Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Medo de ficar de fora

Publicado em 31/10/2024 às 06:00.

Quando ficar em casa não significa descanso e muito menos paz, e sim angústia por medo de estar perdendo “algo muito interessante”, estamos frente à Síndrome de Fomo - sigla que vem da expressão em inglês “fear of missing out”, que traduzida para o português significa “medo de ficar de fora”.

Quem sofre com esse sentimento tem um grande impacto na vida, rotina, descanso e uma constante sensação de inquietude e ansiedade. Geralmente ficam atualizando as redes sociais compulsivamente, enviando mensagens para saber como está o evento, se informando onde está mais agitado e qual o melhor lugar para ir. Pensam que se não estiverem informados de tudo que está acontecendo podem estar perdendo grandes oportunidades de diversão, de conhecer pessoas e de aproveitar a vida de uma forma geral. 

Essas pessoas se esforçam ao máximo para estar em todos os lugares e eventos, gastam mais do que podem, sacrificam o sono, e quando se veem impossibilitadas de ir a algum lugar, sentem uma tristeza e até inveja de quem lá está. 

Mas não é só no contexto social que essa síndrome se manifesta. Ela pode estar presente no ambiente profissional, quando um novo funcionário possui mais conhecimento, mais diplomas e dispõe de maiores habilidades. Frente a isso, o indivíduo costuma ter uma sensação de que está ficando para trás, pois se vê sem condições de acompanhar tamanha rapidez. O desconforto sentido não tem a ver com competitividade, e sim com a angústia de não conseguir ser totalmente atualizado. 

Esse “medo de ficar de fora” exacerbou com o advento das redes sociais. Saber a rapidez do mundo, a agenda da cidade, a festa dos amigos, das celebridades gera uma sensação de que “todos” estão aproveitando a vida enquanto ele está parado no tempo. E com isso ele compensa ficando mais atualizado e alimentando ainda mais a sensação de estar  perdendo. Um círculo vicioso. 

É fato que essa hiperconectividade está acelerando nosso pensamento, comprometendo nosso poder de concentração, drenando nossa sensação de serenidade por ser fonte geradora de ansiedade. Muitos querem se livrar dessa ratoeira autodestrutiva, porém poucos estão dispostos a remar contra a maré e dominar a compulsão e a ânsia digital desenfreada.

Certa vez peguei uma carona com um colega de trabalho, que num trajeto de 30 minutos não parou de mudar as estações de rádio nem por um minuto. Quando o questionei se estava procurando por algo específico, ele me respondeu: não consigo ouvir uma música por muito tempo pois tenho a sensação de que outra melhor está tocando e eu estou perdendo. E assim seguiu apertando todos os botões de forma aflitiva, buscando pela melhor opção que não chegou. 

É assim que essas pessoas se comportam: não desfrutam, com sensação de paz, o momento presente. Ao invés disso, passam o tempo imaginando e/ou buscando algo melhor. E assim seguem a vida: esperando a “boa” chegar. 

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