Simone DemolinariPsicanalista com Mestrado e dissertação em Anomalias Comportamentais, apresentadora na 102,9 e 98 FM

Por que tanto medo da solidão?

Publicado em 24/08/2023 às 06:00.

Diz o ditado popular amplamente repetido: “Antes só do que mal acompanhado”. Na prática, não é o que vejo! E não me refiro apenas ao campo do amor. Muitos preferem a má companhia a ter que ir a um restaurante sozinho, por exemplo. Não suportam a vergonha e o desconforto de serem observados como solitários e/ou fracassados. Escolhem não ir a ter que enfrentar os olhares julgadores de pessoas que mal conhecem. 

Não deveríamos sentir tanto essa fragilidade. Ao contrário, estar só deveria ser interpretado como um grande espaço para novas possibilidades. Quem viaja sozinho tem muito mais oportunidade de se desenvolver, vencer barreiras, se conectar consigo mesmo e também fazer novas amizades. Mas a maioria não quer romper esse medo, se sente insegura para lidar com situações novas sem o suporte de outras pessoas. Além disso, a solidão tem um fator emocional: está associada à rejeição, ao abandono ou à sensação de não ser amado e querido pelos demais. Uma ilusão! 

Há, também, uma forte associação entre a solidão e contextos negativos. Ficar sozinho é sinônimo de castigo: pais penalizam o filho deixando-o sozinho num quarto porque ele não estudou; nas prisões, as punições são feitas nas “solitárias”, um subtexto que indica que ser gregário é bom, e solitário, ruim. 

No contexto social, até nos dias de hoje, há uma ideia de que quem fica solteiro fracassou. Não à toa ganham alcunhas pejorativas como solteirões, encalhados, tiozão. Um julgamento que infere que quem está sozinho está infeliz. Isso não é verdade. Aliás, muitas dores derivam do fato de suportar uma vida conjugal ruim, fazer vista grossa para traições, adoecer de tanto desamor e degustar uma das piores dores: a da solidão a dois.

Uma questão curiosa é que quanto maior o medo, maior a submissão, e quanto maior a capacidade de ficar sozinho, menor o risco disso acontecer. Isso porque uma pessoa competente emocionalmente é muito mais interessante do que uma dependente. 

A capacidade de se bancar sozinho é que garante a liberdade, independência e dignidade. É ficando sozinho que o indivíduo dimensiona sua força, avalia seu potencial e se reinventa. É na solidão que se conclui que a felicidade procurada só pode ser encontrada dentro de si. Ao concluir isso, a autonomia pessoal cresce e a ilusão de que alguém irá salvá-lo se arrefece.

As pessoas que estão sozinhas e bem com essa condição não vivem na tristeza atribuída a elas por aqueles que estariam assim caso estivessem sem ninguém. Pensar que pessoas sozinhas são tristes ou problemáticas, além de preconceito, é uma forma limitada e generalista de pontuar a questão. É preciso considerar que muitas pessoas estão sozinhas por opção própria e muitas vezes dispõem de excesso de qualidade e não de falta. Elas pensam como Nietzsche: “Não me roubem a solidão sem me oferecer verdadeira companhia”. É o correto!

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