Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

A distância entre o amor e o se sentir amado

23/03/2016 às 17:43.
Atualizado em 16/11/2021 às 02:37

A percepção do que é amor é algo muito pessoal. Enquanto uns precisam de enormes demonstrações de afeto para se sentirem amados, outros se sentem amados até sem motivos para isso.
Sonia e Marcos eram o tipo de casal feliz, risonho e leve. Namoraram por um ano e como se davam muito bem, resolveram se casar. Com o tempo, Sonia mostrou-se impaciente, egoísta e autoritária. Preocupava-se apenas consigo e pouco se importava com o marido, não era generosa e tão pouco se solidarizava com sua dor. Apesar dela afirmar amá-lo, ele não percebia isso na prática. Sonia era fria. E Marcos, muito tolerante, se esforçava com manobras sentimentais para enxergar o amor nas entrelinhas.
Se fôssemos colocar, no exemplo acima, afago como reflexo do amor, a equação pesaria para um lado só. O problema das relações unilaterais é que às vezes elas demoram a serem evidenciadas.
Quem ama quer se sentir amado. Mas, uma coisa é o amor universal onde amamos os seres humanos que nem conhecemos, nos solidarizarmos a eles e até contribuímos para seu bem estar, porém sem esperarmos nada em troca. Outra coisa é o amor personalizado, onde é preciso reciprocidade para mantê-lo vivo. Não a reciprocidade milimétrica baseada em cobrança, mas numa troca equivalente e espontânea de afeição. Quem beija quer beijo, quem acaricia quer carinho, quem cuida quer ser cuidado. O amor saudável é retroalimentado. Sem essa mão dupla o sentimento mortifica e abre espaço para as mágoas.
Quem se sente em desvantagem afetiva costuma se perguntar: “será que ele(a) realmente me ama?”, “Se ama porque age assim?”. E entre uma dúvida e outra vem a ótica pessoal: “Se fosse eu agiria assim...”.
O problema desse tipo de raciocínio é que o amor só será percebido quando o outro agir da mesma forma que você agiria. Por isso, padronizar o comportamento de alguém a partir da autorreferência é um equivoco. Cada um é regido por um “modus operandi” diferente: uns pedem ajuda com facilidade mas não gostam de ajudar, são os mais egoístas. Outros não têm um nível de empatia suficiente para acolher, são os menos sensíveis. E outros não levam muito jeito para lidar com a dor alheia, tentam demovê-la usando clichês como “amanhã vai ser outro dia”, “bola pra frente”, “isso vai passar”.
A grande questão é: deixar a desejar no campo do afeto faz do egoísta, do insensível e do desajeitado indivíduos que não sabem amar? Não. Eles sabem. Porém, amam à sua maneira. Um amor vinculado ao molde da sua personalidade.
Nesse caso, ao invés de despender esforços, se moldando ao outro ou tentando mudá-lo para se sentir amado, talvez seja mais honesto, consigo e com o outro, refletir a relação sob a ótica do amor próprio, se fazendo a seguinte pergunta: “O tipo de amor que eu recebo me é suficiente?”.
Caso não seja, vale considerar um verso da canção “You’ve Got to Learn”, de Nina Simone: “Você tem que aprender a sair da mesa quando o amor já não está sendo servido”.

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