Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Como se recuperar mais rápido das perdas

Simone Demolinari
Publicado em 04/08/2022 às 06:00.

Não somos preparados para lidar com as perdas, tanto as que ocorrem fruto de rupturas quanto as de finitude da vida. Quando o processo se concretiza, entramos no processo de luto - condição emocional onde vivenciamos, com angústia, a dor daquilo que já não temos mais.

Um indivíduo pode se tornar mais ou menos sensível à dor da perda, quantas vezes mais ele as vivenciar. Ou seja, quanto mais perdas, mais frágil. Isso porque, nossa memória emocional armazena numa espécie de “gaveta mental”, principalmente as experiências ruins, e, a cada novo golpe, essa gaveta é aberta e todas as mágoas anteriores são reeditadas. Nesse caso, não vale citar Nietzche “o que não me mata, me fortalece”; pois, no caso da perda, fragiliza aumentando a sensação de desamparo. 

As vezes, ocorre com algumas pessoas sofrer muito mais na perda de um casamento do que com a perda de um ente querido. Isso tem sua lógica. Quando perdemos alguém por morte, apesar da dor, ficam as boas lembranças e a certeza de que esta pessoa já não está mais entre nós. 

O mesmo não ocorre na ruptura amorosa. Neste caso, além da dor da perda, sente-se uma terrível sensação de abandono e, às vezes, até de substituição. A pessoa continua viva, porém não está mais viva com você. Isso abre totalmente a ferida da rejeição. Certa vez alguém me perguntou: “Mas por que sofremos tanto com uma separação, mesmo quando a relação não era boa? Não seria mais lógico sentirmos alívio ao invés de dor”? Num pensamento lógico, sim. Mas, ocorre é que uma união afetiva de má qualidade, drena o equilíbrio emocional, a autoestima e cria uma atmosfera de dependência, fazendo com que o sofrimento e o luto sejam intensificados. 

Uma citação interessante é uma passagem de Santo Agostinho. Quando perguntaram para ele como conseguia diferenciar entre os anjos que chegavam humildemente e os demônios que chegavam disfarçados de anjos, ele disse que percebia a diferença pelo modo como se sentia depois que eles iam embora. Quando um anjo nos deixa, nos sentimos fortalecidos pela sua presença; já quando um demônio nos deixa, sentimos o terror de sua passagem. 

O luto tem seu processo, mas conseguimos acelerá-lo se evitarmos ruminação mental, sairmos da condição de vitimistas, assumirmos nossa responsabilidade e nos munimos de amor próprio que nos dá a sensação de merecimento: podemos e devemos ser felizes apesar daquela perda. 

Faço uma comparação da vida com um barquinho num lago, onde, para se manter firme, é preciso darmos uma remada diária. Mas quando estamos sofridos e cansados, vem a vontade de parar de remar. É nessa hora que devemos dar duas remadas. Isso significa ter mais disciplina, fazer mais atividade física, comer melhor, dormir melhor, se cuidar dobrado. Nenhum luto dura muito tempo com duas remadas.

 A psicanalista escreve nesse espaço às quintas-feiras.

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