostrou que o crescimento, apenas através do programa de cotas, foi de 167% em dez anos.
Porém, vale destacar que o mercado brasileiro não dá conta de receber tantos profissionais qualificados. Ao terminar a faculdade, a empolgação é contagiante, até que se perceba a realidade. A indicação de professores é um forte recurso, mas os contatos não durarão para sempre e a solução é disputar uma das poucas vagas, que nem sempre são bem remuneradas. Por isso, para muitos, o jeito é agarrar diferentes chances, enquanto buscam uma saída para realizar o sonho.
O problema é que a falta de incentivo, oportunidades e trabalhar com o que não agrada afeta profundamente a saúde mental, gerando infelicidade e desânimo, porque, por mais necessário que seja, todos os anos de dedicação e investimento nos estudos parecem ter sido em vão.
Associada a essa situação, a rotina atarefada e cansativa também tem a capacidade de fazer com que, simplesmente, as pessoas decidam mudar seus planos originais, abandonando a ideia de permanecer estudando e se especializando, através de pós-graduações, mestrados e doutorados. Afinal, se não conseguem um emprego com o diploma superior básico, como seria com o título de doutor?
Contudo, apesar das dificuldades, é importante ter determinação, foco e persistir. As oportunidades são raras, surgem de uma hora para outra, mas podem ser suficientes para conquistar o que se deseja.
A educação no Brasil precisa ser levada mais à sério, uma vez que não apenas influencia diretamente o futuro de um indivíduo, mas também de todo o país, através de uma atividade que fortalece negócios e beneficia a economia, consequentemente, atingindo os cidadãos.
Os problemas enfrentados precisam ser revistos e a pesquisa do Dieese pode ser o caminho. O levantamento provoca o início de uma discussão mais forte sobre a implementação de melhorias por parte do governo, aprimorando as condições de milhares de brasileiros qualificados e, ainda, mesmo aqueles apenas com o diploma de ensino básico também têm dificuldade de serem contratados pelo baixo número de vagas e grande concorrência. Atualmente, mais de 8 milhões de brasileiros se encontram desempregados, influenciando também a arrecadação da previdência.
* Neurocientista, psicopedagoga e professora