Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Algoritmo mental

Publicado em 23/01/2025 às 06:00.

A palavra algoritmo nos remete a códigos, linguagem de computadores e tecnologia. Por definição, um algoritmo é uma sequência de instruções bem normalmente usadas para resolver problemas de matemática específicos, executar tarefas ou realizar cálculos e equações. A palavra, antigamente usada para se referir a matemática, atualmente desempenha um papel fundamental na inteligência artificial, pois são essas instruções lógicas que orientam as máquinas a realizarem tarefas específicas. Eles são, de fato, essenciais para processar grandes volumes de dados, identificar padrões e impulsionar volumes.

Quando buscamos uma informação específica na internet, o algoritmo detecta e a partir daí recebemos uma enxurrada de anúncios e ou assuntos relacionados nos dando a impressão de que estamos sendo olhados, ouvidos e tendo nossos pensamentos adivinhados, pois basta pensar e começamos a nos deparar com a materialização do que foi imaginado - uma mágica instigante ocorre.

Nossa mente funciona de uma forma semelhante. Arquivamos no nosso "feed mental” tudo aquilo que nos traumatizou, as experiências negativas ou aquilo nos proporciona medo. Esse arquivo alimenta nosso "algoritmo mental” e ele sai fazendo conexões, retroalimentando nossos medos num círculo vicioso contínuo. O looping abre caminhos neurais lentamente construídos e muito bem sedimentados e por isso não percebemos a natureza autodestrutiva dos nossos pensamentos.

A tríade sequencial é: pensamento, emoção (sentimento), ação.

Um bom exemplo é uma pessoa que tem medo de doença. A partir daí passa a pesquisar sobre o assunto, se interessa em saber mais. Com isso, apura sua escuta, ficando atenta a tudo que diz respeito àquilo. Com esse algoritmo instalado, começa a ver notícias na TV sobre o assunto, o vizinho conta um caso de uma prima, um grupo compartilha algo de igual semelhança, etc. Tudo parece chegar com mais facilidade aos ouvidos daquele que teme a doença.

Com os medos já estimulados, um grande sofrimento se instala e começa-se então a fabricar as emoções negativas que vão de dores de cabeça, estomacais, dermatites até crise de ansiedade. Tudo relacionado ao pensamento catastrófico do medo de doença. Já no terceiro estágio, vem a ação que pode ser gasto de alto valor, hipervigilância, comportamentos obsessivos, tudo na tentativa de se proteger contra aquele medo.

A questão é que o nosso algorítimo mental nos envia tanto reforço positivo quanto negativo, a depender da natureza dos nossos pensamentos.

Já acompanhei um atendimento no qual a pessoa temia muito ficar solteira e amargar a solidão. Toda vez que saía de casa para se divertir gastava parte do tempo observando a suposta tristeza das pessoas desacompanhadas. Se consternava e se comovia com aquela situação que ele supunha ser péssima e isso reforçava ainda mais seu medo de ficar como elas.

Além disso, suas leituras eram sempre relacionadas à solidão da terceira idade, à depressão de quem vivia sozinho e assim por diante. O medo era tão grande que ele vivia regido sob a máxima do antes mal acompanhado do que só. Com todo esse sofrimento, casou-se sem escolher com muito critério com quem iria dividir a vida, teve filhos e viveu um relacionamento caótico, permeado por traições e concessões unilaterais. Depois de tanto aborrecimento, a esposa o largou e mudou para outra cidade com um novo namorado, levando junto os filhos. No final, voltou para condição que mais temia: ficar sozinho.

Nos convém cuidar bem dos nossos pensamentos para que eles não virem uma profecia autorrealizável.

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